Folha Online sinapse  
27/07/2004 - 03h40

Mudar conteúdo, forma e resultado

Rogerio Wassermann
free-lance para a Folha de S.Paulo, de Londres

Estudantes que chegam à universidade ou ao mercado de trabalho sem saber se expressar corretamente na linguagem escrita ou fazer operações matemáticas básicas. Programas escolares incoerentes e confusos. Professores que passam a maior parte do tempo dando aos seus alunos dicas de como se sair bem nas provas. Alunos com baixo rendimento escolar que abandonam os estudos.

A conclusão, que pode parecer uma avaliação do sistema de ensino brasileiro, é, na verdade, parte de uma série de problemas identificados por um relatório governamental sobre o ensino secundário britânico (equivalente ao ensino médio no Brasil) que deve servir de base para a mais ampla reforma realizada no país desde a década de 1940.

Entre as mudanças propostas estão tornar obrigatório o estudo de inglês e matemática para alunos acima de 16 anos (atualmente, essas disciplinas são eletivas a partir dessa idade), alterar a forma de avaliação dos estudantes e permitir que cada aluno evolua em seu próprio ritmo.

"Chegou a hora de reformas. Muitos jovens deixam os estudos ou não conseguem progredir. Outros tantos chegam a um limite e não são estimulados a evoluir além dele", disse o autor do relatório, o educador Mike Tomlinson, ao apresentar o documento, no final de fevereiro.

O estudo ainda é preliminar. Um relatório final ainda deve ser apresentado e seguir votação no Parlamento. Se aprovadas, as mudanças podem levar até dez anos para entrar integralmente em prática.

O debate tem sido intenso, mas um dos poucos consensos é que o atual sistema precisa ser simplificado. "Consideramos necessário um sistema coerente, mais fácil de entender e com uma carga menor de avaliações", diz ao Sinapse Chris Keates, sub-secretária-geral da Associação Nacional de Diretores e Sindicato de Professoras.

A comparação entre alunos está no centro das discussões sobre as mudanças nas avaliações. Não existe repetência no sistema britânico. Mas isso não significa que eles não sejam avaliados. Os estudantes passam por exames nacionais com 14, 16, 17 e 18 anos —os principais são realizados aos 16 (os chamados GCSE) e aos 18 (A-Levels, ou nível avançado)— e devem ser aprovados nos GCSE para prosseguir os estudos.

O relatório de Tomlinson foi bem recebido por praticamente todas as associações e todos os sindicatos de professores. As entidades consideram as mudanças positivas, mas adotam uma posição de cautela à espera do detalhamento das propostas, no relatório final, que deve sair em outubro. Para a Confederação das Indústrias Britânicas, porém, o atual sistema de avaliações já está estabelecido entre os empregadores como forma de selecionar seus contratados, e seria negativo alterá-lo.

Com tantas críticas e propostas diferentes, a questão da reforma ainda deve gerar muita discussão e polêmica. O único consenso até aqui tem sido a necessidade de mudanças. "Precisamos de um desenvolvimento sistemático que acompanhe as mudanças das necessidades de estudantes, universidades e empregadores", afirma Keates.

     

Copyright Folha de S. Paulo. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress (pesquisa@folhapress.com.br).