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Entrevista
28/02/2005
Articulação é necessária para acelerar o desenvolvimento social

O cientista social Fernando Rossetti, 42, tem uma longa trajetória na área de educação: foi um dos fundadores da ONG Cidade Escola Aprendiz, da qual foi diretor executivo durante quatro anos. Além disso, atuou como jornalista na Folha de S. Paulo, cobrindo principalmente a área de educação, ao longo da década de 1990, período em que foi homenageado com o Grande Prêmio Ayrton Senna de Jornalismo e com o título de Jornalista Amigo da Criança, concedido pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância – Andi.

Hoje, Rossetti é diretor executivo do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas – Gife e comentarista do Canal Futura. Por ocasião do Diálogo de Fundações, Redes Sociais e o Governo Brasileiro, evento relevante para as diversas instituições que atuam no terceiro setor no Brasil, organizado pelo Banco Mundial (Bird) e pelo European Foundation Centre, ele concedeu esta entrevista ao Cidadania-e, sempre reiterando a importância da articulação entre as fundações, redes sociais e governo para o desenvolvimento social.

Cidadania-e: Como a realização desse Diálogo pode influenciar a atuação das fundações brasileiras?

Fernando Rossetti: Esse evento abre uma possibilidade para que fundações brasileiras, internacionais e o governo brasileiro possam dialogar em conjunto sobre as questões do desenvolvimento nacional e apresentar suas agendas específicas. Um dos fatores que vêm afetando o trabalho das fundações em particular é uma certa descontinuidade nas políticas públicas do campo social, que vêm mudando muito, de acordo com o governo que está no aparelho do Estado. Então, o Diálogo tem um papel importante na interlocução com o Estado no sentido de buscar a transformação das políticas públicas de educação, de saúde e mesmo de cultura em políticas do Brasil e não deste ou daquele governo, o que dá mais estabilidade e permite enfrentar melhor os desafios sociais brasileiros. Além disso, um dos desdobramentos desse encontro é a aliança do Gife com o European Foundation Center, o que vai permitir um maior intercâmbio de informações, experiências e pesquisas entre fundações brasileiras e fundações internacionais.

Cidadania-e: Quais os principais desafios que as fundações encontram para promover o desenvolvimento sustentável?

Fernando Rossetti: O ambiente legal e tributário é uma questão-chave que as fundações, em particular as que compõem o Gife, precisam trabalhar em conjunto com o Estado: o aperfeiçoamento dos sistemas de leis e de tributação, que, hoje em dia, muitas vezes dificultam o investimento social privado – ou não taxam onde poderiam taxar ou taxam onde não poderiam.

Esses mecanismos legais poderiam ser aperfeiçoados para que, por exemplo, as transferências de uma fundação para uma ONG, ou então de uma fundação internacional para uma nacional, fossem facilitadas. Outro ponto que pode ser destacado é a continuidade das políticas públicas, pois boa parte das fundações trabalha com grandes projetos de educação, saúde, e depende dessa estabilidade para ter um melhor desempenho. O terceiro ponto é o próprio Diálogo, que é um desafio considerável para o Brasil, não só para as fundações: reunir atores tão diferentes, com culturas e perspectivas diversas, para discutir o desenvolvimento no país. Mais de 90% dos associados do Gife trabalham em parceria, seja com outras ONGs, seja com governo ou empresas, e mesmo com esse índice o diálogo é sempre um desafio.

Cidadania-e: No Brasil, existe algum tipo de concorrência entre as fundações?

Fernando Rossetti: Existe concorrência, já que muitas vezes as fundações surgem de empresas que têm natureza de trabalho semelhante e concorrem no mercado. Mas o fato de o Gife existir, por exemplo, mostra que há uma disposição destas fundações para um diálogo. Elas percebem que sozinhas, com seus projetos, não é possível transformar a realidade social. Como um empresário, uma fundação privada investe seus recursos no campo social e o que ela quer é o maior impacto possível, a maior transformação possível e com a maior duração possível. Isso só acontece dialogando e se reunindo com os outros que estão atuando nesse campo. Há um raciocínio diferente, e não é uma mudança somente legal que deve acontecer: é uma questão cultural de se valorizar o diálogo e a articulação dos investimentos sociais privados e dos investimentos públicos no campo social, para que de fato a gente consiga transformações sociais maiores, mais consistentes e mais permanentes no campo social.

Cidadania-e: Até que ponto o poder público está presente para solucionar os problemas sociais e em que ponto ele falta?

Fernando Rossetti: É uma questão complexa. Quando se pensa em poder público no Brasil, a gente tem que incluir municípios, estados e governo federal, ou seja, um aparelho diverso. Podem acontecer desde situações em que o governante tem o seu próprio projeto e não articula com os outros setores – e, se estes quiserem se incluir, eles têm que entrar num projeto pré-montado – até situações, citando o extremo oposto, em que se discute muito, com todos os atores, e não se consegue fechar projeto algum. Entre todas essas experiências, também podem ser encontradas experiências positivas de atuação conjunta da sociedade civil, da fundação e do poder público.

Cidadania-e: O senhor poderia citar um exemplo positivo em que houve essa parceria?

Fernando Rossetti: Dos mais de 70 associados do Gife, existem muitos projetos que conseguem articular poder público, fundação e sociedade civil e é até difícil citar um exemplo sem desmerecer outro. Mas posso citar a idéia das tecnologias sociais, da Fundação Banco do Brasil, que é a de identificar tecnologias sociais e conseguir transformá-las em políticas públicas e em projetos de maior escala. Esse projeto é um exemplo de como é necessária a parceria, porque não é só a fundação, não é só a ONG que desenvolve, não é só o poder público que vai executar: são todos os atores sociais em conjunto.


Cidadania-e: Quais as principais metas das fundações para 2005?

Fernando Rossetti: As metas do Gife são, além de aprofundar a discussão do marco legal e tributário que envolve a atuação das fundações e institutos, desenvolver mecanismos mais eficientes de aferir os resultados dos investimentos sociais privados. É evidente que as organizações que atuam no terceiro setor têm uma autonomia muito grande, com projetos diversos, e não dá para dizer uma meta única para elas. Mas a tendência é caminharmos para uma evolução nos projetos sociais.

Cidadania-e: A desigualdade social brasileira tem um prazo para acabar, na sua avaliação?

Fernando Rossetti: Na nossa visão, é o mais rápido possível. Depende a partir de que perspectiva. Até onde eu sei, nenhum dos atores fixou um prazo. O prazo mais amplo que já existe é o das metas do milênio, até 2015, que tem algumas metas claras estabelecidas pelas Nações Unidas. O Brasil é um dos associados. Há este prazo no plano internacional, mas no Brasil não há, por parte nem do governo nem das organizações. A questão é que as mudanças sociais não são simples, envolvem mudanças culturais, mais amplas. Daí a necessidade de políticas públicas consistentes e contínuas, acima deste ou daquele governo. São políticas públicas da sociedade brasileira, do Estado brasileiro.

Cidadania-e: Nesse caminho para a igualdade social, em que ponto nós estamos?

Fernando Rossetti: Estamos num ponto muito especial e esse Diálogo de Fundações mostra isso. Nos tivemos todo um período de redemocratização do país a partir da década de 1980, quando novos atores sociais ingressaram no trabalho social, no campo público, e as fundações corporativas que o Gife representa estão neste momento mostrando a que vieram. As ONGs vêm trazendo sua competência em executar certos projetos; o governo, em alguns lugares do país, mostra gestões mais técnicas e aplica consistentes políticas públicas; as fundações e os institutos, muito mais profissionalizados, vêm buscando parcerias ao entenderem que sozinhos não vão conseguir resolver os desafios sociais brasileiros. Então, acho que é um momento de grande amadurecimento da sociedade brasileira como um todo, especialmente no terceiro setor, área que teve um boom no começo da década de 1990 e hoje está se profissionalizando, com bons profissionais, planejamento, monitoramento e avaliação de projetos, preocupando-se com a relação com as políticas públicas. Então não é mais um mosaico de pequenos projetinhos: o terceiro setor é um ator social importante, que está se articulando às políticas públicas.

AMANDA VIEIRA
do site da Fundação banco do Brasil

   
 
 
 

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