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barbara gancia

 

01/07/2012 - 02h30

Woody Allen me pegou na curva

DE SÃO PAULO

As aparências não enganam e está na cara que Woody Allen nunca foi flor que se cheirasse. Mas até ontem não me comovia o fato de que o comediante que deu outro rumo à minha existência com "Noivo Neurótico, Noiva Nervosa" tivesse processado sua produtora e melhor amiga Jean Doumanian quando seus negócios começaram a desandar. Ou que, ao ser flagrado pegando a filha da mulher com a qual produziu um rebento, ele usasse a desculpa de que o "coração quer o que o coração quer", afirmação que foi feita para Walter Isaacson, hoje mais conhecido como o biógrafo de Steve Jobs.

Não. Confesso que Woody Allen, "o homem", que durante meses apareceu na primeira página dos tabloides na batalha nos tribunais com Mia Farrow, nunca me interessou. Não sou de fulanizar coisas de que gosto. E Allen recentemente me deu "Tudo Pode Dar Certo". Sem contar que já enriqueceu minha vida com "Tudo o Que Você Sempre Quis Saber Sobre Sexo e Tinha Medo de Perguntar", "A Última Noite de Bóris Gruschenko" e "O Dorminhoco". E eu não sou o tipo de pessoa que, diante do teto da Capela Sistina, se põe a pensar: "Será que o tipo que pintou isso aqui seria capaz de me passar uma doença venérea sem me contar?".

Ilustração Alex Cerveny

Acontece que na semana passada eu li um texto muito bem escrito sobre o lançamento de seu mais recente filme, "Para Roma, com Amor", que era de uma crueza inédita, parecia quase um acerto de contas de tão ácido. Descia a lenha tanto no artista quanto no homem. E ainda fazia uma revelação que me deixou como dívida algumas horas a menos de sono.

Segundo Sam Tanenhaus, o jornalista que acompanhou Mr. Allen durante as filmagens em Roma, o alter ego do diretor, ator e comediante não é o personagem perseguido e com problemas de inferioridade em relação às mulheres que a gente sempre imaginou.

Está certo que o próprio Allen está cansado de frisar que erra quem pensa que ele é aquele camarada na vida real. Mas, diz o autor, o verdadeiro Allen está mais para Lester, o personagem de Alan Alda em "Crimes e Pecados", de 1989.

O nobre leitor está lembrado dele? O filme é exatamente o mesmo que "Match Point" (só que bem melhor e com grandes atores), sobre continuar a tocar a vida normalmente, sem maiores consequências, depois de cometer um crime terrível. E o personagem em questão é aquele produtor de TV bonachão e boa-pinta, super bem-sucedido, poderoso, para lá de vaidoso e ralo, que não demonstra o menor constrangimento em pisotear os outros.

Em outras palavras, mesmo avisado de antemão pelo diretor, há anos, o público (i.e. esta demente que vos fala) vem engolindo todas as iscas erradas que lhe são atiradas. Quando alguém poderia pensar que o Lester é o verdadeiro Woody Allen?

É como se a gente descobrisse que o imperador Adriano virou asceta. Ou que a Ivete Sangalo é intragável. Ou que a Palmirinha só come "delivery". Ou que o Adnet e a Calabresa não trepam. Ou que o segundo emprego da Tatá Werneck é ser contadora. Ou que o Bruno Senna, aquele que bate mais do que bengala de cego, é mais talentoso do que o tio. Bem, acho que já deu para entender o grau do meu espanto.

Já vou avisando que estou fora de "Para Roma, com Amor". Iria ver, sem problemas, se não tivesse assistido a outro caça-níqueis chamado "Meia-Noite em Paris". E se, muito antes desse, não tivesse lido a "Autobiografia de Alice B. Toklas", de Gertrude Stein. Mas como, infelizmente, assisti e li, só posso desejar ao sr. Allen boa sorte em suas parcerias futuras com as secretarias de Turismo das grandes capitais. Farsante maldito.

barbara gancia

Barbara Gancia, mito vivo do jornalismo tapuia e torcedora do Santos FC, detesta se envolver em polêmica. E já chegou na idade de ter de recusar alimentos contendo gordura animal.

 

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