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27/05/2003 - 03h22

Gilberto Dimenstein: Ricardo Semler faz escola

GILBERTO DIMENSTEIN
colunista da Folha de S.Paulo

Ricardo Semler sempre foi um menino curioso. Mas, na escola, os professores, quase todos desinteressantes, e as matérias desligadas do cotidiano abatiam seu entusiasmo. Cabulava, tirava as notas mínimas para passar o ano. "Se tirasse 5,5 na primeira prova e precisasse de 4,5 na segunda, estudava apenas metade do material", recorda.

Matangra
O menino se tornou empresário nacionalmente conhecido pela curiosidade de mudar práticas de gestão. Estimulou, como nunca se tinha visto no Brasil, a participação dos empregados nas decisões. Dessa experiência, surgiu o best-seller "Virando a Própria Mesa" , de 1988 (a última edição saiu pela Rocco em 2002).

Depois de virar a empresa, empenha-se agora em virar a escola. Com a ajuda de Helena Singer, cuja dissertação de mestrado abordou experiências de escolas democráticas —os alunos mandam tanto ou mais do que os professores—, Semler lançou, em São Paulo, a escola Lumiar.

Percebeu que a empresa democrática devia ser precedida de uma escola democrática. "É preciso desprogramar as pessoas que vêm trabalhar nas empresas, que passaram a vida toda aprendendo a ficar quietas, a sentar, a levantar e a ir ao banheiro com permissão. São condicionadas a seguir instruções em vez de pensar livremente."

A idéia é criar um espaço no qual os alunos sejam protagonistas, escolhendo o que e quando estudar, guiados não por um currículo prefixado, mas pela curiosidade. "Se alguém fosse 'criogenizado' há 150 anos e acordasse numa empresa ou num hospital, numa casa ou no exército, pouco reconheceria. Apenas numa escola sentiria que tudo estava igual."

Na Lumiar, o professor não é o professor como o conhecemos. Não é guiado pelos conteúdos definidos em currículos. Ele deve saber montar sua aula em cima do presente, usando a curiosidade do aluno como sua principal matéria-prima. Deve saber encontrar meninos como Semler, tão encantados pelo saber que a escola chegou a atrapalhar seus estudos.

Gilberto Dimenstein, 46, é jornalista. Acaba de lançar o livro "Fomos Maus Alunos" (Papirus), escrito com o educador e psicanalista Rubem Alves. É membro do Conselho Editorial da Folha e presidente do conselho pedagógico da revista "Educação".
E-mail: gdimen@uol.com.br

     

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