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03/01/2006
-
16h26
Enviada especial da FOlha de S.Paulo a São Sebastião
O caminho, por enquanto, não é dos mais fáceis. São 40 minutos por uma trilha íngreme e estreita, passando sobre cursos d'água, pedras cobertas de musgo e uma frágil pinguela --ponte de troncos de árvore. Mas a vista que se tem ao chegar ao sítio arqueológico São Francisco, no Parque Estadual da Serra do Mar, compensa o esforço: de um lado, as ruínas de uma fazenda do fim do século 18, que provavelmente abrigava um posto clandestino de venda de escravos. Do outro, uma visão panorâmica de todo o canal de São Sebastião, litoral norte paulista.
O local, hoje restrito a pesquisadores e funcionários, será reaberto ao público na segunda quinzena deste mês. Ao longo de 2005, ficou fechado para manutenção e pesquisa. No período, também foi criado um novo acesso, que, além de mais fácil, não passa pelas propriedades particulares do entorno, como a de José Renato Silva, 57, que mora na região há 22 anos e trabalha na limpeza das ruínas.
O caminho que faz muita gente suar, ele sobe até duas vezes por dia, acompanhado de três cachorros, para capinar o terreno. "Adoro isso aqui. Antes, só dava para ver mato, árvores. Quem diria que ia ter toda essa construção aqui? Só descobri que era uma fazenda quando o Wagner foi lá em casa falar comigo", recorda Silva, referindo-se ao arqueólogo Wagner Bornal, explorador do local.
O sítio começou a ser escavado no início dos anos 90 e, até hoje, mais de 60 mil peças históricas foram encontradas na área. Com 65 mil m2 de área construída, o local abrigava uma capela, onde ainda se vêem os resquícios de uma pia batismal e de um oratório, decorado com conchas; um jardim, onde eram expostas tanto estátuas religiosas como pagãs; uma casa; e um forno açoriano, para a produção de açúcar. O sistema de drenagem tinha uma barragem e aquedutos --2.000 m de canaletas foram mapeados.
No pátio principal, ainda é possível ver resquícios dos adornos dos barbacãs (orifícios abertos numa parede para permitir o escoamento da água). Os enfeites mostram uma capela, um arqueiro, um elmo, o brasão da família, um símbolo da maçonaria e uma rã grávida, que, entre os africanos, remetia à abundância.
Apesar do tamanho, a fazenda não está registrada em nenhum cartório da região, o que reforça a tese de que o local era clandestino. Reforçam essa teoria dois aspectos. O primeiro é a localização, numa área que ao mesmo tempo é pouco visível e permite ver todo o canal. "Ao contrário de outras fazendas da região, instaladas em áreas planas, ela estava num local de difícil acesso [270 m acima do nível do mar], o que atrapalharia distribuir a produção", conta Fernanda Palumbo, 37, diretora de patrimônio histórico da cidade. São Sebastião teve, segundo os registros, 18 engenhos de açúcar.
O segundo aspecto é o grande número de peças com referências a diferentes grupos africanos. As peças, hoje na Secretaria de Turismo, devem ser, futuramente, expostas no centro de arqueologia que a prefeitura pretende instalar num casarão histórico da cidade.
Lendas e saques
Grande parte do patrimônio da fazenda foi saqueado ao longo dos séculos, e uma lenda contribuiu para a degradação. Uma crença popular diz que o dono da fazenda, o cruel Joaquim Pedro, havia enterrado um tesouro na região e revelaria o local a quem, à meia-noite, chamasse três vezes por ele. "Pessoas acreditaram nisso e degradaram a construção", diz Clayton Galdino, 31, estudioso em patrimônio e membro do laboratório do arquivo histórico municipal. A meta é instalar no local espaço para piqueniques, pontos de arvorismo e totens com informações históricas --projetos para os quais a prefeitura busca verbas. O sítio é tombado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Para visitar a região, é preciso contar com um guia autorizado pela prefeitura. Os agendamentos podem ser feitos pelo telefone 0/xx/12/3892-2620.
Especial
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Floresta esconde ruínas do século 18 no litoral paulista
AMARÍLIS LAGEEnviada especial da FOlha de S.Paulo a São Sebastião
O caminho, por enquanto, não é dos mais fáceis. São 40 minutos por uma trilha íngreme e estreita, passando sobre cursos d'água, pedras cobertas de musgo e uma frágil pinguela --ponte de troncos de árvore. Mas a vista que se tem ao chegar ao sítio arqueológico São Francisco, no Parque Estadual da Serra do Mar, compensa o esforço: de um lado, as ruínas de uma fazenda do fim do século 18, que provavelmente abrigava um posto clandestino de venda de escravos. Do outro, uma visão panorâmica de todo o canal de São Sebastião, litoral norte paulista.
O local, hoje restrito a pesquisadores e funcionários, será reaberto ao público na segunda quinzena deste mês. Ao longo de 2005, ficou fechado para manutenção e pesquisa. No período, também foi criado um novo acesso, que, além de mais fácil, não passa pelas propriedades particulares do entorno, como a de José Renato Silva, 57, que mora na região há 22 anos e trabalha na limpeza das ruínas.
O caminho que faz muita gente suar, ele sobe até duas vezes por dia, acompanhado de três cachorros, para capinar o terreno. "Adoro isso aqui. Antes, só dava para ver mato, árvores. Quem diria que ia ter toda essa construção aqui? Só descobri que era uma fazenda quando o Wagner foi lá em casa falar comigo", recorda Silva, referindo-se ao arqueólogo Wagner Bornal, explorador do local.
O sítio começou a ser escavado no início dos anos 90 e, até hoje, mais de 60 mil peças históricas foram encontradas na área. Com 65 mil m2 de área construída, o local abrigava uma capela, onde ainda se vêem os resquícios de uma pia batismal e de um oratório, decorado com conchas; um jardim, onde eram expostas tanto estátuas religiosas como pagãs; uma casa; e um forno açoriano, para a produção de açúcar. O sistema de drenagem tinha uma barragem e aquedutos --2.000 m de canaletas foram mapeados.
No pátio principal, ainda é possível ver resquícios dos adornos dos barbacãs (orifícios abertos numa parede para permitir o escoamento da água). Os enfeites mostram uma capela, um arqueiro, um elmo, o brasão da família, um símbolo da maçonaria e uma rã grávida, que, entre os africanos, remetia à abundância.
Apesar do tamanho, a fazenda não está registrada em nenhum cartório da região, o que reforça a tese de que o local era clandestino. Reforçam essa teoria dois aspectos. O primeiro é a localização, numa área que ao mesmo tempo é pouco visível e permite ver todo o canal. "Ao contrário de outras fazendas da região, instaladas em áreas planas, ela estava num local de difícil acesso [270 m acima do nível do mar], o que atrapalharia distribuir a produção", conta Fernanda Palumbo, 37, diretora de patrimônio histórico da cidade. São Sebastião teve, segundo os registros, 18 engenhos de açúcar.
O segundo aspecto é o grande número de peças com referências a diferentes grupos africanos. As peças, hoje na Secretaria de Turismo, devem ser, futuramente, expostas no centro de arqueologia que a prefeitura pretende instalar num casarão histórico da cidade.
Lendas e saques
Grande parte do patrimônio da fazenda foi saqueado ao longo dos séculos, e uma lenda contribuiu para a degradação. Uma crença popular diz que o dono da fazenda, o cruel Joaquim Pedro, havia enterrado um tesouro na região e revelaria o local a quem, à meia-noite, chamasse três vezes por ele. "Pessoas acreditaram nisso e degradaram a construção", diz Clayton Galdino, 31, estudioso em patrimônio e membro do laboratório do arquivo histórico municipal. A meta é instalar no local espaço para piqueniques, pontos de arvorismo e totens com informações históricas --projetos para os quais a prefeitura busca verbas. O sítio é tombado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Para visitar a região, é preciso contar com um guia autorizado pela prefeitura. Os agendamentos podem ser feitos pelo telefone 0/xx/12/3892-2620.
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