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23/07/2010 - 11h52

Abaixo os Simpsons!

IVAN LESSA
COLUNISTA DA BBC BRASIL

Não somos apenas nós, brasileiros, que nos indignamos com a série de desenhos animados de "Os Simpsons", ainda agora tendo completado 20 anos de existência.

A família dysfunctional (termo para o que fomos buscar lá no fundo do baú a não palavra "desfuncional") por excelência, e até mesmo majestade, mexe com tudo e todo mundo.

Países inteiros, mais seus habitantes, levaram um pau da turma amarelinha: Austrália (mais de uma vez), Canadá, França, Inglaterra (a Rainha e a Família Real levaram as delas), o continente africano inteiro e até mesmo o Brasil.

Sendo que o Brasil foi o único a reclamar oficialmente da gozação amiga (nada que se compare a "Family Guy" ou a "South Park"). Tivessem eles um representante em nossas terras e o governo, mais o povo em peso, pediria sua execução imediata por esquartejamento, seguido de expulsão do país do que dele restasse, passando para o território do exagero politicamente incorreto --e vou cunhar-- "simpsoniano".

Não somos, no entanto, os únicos burraldos na face da Terra. Aqui mesmo, no país que escolhi para viver, há muitos e, ao que parece, com as correntes migratórias, seu número tende a aumentar.

Vamos até o condado de Somerset, no sudoeste da Inglaterra. Lugar bonito, simpático, com suas classes razoavelmente divididas, como no resto do país, e que possui inclusive bons colégios. Em cuja lista se encontrava até agora, a meu ver, e de muita gente boa e mais informada do que eu, o Community School de Kingsmead, na supostamente alfabetizada cidade de Wiveliscombe.

O que aconteceu com a localidade em questão? Terá sido invadida pelos Simpsons? Estará dela e deles debochando a impagável família "desfuncional"?

Não. O problema da cidade, mais precisamente, do colégio citado, é o fato de nele ensinarem "Os Simpsons", procurando analisá-los, nos estudos mediáticos.

Na cidade de longo nome (chato de digitar e mais ainda, depois dessa, de nela viver) mais de 400 pessoas, creio que letradas e portadoras de sapato nos dois pés, assinaram uma petição para que o colégio parasse imediatamente com os "Simpsons". Porque o colégio ensina, mediante episódios da série animada, o uso da linguagem na mídia, ou comunicação, conforme se dizia nos bons tempos pré-MacLuhan.

Um dos pais, ilustríssimo senhor Joseph Reynolds, que é inglês e não brasileiro, declarou à imprensa que resolveu ouvi-lo, que a série "não constitui matéria adequada para o ensino de sua filha (lá dele) e de suas colegas."

Deixo o condado, abandono a cidade, volto para meu canto em Londres e, como de hábito, empunho o pinho da saudade.

Desta vez me lembrando como, lá por volta dos anos 40 e 50, no Liceu Franco-Brasileiro, no Rio, um professor, de origem norueguesa (nós o chamávamos de Mister), Janssen, por nome, nos ensinou, durante algumas aulas, não só inglês como português valendo-se das histórias em quadrinhos que líamos no Gibi ou no Globo Juvenil.

Lembro-me particularmente de aulas com e sobre Pafúncio e Marocas, da HQ "Vida Apertada", "Ferdinando", "O Espírito" e algumas outras. Nem os pais nem os diretores do estabelecimento de ensino reclamaram. Bons tempos. Bom colégio, bons colegas, bom professor. O passado de vez em quando engata essa: ser bom.

Um pulinho no tempo, como na máquina inventada pelo Dr. Papanatas (ou seria o Professor Bomba?) da HQ Brucutu. 1964. Que não foi só ano de golpe militar no Brasil. Na Itália, Umberto Eco publicava o que até outro dia mesmo era tido como livro seminal: Apocalípticos eIntegrados, em nosso país editado pela Debates. Um volume com ensaios semióticos, ou seja, pelo viés (como adoram dizer hoje em dia) da semiótica, que nada mais é do que o estudo detalhado de fenômenos culturais.

Umberto Eco, antes do enorme sucesso mundial de "O Nome da Rosa", apreciava a disciplina de dissecar, ou desconstruir, como chamaríamos hoje, a cultura popular.

Lá estão ensaios clássicos sobre Minduim, Steve Canyon, o Super-homem e congêneres. Fui dar uma relida. Uma delícia. Que estará semiotizando agora o grande ensaísta? O que eu não daria para ler o Eco, não às voltas com Foucault e seu pêndulo (não gosto dele como ficcionista), mas equilibrando no ar, ao mesmo tempo, como mágico e malabarista que é (ou foi) The Simpsons, King of the Hill, Family Guy e tantas outras animadas animações.

Enquanto isso, em Somerset, na Inglaterra...

 

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