Boom de bares, restaurantes e apês redesenha região do centro conhecida como Nova República

O centro está de cara nova. A onda de bares moderninhos e espaços culturais que surgiram nos anos 2000 no Baixo Augusta agora se espalha pela região formada pela República, Vila Buarque e Santa Cecília.

"Essa expansão avançou até 2014 e parou por causa da crise. Retomou em 2017, com a abertura de lugares como a padaria Mundo Pão do Olivier e o pub vietnamita Bia Hoi, conta Fabio Redondo, diretor da rede Buenas Hotéis. Ele e um grupo de empresários acabam de lançar o Movimento Centricidade, com direito a mapa turístico.

"A ideia é atrair visitantes e moradores de São Paulo que não frequentam essa área", explica. Entre os planos está promover uma semana de descontos, como a Restaurant Week, mas apenas nas casas da região.

Quem anda pelo entorno da praça da República sabe que a região está passando por uma transformação. Antes dominada por comércios simples e prédios antigos, a área exibe hoje altos e modernos empreendimentos imobiliários.

De acordo com o Secovi-SP (sindicato da habitação), o bairro ganhou 4.477 novas unidades residenciais entre 2014 e 2017, com metragem média de 35 m². Em sua maioria, os apartamentos têm um ou dois dormitórios, o que joga luz sobre o perfil das pessoas que têm se mudado para o bairro: solteiros e casais jovens, que estão adquirindo sua primeira moradia.

Com valores médios que vão de R$ 200 mil a R$ 400 mil, esses imóveis atraem a atenção não só pelo custo-benefício, mas também por sua localização. Ficam na região central de São Paulo, com grande oferta de transporte público, comércio e emprego, além da agitação cultural e de lazer.

Parece a receita perfeita para o lucro das incorporadoras. Mas o fator comercial não é o grande responsável por mover as engrenagens da República, segundo Carolina Bueno, 43, do escritório de arquitetura franco-brasileiro Triptyque, localizado nas imediações. Existe um certo idealismo por trás dos tapumes que invadiram o bairro, ela diz.

"Algumas construtoras têm a visão urbanística de futuro, projetam naquela área o potencial de uma cidade compacta, onde você pode trabalhar, morar e curtir a vida. Outras foram pelo preço, é claro. Por passar tantos anos no abandono, os valores ali eram atraentes", explica. "Mas há quem queira requalificar o que a gente já tem –afinal, o centro é lindo."

Como consequência da redescoberta da República pelo setor imobiliário, os arredores da praça homônima ganharam cafés, mercadinhos, confeitarias, hortifrútis, lavanderias que tentam se adequar ao perfil de consumo dos novos moradores. Mas é na noite que se encontram as principais novidades geradas por esse fluxo.

Cada vez mais bares e restaurantes moderninhos estão abrindo as portas na região. Verdadeiros ímãs de hipsters –como é chamada a juventude de classe média-alta que se opõe à cultura de massa e acaba difundindo seus próprios modismos-, esses estabelecimentos querem que os paulistanos redescubram o centro. Como trunfo, a maioria tem a inventividade em seu DNA.

"Atendo a um público mais hipster, apesar de essa não ter sido a minha intenção", conta Dani Borges, 37, chef que abriu o gastropub vietnamita Bia Hoi em novembro passado. "Vim para cá porque aqui circula gente de todo perfil e queria aproveitar essa diversidade. É diferente do que acontece em Pinheiros ou no Itaim. Eu buscava a democracia que rola no centro", diz ela, que gosta de ajudar a desmistificar a área. "As pessoas ainda têm preconceito, acham que é um lugar perigoso. Mas a cidade toda é perigosa."

As casas novatas têm se aglomerado em um pedaço específico da República, paralelo ao Minhocão e delimitado pelas avenidas Amaral Gurgel e Ipiranga e pelas ruas da Consolação e Marquês de Itu. É a chamada Nova República.

"Os empreendedores já não pensam apenas em onde está o dinheiro. Queremos empreender com valores sociais, políticos e artísticos, e essa região é a mais criativa da cidade", diz Junior Passini, 33, que inaugurou em maio o Tokyo, projeto que mistura karaokê, bar, balada e restaurante em um edifício tombado de 1949.

"Muita gente fala da revitalização do centro, mas este é um termo muito forte, porque significa dar vida ao que está morto. Só que o centro é o lugar mais vivo de São Paulo, é onde está tudo. O que nós queremos fazer é dar oportunidade para que mais pessoas conheçam a região."

Esses são os valores dos pioneiros Janaina e Jefferson Rueda, de 43 e 40 anos, respectivamente. Casal-símbolo da retomada do bairro, eles atualmente comandam quatro dos pontos mais disputados da República. Ela é dona do Bar da Dona Onça, inaugurado no térreo do Edifício Copan em 2008. Eleito o chef de 2018 pelo especial O Melhor de sãopaulo - Restaurantes, Bares & Cozinha, ele é o responsável por A Casa do Porco, na rua Araújo desde 2015.

Neste ano, Jefferson partiu para duas outras empreitadas, ambas a poucos metros dali: o Hot Pork, especializado em cachorro-quente, aberto em janeiro, e a Sorveteria do Centro, em atividade desde o fim de maio.

Diz o chef: "Acho importante que a gente cuide da economia criativa local e que isso inspire pessoas em outros bairros".

Para ele, o maior legado deve ser a acessibilidade. "Já que estamos criando tanto, que a população local também tenha acesso a isso", complementa Rueda.

Atualmente, A Casa do Porco é o maior exemplo do boom que atinge a República. Nos finais de semana, as filas do restaurante parecem intermináveis. Saltos coloridos e tênis de marca se acumulam sobre as
calçadas quebradiças da rua onde fica a premiada casa, aguardando por uma mesa.

O mesmo acontece na porta da filial central da hamburgueria Z Deli. O local tem pé-direito alto e paredes envidraçadas, pelas quais a clientela observa a beleza da região enquanto aprecia sanduíches de pastrami ou de salmão defumado -itens que, há pouquíssimo tempo, ninguém imaginaria encontrar naqueles quarteirões do centro paulistano.

Juntam-se a esses sucessos de público e crítica outros novatos, como o bar Cama de Gato, que levou mesas coletivas e espaço para jogar pingue-pongue à rua Amaral Gurgel, embaixo do Minhocão; uma nova unidade da doceria francesa Éclair Moi, desde setembro na rua General Jardim; o Fel, especializado em coquetéis clássicos esquecidos e tocado apenas por mulheres, vizinho do Dona Onça no Copan.

Dessa forma, um ciclo é criado: novos empreendimentos imobiliários agitam a gastronomia e a vida noturna da República, o que, por sua vez, leva ao bairro um novo público, cada vez mais interessado em conhecê-lo -e, quem sabe, fixar residência ali. Entre velhos marcos da cidade, como o já citado Copan, o Terraço Itália, a Galeria do Rock e o edifício Caetano de Campos, uma Nova República está em formação.

*

Paradas no centro

  • Tokyo. R. Major Sertório, 110, s/ tel
  • Hot Pork. R. Bento Freitas, 454, tel. 3129-8735
  • A Casa do Porco. R. Araújo, 124, tel. 3258-2578
  • Bar da Dona Onça. Ed. Copan - Av. Ipiranga, 200, lj. 27/29, tel. 3257-2016
  • Bia Hoi. R. Rego Freitas, 516, tel. 3151-2508
  • Cama de Gato. R. Amaral Gurgel, 453, tel. 3129-9581
  • Éclair Moi. R. General Jardim, 277, tel. 3129-9736
  • Esther Rooftop. R. Basílio da Gama, 29, tel. 3256-1009
  • Fel. Ed. Copan - Av. Ipiranga, 200, lj. 69, tel. 3237-2215
  • Mundo Pão do Olivier. R. Sete de Abril, 425, lj. 1, tel. 3151-4909
  • Sorveteria do Centro. R. Epitácio Pessoa, 94, tel. 3129-8735
  • Z Deli. R. Bento Freitas, 314, tel. 3129-3162
Publicidade
Publicidade