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28/10/2003 - 03h10

Graduação em pílulas

MARIANA SGARIONI
free-lance para a Folha de S.Paulo

Uma modalidade ainda pouco conhecida de aluno especial começa a mexer com a rotina das universidades. Qualquer pessoa com diploma de nível superior ou que esteja em um curso de graduação pode assistir a uma ou mais disciplinas de outro curso de seu interesse, desde que haja vagas. No final, sai com um certificado.

Cris Bierrenbach/Folha Imagem
Monique Alain, formada em biologia, que cursa disciplinas de artes na Faap, em São Paulo
Monique Alain, 44, bióloga com pós-graduação em genética, assiste a aulas do Departamento de Artes Plásticas da Faap (Fundação Armando Álvares Penteado). "Resolvi mudar de profissão e hoje sou artista", conta. "O bom é que, nesse esquema, vou escolhendo as matérias que quero fazer. Assim, vou cursando a faculdade devagar e do jeito que eu mais gosto. Depois, presto vestibular e peço o aproveitamento dos créditos", diz. Trata-se de uma alternativa para quem não tem pressa de se formar e não quer seguir uma grade convencional.

A Faap foi uma das primeiras faculdades de São Paulo a implantar o sistema, vigorando em caráter experimental há três anos apenas para as disciplinas de artes plásticas. Atualmente, a faculdade conta com cerca de 25 alunos sequenciais por semestre, que pagam mensalmente R$ 190 por disciplina.

"Temos um coordenador, que avalia a possibilidade de o candidato acompanhar a disciplina escolhida. Por enquanto, o sistema funciona apenas em artes plásticas, pois a grade não é tão amarrada. Ou seja, os cursos não dependem tanto do conhecimento anterior", diz Silvio Passarelli, diretor da Faculdade de Artes Plásticas da Faap.

"Antigamente, quem se interessava por apenas uma disciplina assistia como ouvinte e não tinha nenhum comprovante para efeito de currículo", lembra Edman Altheman, diretor de gestão acadêmica da Universidade Anhembi Morumbi, que também oferece vagas desse tipo.

A abertura de vagas para alunos nos moldes acima é regulamentada desde 1999 pelo MEC (Ministério da Educação) e é uma das modalidades dos cursos sequenciais, mas ainda é pouco divulgada. O aluno que cursa apenas uma disciplina por vez participa do chamado curso sequencial de complementação de estudos. Já o curso sequencial de formação específica, mais conhecido, é um curso superior de carga horária geralmente menor (dois anos) que dá diploma, mas não garante ao aluno o direito de realizar pós-graduação.

De acordo com a legislação, as instituições de ensino superior que desejarem ofertar disciplinas no formato de "curso avulso" devem divulgar a relação das vagas que têm sobrando. A escola pode aprovar ou não a proposta do candidato interessado em cursar a disciplina. Em geral, isso dependerá da coerência do projeto apresentado e dos pré-requisitos que a matéria exige.

No caso das universidades públicas, a maioria só abre vagas de alunos especiais (como são chamados) na pós-graduação. Na graduação, em geral, ou não sobram vagas ou, se sobram, elas são preenchidas com vestibulares de transferência.

"Tudo que possa flexibilizar e abrir o acesso à formação superior é positivo", afirma Eunice Ribeiro Durham, coordenadora do Nupes (Núcleo de Pesquisa do Ensino Superior), da USP.

Segundo Passarelli, da Faap, a presença desses novos alunos, normalmente mais velhos que os demais, melhora o rendimento da sala de aula. "Os mais novos enxergam neles uma referência de alguém que já está no mercado de trabalho." Altheman, da Universidade Anhembi Morumbi, acredita que "os alunos acabam valorizando ainda mais o curso quando vêm uma pessoa de fora, que já está trabalhando, fazendo questão de assistir à aula".

"A única coisa que deve ser rigorosa é o processo de admissão", alerta Durham. Segundo a coordenadora do Nupes, a avaliação dos pré-requisitos nem sempre é adequada, e os alunos podem acabar caindo de pára-quedas no meio da sala de aula, sem nenhum conhecimento anterior. "E isso pode atrapalhar a dinâmica do curso."

Além dos conteúdos, há a adaptação com os alunos regulares. "Eles não se integram muito com a gente", reclama um aluno da Faap que preferiu não se identificar. Para Eunice Durham, essas diferenças são saudáveis. "É ótimo aprender a conviver com o diferente."

Segundo Adalberto Carvalho, assessor da Secretaria de Educação Superior do MEC, existem hoje 305 cursos individuais em andamento. Mas ele ressalta que o MEC não reconhece como diploma os certificados conferidos por esses cursos. "Eles são válidos apenas para a instituição. Caso o aluno resolva cursar essa faculdade posteriormente, pode pedir a validação dos créditos já feitos", afirma.

Saiba mais:
Faap: tel. 0/xx/11/3662-7000
Anhembi Morumbi: tel. 0800 159020

     

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