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26/11/2002 - 02h40

O universo mágico brasileiro

ANDRÉ FORASTIERI
especial para a Folha de S.Paulo

Divulgação
Ilustração de Monteiro Lobato (ao centro) e seus personagens do "Sítio do Picapau Amarelo"
No Brasil, reina Monteiro Lobato. É lido e relido há quatro gerações, graças à imortal Emília —o mais encantador poço de egoísmo que já se viu. As aventuras "puras" da turma do "Sítio do Picapau Amarelo" continuam eletrizantes (os livros paradidáticos envelheceram mais), especialmente "Os Doze Trabalhos de Hércules". São feijoadas modernistas em que entram contos de fadas, heróis mitológicos, caubóis e príncipes submarinos.

Lobato já merecia fama no universo juvenil só pelo papel de editor, na sua Companhia Editora Nacional, e criador da coleção Terramarear. Também foi tradutor de H.G. Wells, Jack London, "Kim", "As Aventuras de Huck Finn" (de Mark Twain), Tarzan, Robin Hood e muitos outros, inclusive "Polyanna" (hoje com validade vencida, como outros clássicos manuais de comportamentos para mocinhas).

Lobato é um gigante. Hoje é difícil perceber seu aspecto transgressivo. Mas, nas décadas de 30 e 40, a série do "Sítio" causava escândalo pela modernidade, pelo materialismo, pela falta de respeito às tradições. Chegou a ser perseguido pela imprensa, pelo Ministério Público e pela Igreja Católica. Em 1942, as freiras do Colégio Sacre Coeur de Jesus, do Rio de Janeiro, exigiram que todos os alunos trouxessem seus livros de Lobato ao colégio. Foram confiscados e queimados numa fogueira no pátio da escola.

A influência de Lobato sufocou temporariamente o aparecimento de herdeiros no Brasil. Somente nos anos 70 é que uma nova leva de escritores juvenis se firmaria. Escreveram livros que continuam muito lidos no século 21.

O mais prolífico foi justamente um adaptador do "Sítio do Picapau Amarelo" para a TV, Marcos Rey, com policiais como "Um Cadáver Ouve Rádio". Outros sucessos são "Meu Pé de Laranja Lima", de José Mauro de Vasconcelos, e "O Gênio do Crime", de João Carlos Marinho.

O maior marco é a Coleção Vagalume, da editora Ática, até hoje popularíssima. Francisco Marins, com as aventuras de Tonico e Perova no Brasil do século 19. "Coração de Onça" e as aventuras bandeirantes de Ofélia e Narbal Fontes. "Menino de Asas" e "Cabra das Rocas", de Homero Homem. "A Ilha Perdida" e "Éramos Seis", de Maria José Dupré. E, dominando soberana a coleção, Lúcia Machado de Almeida, com "O Caso da Borboleta Atíria", "O Escaravelho do Diabo", "Spharion" e a série com as aventuras de Xisto. Todos clássicos da literatura juvenil brasileira.

A produção atual da Coleção Vagalume mantém bom nível, com presença de autores premiados, como Marçal Aquino e Domingos Pellegrini. Essa é a nova tendência: nomes consagrados escrevendo para adolescentes. No Brasil, é cada vez mais comum. A editora Objetiva, por exemplo, está lançando uma nova coleção juvenil com livros de Luis Fernando Veríssimo ("O Santinho"), José Roberto Torero ("Uma História de Futebol") e Carlos Heitor Cony —adaptando Alexandre Dumas ("O Máscara de Ferro").

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