Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 

andré singer

 

17/11/2012 - 03h30

Rever a pena

A rigor, seria preciso aguardar o fim da ação penal 470 para iniciar a análise de conjunto que o assunto requer. Se às autoridades cabe acatar os vereditos do STF, que para tanto é soberano, à opinião pública --ou o que dela resta em tempos de acelerada massificação-- cumpre discutir com autonomia e desassombro as conclusões proferidas pelo tribunal.

No entanto, em face da inopinada inversão de pauta operada pelo relator, que resultou em sentença de alto impacto político na segunda-feira passada, impõe-se avaliar de imediato a pena de dez anos e dez meses aplicada a José Dirceu. Sobretudo pela desproporção deste ficar recluso pelo menos um ano e nove meses em penitenciária de segurança máxima.

O respeito ao Estado de direito garantiu ampla liberdade e independência ao procurador e aos juízes --assim como aos advogados de defesa, diga-se-- no decurso dos trabalhos. Tal apego às regras, e também ao contraditório no andamento dos debates televisionados, conferiu legitimidade às decisões da corte. A dosimetria aplicada ao ex-chefe da Casa Civil, contudo, modificou a imagem projetada pelo Supremo.

Tendo inegável papel na história do PT, a prisão do ex-presidente da sigla atingirá o partido, ocasionando imagem forte para a posteridade. A suspeita que paira é se o exagero punitivo não mirou tal alvo, distorcendo, assim, a finalidade do processo. Isto é, se, no caso, os preceitos de equilíbrio e razoabilidade foram deixados de lado com o fito de ferir um símbolo partidário.

Note-se que a reclusão de Dirceu em regime fechado deriva da soma de duas acusações, a decorrente de corrupção ativa e a concernen- te à polêmica tese de formação de quadrilha. Caso tivesse sido condenado apenas pela primeira --ela própria objeto de disputa sobre a ausência de provas--, o líder petista teria direito à modalidade semiaberta.

Acresce que o debate sobre o segundo tema dividiu a corte. Não somente Lewandowski e Toffoli absolveram Dirceu, como também o fizeram, nesse tópico, Rosa Weber e Cármen Lúcia. Esta última, que havia realizado o ataque mais duro à argumentação do caixa dois quinze dias antes, lembrou que quadrilheiros típicos eram Lampião e seu grupo, não os envolvidos na AP 470.

O confronto de 22 de outubro no plenário do STF mostrou o quanto, nas circunstâncias, há de duvidoso no suposto crime de formação de quadrilha, o qual, todavia, gerou uma pena (no item) quase máxima para o acusado. Como o princípio do "in dubio pro reo" é fundamental no espírito da Justiça, que não é o de retaliar, mas o de garantir o acatamento da lei, faz-se necessário rever a punição imposta a José Dirceu.

ANDRÉ SINGER escreve aos sábados nesta coluna.
avsinger@usp.br

andré singer

André Singer é cientista político e professor da USP, onde se formou em ciências sociais e jornalismo. Foi porta-voz e secretário de Imprensa da Presidência no governo Lula.

 

As Últimas que Você não Leu

  1.  

Publicidade

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página