Folha Online sinapse  
30/09/2003 - 03h12

Eficiência na educação

ROBERTO DIAS
de Nova York

Nova York colocou em funcionamento um plano que, se tiver sucesso, poderá revolucionar a educação pública dos EUA: implantar métodos de gerenciamento empresarial na administração das escolas da cidade, que atendem 1,1 milhão de alunos de ensino fundamental e médio —o maior sistema educacional do país.

Stephen Chernin/Associated Press
O prefeito de Nova York, Michael Bloomberg
Principal bandeira da administração do prefeito Michael Bloomberg —que trabalhou no mercado financeiro e ficou bilionário após criar a empresa de comunicações que carrega seu nome—, o projeto começou a funcionar no dia 8 de setembro, início do ano letivo americano, e tem como objetivo principal melhorar os índices de aprendizado dos estudantes nova-iorquinos e conseguir resultados menos díspares entre as mais de mil escolas da cidade.

A prefeitura escolheu as 200 melhores escolas públicas da cidade, cerca de um quinto do total, e deixou que continuassem ensinando seus alunos da maneira que fizeram até agora. As demais, porém, terão seu currículo unificado, de forma a permitir avaliações de desempenho mais precisas.

O novo currículo de matemática, por exemplo, será o do programa "Everyday Mathematics" ("Matemática do Dia-a-Dia", em tradução livre), desenvolvido pela Universidade de Chicago, cuja principal ênfase é o ensino de matemática em que os conteúdos são trazidos para o mundo real —criticado, por outro lado, por afastar demais os alunos das fórmulas e equações.

Outra mudança, esta na legislação, devolveu ao prefeito de Nova York o poder de nomear o secretário da Educação, algo que não ocorria havia mais de 30 anos e que fora o sonho de diversos de seus antecessores —o poder ficava nas mãos de um conselho nomeado por diversas entidades.

Bloomberg chamou para comandar sua revolução Joel Klein, o promotor que liderou o processo antitruste contra a Microsoft durante o governo Clinton. Klein colheu seus auxiliares diretos entre os economistas de Wall Street, montou uma equipe de conselheiros que inclui, entre outros, o ex-presidente da General Electric Jack Welch e conseguiu a ajuda de Caroline Kennedy, filha do presidente John Kennedy, que se tornou responsável pelas campanhas de doações para as escolas públicas.

Os principais pontos da reforma:

  • Centralização administrativa do sistema de ensino

  • Unificação dos currículos

  • Uniformização de cargos e títulos funcionais

  • Criação de um instituto para formação de diretores de escola

  • Aumento da carga horária dos professores, incluindo treinamento

  • Redução de gastos baseada em ganhos de produtividade planejados



  • "Todas as escolas, de sucesso ou não, são atrapalhadas por um labirinto de regras, tradições e procedimentos. A mudança substancial na maneira como operamos é imperativa para que alcancemos nossa meta de criar um sistema de escolas notáveis", disse Klein ao lançar o projeto, batizado de Children First ("Crianças em Primeiro Lugar").

    Para quebrar a resistência dos funcionários públicos, Bloomberg decidiu que não bastava alterar o comando da educação —era preciso também mudá-lo de lugar. Feito isso, colocou à venda o prédio antigo da Secretaria da Educação, que serviu de sede durante 63 anos, de forma a simbolizar sua disposição em levar adiante o projeto. Implantou também um modelo centralizado de administração, cortando de 32 para 10 os distritos escolares da cidade.

    Mas a reformulação não ocorreu sem críticas. Uma das mais respeitadas pesquisadoras de educação da cidade, a professora Diane Ravitch, da New York University, aponta que a dissolução do antigo "Comitê de Educação", que elegia o secretário, deixou pouco espaço para a sociedade opinar nessa área.

    Como a prefeitura está em séria dificuldade financeira, as mudanças vêm sendo feitas à custa de outros pontos do orçamento nova-iorquino para a educação, algo que tem gerado protestos. Se, inicialmente, os professores apoiaram a reforma e a mudança curricular, eles agora fazem propaganda na TV pedindo que a população pressione para que as salas de aula não sejam expandidas e reclamam que tiveram restringidos benefícios, como os períodos sabáticos a que antes tinham direito.

    A reforma curricular tem um custo projetado em US$ 35 milhões, e a idéia é que esse dinheiro seja todo tirado do atual orçamento da educação. A médio prazo, aliás, pretende-se diminuir as cifras do setor com os ganhos de produtividade planejados. Hoje, cada aluno custa cerca de US$ 10 mil por ano aos cofres públicos.

    Para isso, a prefeitura vai padronizar a estrutura de mão-de-obra das escolas, uniformizando títulos e posições, uma maneira de melhorar o sistema de cobrança dos profissionais. Haverá também aumento da carga horária dos professores, e o tempo extra será usado para treinamento. Outro ponto é a formação dos diretores das escolas. Caroline Kennedy anunciou que conseguiu de empresários uma doação de US$ 30 milhões. O dinheiro deverá ser utilizado na construção de um instituto para preparar os futuros "chefes" dos colégios.

    "Parece ser um movimento na direção certa. Se Nova York tiver sucesso, e os alunos aprenderem mais, outras cidades vão segui-la", diz Jack Jennings, diretor do Center on Education Policy. Apesar de elogiar as idéias, porém, Jennings tem dúvidas sobre o sucesso da iniciativa. "O sistema educacional é tão grande que será difícil levar adiante qualquer reforma. Provavelmente, será um sucesso misto. Espero apenas que eles se apeguem a algo por tempo suficiente para mostrar esse sucesso. Os nova-iorquinos não são conhecidos por sua paciência", afirma.

         

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