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16/12/2003 - 03h10

Caminho das Pedras: As muitas causas do terceiro setor

ANDRÉS PABLO FALCONER
especial para a Folha de S.Paulo

O terceiro setor é uma das melhores descobertas da última década. Descoberto, sim, e não inventado, pois se pode afirmar que, mesmo sem esse nome, o terceiro setor é tão velho quanto o Brasil. Há dez anos, o termo nem sequer era conhecido no país, mas hoje as pessoas medianamente informadas já o associam a organizações e iniciativas sociais em prol de crianças, idosos e portadores de deficiência, à defesa dos direitos humanos, à proteção do ambiente, à organização de comunidades e a outras formas de ação social.

Alan Marques - 5.mar.2003/Folha Imagem
Ativistas do Greenpeace protestam contra a usina nuclear Angra 3, diante do Palácio da Alvorada

Vive-se um momento de renovação do engajamento da sociedade em questões sociais —um aumento da participação direta do cidadão. Vê-se o surgimento de organizações que, apesar de sem fins lucrativos, atuam com profissionalismo e eficiência. Voluntários organizam campanhas de cidadania com o mesmo rigor, apesar de não ganharem para isso. Empresas e seus funcionários criam projetos sociais, dentro e fora do horário de trabalho. Ao mesmo tempo, a participação política da sociedade e o seu envolvimento em assuntos de interesse público ocorrem em níveis sem precedentes.

Mas o terceiro setor é muito mais complexo e multifacetado do que parece à primeira vista; vai além da imagem de gente bem intencionada querendo "fazer o bem". A diversidade das organizações que compõem o setor, suas diferentes orientações políticas e formas de atuação fazem com que muitos questionem a própria validade da idéia de um "terceiro" setor, contraposto ao primeiro e ao segundo, o Estado e o mercado. Uma relação de amor e ódio com o Estado e, mais recentemente, o namoro com o mundo empresarial são assuntos sobre os quais especialistas têm dedicado muita atenção. Questões éticas e legais, além de ocasionais escândalos, lembram-nos que esse espaço é formado por seres humanos com os mesmos vícios e virtudes dos demais.

O terceiro setor é um termo utilizado para abranger um vasto leque de organizações que também recebem nomes como ONGs (organizações não-governamentais), OSCs (organizações da sociedade civil) e um sem-número de termos e siglas (algumas com sentido juridicamente definido), como Oscips (organizações da sociedade civil de interesse público), instituições filantrópicas, instituições de caridade etc. O que todas elas têm em comum é o caráter sem fins lucrativos e uma natureza de atuação no que pode ser genericamente chamado de interesse público, coletivo ou social.

Convivem nesse setor desde organizações tradicionais, como as Santas Casas de Misericórdia, cuja origem remonta aos tempos da Colônia, até organizações mais novas. Há organizações bem estabelecidas, com equipes profissionalizadas, como a Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança (www.fundabrinq.org.br), e pequenas entidades sem orçamento e dirigidas apenas por voluntários. Há fundações e institutos com respaldo e vinculação empresarial, como a Fundação O Boticário de Proteção à Natureza (www.fundacaoboticario.org.br), que leva o nome da empresa de cosméticos, assim como existem aquelas que não recebem recursos de empresas e, pelo contrário, destinam-se a fiscalizar a atuação destas, como o Instituto de Defesa dos Direitos do Consumidor (www.idec.org.br).

Em meio a milhares de organizações brasileiras, há espaço para organizações internacionais que atuam no país, como o Greenpeace (www.greenpeace.org.br) e a Fundação Kellogg (www.wkkf.org). A maioria das instituições é criada com a finalidade de organizar uma comunidade ou de oferecer algum tipo de serviço direto, mas muitas atuam indiretamente, oferecendo recursos para projetos, capacitando profissionais, encaminhando voluntários, organizando campanhas.

Em suma, o terceiro setor é espaço para uma nova participação para o exercício da criatividade e da liberdade —e daí para o benefício da sociedade. A discussão sobre conceitos e princípios não deve ser um obstáculo para o engajamento ou a ação.

Andrés Falconer, 35, é coordenador-executivo da Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Lideranças (www.abdl.org.br). Mestre em administração pela USP, especializou-se em terceiro setor pela Universidade Johns Hopkins (EUA).

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