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25/03/2003 - 03h26

Além da exposição

JULIANA DORETTO
free-lance para a Folha de S.Paulo

Você olha para o quadro e o quadro não diz nada. A sensação é familiar? Os museus sabem que sim e estão dispostos a agir para ganhar sua atenção. É cada vez maior o número de museus que diversificam suas atividades educativas, procurando chegar ao público em geral, e não apenas ao estudante, principal alvo da orientação que costumam oferecer.

Publius Vergilius/Folha Imagem
Crianças durante atividade na brinquedoteca do Museu Imperial, em Petrópolis (RJ)

"O século 20 foi marcante para a dessacralização do espaço expositivo e para o surgimento das preocupações educacionais nos museus", afirma Maria Cristina Bruno, 46, coordenadora do curso de especialização em museologia do MAE (Museu de Arqueologia e Etnologia) da USP. "Hoje, o maior desafio dessas instituições é saber como contribuir para a inclusão social, atendendo a diferentes setores da sociedade."

A lógica é simples: se o visitante entende o que vê, a visita ao museu deixa de ser árida, torna-se prazerosa. Se ele puder experimentar um pouco do processo de criação artística ou entender a importância de itens históricos e naturais —em oficinas, cursos e jogos—, seu nível de compreensão subirá um degrau. A dificuldade é adequar as metodologias aos diversos públicos.

Essa nova escolha se reflete não só nos museus tradicionais mas também em grandes exposições. Na exposição "China - Os Guerreiros de Xi'an e os Tesouros da Cidade Proibida" (até 18 de maio, na Oca do parque Ibirapuera, em São Paulo), são oferecidas ao público visitas com formatos especiais para grupos de deficientes físicos, mentais, auditivos e visuais.

Para a próxima Bienal Internacional de Arquitetura e Design, estão previstas palestras abertas ao público para debater os trabalhos expostos. O evento ocorrerá de 14 de setembro a 2 de novembro, em São Paulo, e terá como tema a metrópole. "O papel da Bienal não é mais trazer apenas o núcleo histórico das artes. Isso está sendo feito pelos museus. Nossa função, hoje, é mostrar o que há de mais contemporâneo no mundo. Mas, para isso, é preciso explicar. O público em geral não entende o caráter interior do artista, a sensação que ele teve no momento da criação", diz o presidente da Fundação Bienal de São Paulo, Manuel Francisco Pires da Costa, 62.

O MAM (Museu de Arte Moderna) de São Paulo oferece cerca de 40 cursos, muitos deles usando o acervo da instituição como referência. "A idéia surgiu em 1998. Estamos tentando fazer com que o público se sinta bem e venha sempre ao museu", diz Vera Barros, 46, coordenadora educativa do MAM.

No Rio de Janeiro, em Petrópolis, o Museu Imperial promove regularmente o espetáculo "Som e Luz", que conta fatos marcantes da história do Brasil por meio de encenações e de filmes. As crianças recebem atenção todos os sábados, com oficinas na brinquedoteca do museu.

"Educativo não é apenas aquilo que se relaciona com a escola. Também é democratizar o acesso à cultura", afirma Renata Bittencourt, 33, gerente de ação educativa do Itaú Cultural de São Paulo, que desenvolve, entre outras atividades, visitas específicas para pessoas atendidas por ONGs e por frentes de trabalho.

Se a educação já encabeça a lista das principais metas dos museus, a formação do profissional responsável por ela ainda preocupa, como afirma o coordenador do serviço educativo do Masp (Museu de Arte de São Paulo), Paulo Portella Filho, 52. "Em alguns lugares, as pessoas que atendem ao público têm vínculos de trabalho precários. A função é encarada como um 'bico'. O educador deve saber criar e propor, e não apenas repetir um discurso. Deveria haver uma norma das secretarias de Educação que exigisse uma melhor formação para esses profissionais."

Ana Mae, 60, professora titular do Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicações e Artes da USP, acredita que a questão se explique pelo preconceito das diretorias dos museus e dos próprios autores com relação à educação. "A maioria dos artistas acha que a obra de arte é autônoma, que não precisa de explicações. É difícil para o arte-educador se afirmar e ter reconhecimento nos museus", diz.

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