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17/12/2002 - 02h48

As maiores da produção científica

REINALDO JOSÉ LOPES
free-lance para a Folha de S.Paulo

Para quem procura se aperfeiçoar como pesquisador num grande centro científico, o caminho óbvio a seguir é os Estados Unidos. Mas há também centros de excelência em outros países. Num ranking fornecido à Folha pelo ISI (sigla, em inglês, de Instituto para a Informação Científica), listando as 20 instituições que mais produziram artigos científicos nos últimos dez anos, nada menos que 7 não são americanas.

Johnathan Gregson/Getty Images
Torre em um dos campi da Universidade do Texas, nos EUA, a segunda no ranking da ISI
O ISI indexa as revistas e periódicos científicos mais importantes do mundo, e seus levantamentos são considerados por cientistas e instituições como o guia mais confiável para medir o desempenho no campo. O critério é o seguinte: quanto mais a instituição publica em revistas científicas, melhor a sua posição. Os dados do instituto são acessíveis apenas a assinantes (em geral, centros de pesquisa ou agências de fomento).

O americano David Pendlebury, gerente do departamento de pesquisa do ISI, explica que tipo de publicação ajudou a formar o ranking: "Os dados resultam de uma análise de artigos e revisões (aquilo que nós consideramos artigos substanciais), mas não incluem resumos, cartas ao editor, correções etc.". A contagem só inclui artigos em revistas científicas que usam o critério de "peer review". Nessa "revisão por pares", os trabalhos são examinados por outros pesquisadores da mesma área, anonimamente, antes de serem aceitos para publicação.

De acordo com Pendlebury, é preciso levar em conta que os dados revelam a produção bruta de cada instituição —o que naturalmente beneficia as maiores. Esse é um dos motivos que dá à Academia Russa de Ciências, cujos laboratórios estão espalhados por todo o país e abrigam boa parte de seus cientistas, o primeiro lugar da lista.

Usando os mesmos critérios, a universidade latino-americana com a melhor colocação é a USP (Universidade de São Paulo), que ocupa a 279ª posição.

A participação do Brasil na produção científica entre os países latino-americanos é significativa, e andou crescendo ainda mais nos últimos anos. Só em 2001, pesquisadores brasileiros publicaram 10.555 artigos científicos indexados pelo ISI —o que corresponde a 40% da ciência produzida no subcontinente. Hoje, o país responde por 1,4% da produção científica mundial, tendo quadruplicado sua participação desde os anos 80.

Embora a preponderância brasileira seja, em parte, reflexo do tamanho da população e da economia brasileiras quando comparadas às dos demais países, o Brasil é o nono país que mais cresce em pesquisa científica.

Os dados fornecidos à Folha pelo ISI revelam que, das 20 instituições que mais produzem ciência na América Latina, 12 são brasileiras. A pesquisa médica é a área na qual a USP, a primeira colocada do ranking, mais se destaca —em parte graças à tradição de estudos de "alto nível", segundo afirma Luiz Alberto Bacheschi, presidente da comissão de pós-graduação da Faculdade de Medicina da USP. Além dos estudos do genoma humano, Bacheschi também destaca as pesquisas em cardiologia, neurologia e bioengenharia.

"Se eu fosse explicar o nosso destaque com uma palavra, seria 'tradição'", diz George Kleiman, coordenador de pós-graduação do Instituto de Física Gleb Wataghin, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). A pesquisa em física responde pela maior parte das pesquisas publicadas pela universidade —segundo lugar no ranking latino-americano— em revistas científicas internacionais.Kleiman diz que o instituto procura conciliar a pesquisa básica com a aplicada, investigando problemas da física teórica e novas alternativas tecnológicas. "Existe uma forte realimentação entre essas áreas", afirma Kleiman.

A Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) e a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) são as duas únicas instituições brasileiras que fazem parte da lista das 20 maiores em produção científica da América Latina. A pesquisa médica da Fiocruz rendeu à instituição sua posição na lista —é uma das pioneiras no país no estudo de doenças tropicais.

A Embrapa desenvolve pesquisas que vão desde a criação de novas variedades agrícolas até o manejo de florestas. "Temos tanto centros voltados para produtos quanto ligados à questão ambiental ou aos ecossistemas das várias regiões do Brasil", diz Júnia Rodrigues de Alencar, da Coordenadoria de Acompanhamento e Avaliação. Apesar de a instituição não ter programa independente de pós-graduação, ela orienta e abriga pós-graduandos de universidades públicas, com as quais mantém convênios.

A Argentina, por sua vez, aparece no ranking latino-americano das 20 maiores com apenas duas instituições —Universidade de Buenos Aires (3º lugar) e Instituto Cardiológico de Buenos Aires (20º). Medicina e química estão entre as áreas de pesquisa mais avançadas das duas instituições argentinas.

Mas a comunidade científica do país sofre os efeitos da crise social e econômica que custou quase um quarto do PIB (Produto Interno Bruto —soma dos valores de todos os bens e serviços finais produzidos em um país) argentino. Os dois principais problemas são similares aos que enfrentam os demais países em desenvolvimento, ainda que tenham se agravado por conta da crise: emigração de jovens pesquisadores e falta de recursos. O governo, por exemplo, gastava 1,72% do orçamento nacional em programas de pesquisa, ciência e tecnologia. A cifra caiu para 1,04% neste ano. Em termos nominais, o gasto foi até maior. Mas a inflação de 40% corroeu o poder de compra dos pesos com os quais o governo financia os programas. Hoje, os argentinos gastam apenas 0,39% do PIB em pesquisa e desenvolvimento, cifra que chegava a 0,45% em 1999. Em 2003, a previsão é que os gastos fiquem em 0,32% do PIB.

Apesar dos problemas, os institutos de pesquisa conseguiram manter um corpo estável de pesquisadores e, em 2002, até aumentá-lo. Hoje, há 3.955 pesquisadores nos programas de pesquisa argentinos. O secretário de Ciência e Tecnologia, Julio Luna, diz que o setor sofreu com a crise, mas não foi "destruído". "Contamos, e somos gratos por isso, com uma ajuda grande do Brasil, que manteve e financiou todos os programas bilaterais nos seis primeiros meses deste ano", diz.

Colaborou Marcelo Billi, da Folha de S.Paulo, em Buenos Aires

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