Taxa
de juros sufoca classe média e retrai crescimento econômico
Foi o mesmo
velho golpe: juros bem firmes, nas alturas, para conter a vaga de
incertezas. Apesar dos sinais de que os preços estavam mais
comportados, sem fôlego para subir numa economia estagnada,
o Banco Central achou prudente repetir a receita.
Na quarta-feira
passada manteve a taxa básica da economia em 18,5%. Um remédio
pesado para os brasileiros, que sentem o soco dos juros corroendo
o orçamento doméstico, elevando preços nas
lojas, aniquilando empregos, paralisando as empresas e engordando
ainda mais a dívida pública.
O peso dos juros
paira, disfarçado, sobre o cotidiano de qualquer cidadão.
Vai-se ao botequim tomar um café e, lá estão
as conseqüências das taxas altíssimas, que não
deixam o dono do estabelecimento fazer financiamento para comprar
uma máquina nova, aumentar a produção e contratar
mais gente. Abre-se o armário para escolher uma roupa, lá
estão os juros embutidos no preço pago por cada uma
das peças.
Em qualquer
loja, fábrica ou armazém, o brasileiro é achatado
pelo tamanho dos juros, que são capazes de dobrar o valor
de um televisor comprado em 24 prestações numa loja
de eletrodomésticos. Ou de transformar um empréstimo
de R$ 1 mil, tomado em uma financeira, em uma dívida de mais
de R$ 3,8 mil, em apenas um ano.
A carga tributária
elevada torna ainda mais intransponível a linha que separa
ricos e pobres. As famílias com rendimento de até
dois salários mínimos sofrem tributação
em torno de 30% com os impostos indiretos embutidos nos preços
dos produtos. O porcentual cai para 18% quando a renda da família
é superior a 30 salários mínimos.
A vida também
é dura para o pequeno e o microempresário, justamente
os que mais necessitam de crédito para ficar de pé.
Eles são responsáveis por 67% das vagas de emprego
no país e movimentam 22% do Produto Interno Bruto (PIB),
mas só têm acesso a 10% do crédito liberado
pelo sistema financeiro.
Leia
mais:
- O
fôlego no fim
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Brasileiro
corta gasto com alimentação e come pior
Nem frango nem
arroz e feijão. O prato do brasileiro neste ano é
mais uma mistura de macarrão instantâneo e carne suína,
dois dos produtos que tiveram recorde de vendas em 2002. Para beber,
sai o refrigerante e entra o suco pronto. Mas essas mudanças
nos hábitos de consumo não elevaram os gastos nas
lojas.
Pelo contrário.
Um estudo mostra que o consumidor trocou os produtos para gastar
menos.
Com base nos
dados do Instituto Nielsen, cruzados com os do Instituto Brasileiro
de Pesquisas e Desenvolvimento Comercial, é possível
revelar o que o brasileiro está levando para casa assim como
a quantidade, e, com base nos resultados, traçar alterações
nos costumes de compra.
A venda de massa
instantânea, por exemplo cresceu 22,3% de janeiro a março.
Supermercados ouvidos pela Folha constataram estabilidade nessa
demanda nos meses de abril e maio. Essa taxa apurada no ano é
elevada.
No mesmo período
analisado, as lojas registraram uma elevação bem menor
(0,4%) nas vendas de itens alimentícios em geral, incluindo
o arroz e o feijão, segundo a Abras (Associação
Brasileira de Supermercados).
"Com o
veloz empobrecimento da população, não dá
para o brasileiro manter na despensa aquilo que tinha antes",
diz João Carlos Lazzarini, diretor de varejo da AC Nielsen.
"É natural que sejam feitas trocas temporárias."
As mudanças
fizeram o consumidor desembolsar menos. Levantamento do Instituto
Brasileiro de Pesquisas e Desenvolvimento Comercial, com mais de
5.000 pessoas em supermercados, mostra que o gasto médio
de compra por tíquete caiu de R$ 55,15 em 2000 para R$ 44,80
no ano. Mas o número de itens comprados subiu de 22,6 para
30,7.
Segundo ranking
da Nielsen, o "miojo" ocupa a quarta colocação
entre os produtos com maior expansão no volume de vendas
no Estado de São Paulo. Perde para o suco pronto (24,7%)
e para salgadinhos em pacote, fabricados por empresas como Elma
Chipps e Yoki. Para esse produto, a expansão foi de 77,4%.
No mesmo período,
os fornecedores de alimentos como Sadia e Seara, apresentaram um
crescimento acelerado no abate e venda de carne de porco para o
mercado interno. Frango e carne registraram, ao mesmo tempo, queda
na venda aos supermercados segundo balanço das companhias.
A maior fornecedora
do país, a Sadia, apurou expansão de 21,3% nas vendas
físicas (em toneladas) de suínos até março
em relação ao mesmo período de 2001. A venda
de aves e de industrializados (carne bovina, assados e grelhados)
caiu 17,8% e 6,4%, respectivamente. O dinheiro que entrou no caixa
da empresa, com a venda de carne suína, cresceu 78%.
Na Seara, empresa
do sul do país, foi preciso abater 430 mil cabeças
de suínos -26,8% mais do que em 2001- para atender a demanda
no início do ano. Ao mesmo tempo, a venda de 22,2 mil toneladas
de frango no primeiro trimestre foi 7,7% inferior ao comercializado
no mesmo período do ano passado.
Segundo Lazzarini,
pesquisa realizada em 2001 mostra que a classe média gasta
18% de sua renda mensal com a compra de alimentos. As classes de
menor poder aquisitivo gastam, em média, 40%. Quando os salários
ficam comprimidos, como agora, a saída é escolher
outros produtos nas prateleiras, diz.
Por isso, analistas
do setor acreditam que a receita com a venda de suínos continuará
a rechear o caixa das companhias no segundo trimestre. A demanda
não caiu, e não há elevação de
preços desse item. A Fipe, que apura as variações
preços no país, verificou quedas nos valores do quilo
dessa carne de janeiro a abril. Isso ajuda a manter a procura pelo
produto elevada. Algo que as companhias já começam
a chamar de a "farra do porco".
"Sabemos
que o frango continua sendo um produto barato. Mas a verdade é
que o preço da carne suína também está
atraente. O brasileiro está descobrindo esse produto",
diz Martinho Moreira, diretor da D'Avó Supermercados.
Lojas e fornecedores
não se arriscam a dizer, entretanto, que a busca de produtos
mais baratos atingiu muito as "commodities" como o arroz
e o feijão. Segundo a Folha apurou com dois fornecedores,
existem quedas na comercialização seguidas de ligeiras
elevações.
Há compras
em menor escala -de marcas mais baratas- e a despensa acaba sendo
recheada pelo macarrão, afirmam. Para a Perdigão,
entretanto, essa substituição não é
verificada.
"O que
achamos que poderá alterar o perfil das compras é
um constante aumento no desemprego. Ainda não verificamos
substituições naquele nível que tivemos no
início dos anos 80", afirma Antonio Zambeli, diretor
de marketing do grupo.
O que incentivou
as trocas de produtos naquela época foi a forte recessão
econômica vivida pelo país. O problema é que,
nos últimos doze meses, a forte queda na massa salarial abriu
espaço para que esse movimento se repetisse, afirmam analistas.
Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística),
o rendimento dos trabalhadores sofreu uma queda real de 6,3% nos
12 meses terminados em fevereiro.
(Folha de
S. Paulo)
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