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clóvis rossi

 

22/06/2012 - 14h06

Uma guerra que deveria ser de todos

Ao assumir a Presidência do México, em 2006, Felipe Calderón pôs as Forças Armadas para combater o crime organizado, em especial o narcotráfico, que é o eixo em torno do qual gira boa parte das demais atividades criminosas.

No domingo que vem, 1 de julho, 49 milhões de mexicanos vão às urnas para eleger o sucessor de Calderón. Nenhum dos candidatos --nem mesmo Josefina Vázquez Mota, do mesmo Partido de Ação Nacional de Calderón-- defede a continuação da guerra frontal ao narcotráfico.

O uso das Forças Armadas em tarefas teoricamente policiais foi então um fracasso? Não é bem assim, a julgar por pesquisa recente em que 80% dos consultados se disseram favoráveis a continuar com o Exército nessa guerra. Uma porcentagem expressiva por si só mas que se torna ainda mais significativa quando se considera que há uma divisão de opiniões a respeito do resultado da guerra: 47% acham que está havendo avanços, mas 49% ou acham que está igual ao que sempre foi (19%) ou que a guerra está sendo perdida (30%).

É possível que essa percepção relativamente negativa se deva ao fato de que a guerra de Calderón provocou 50 mil mortes nos seus seis anos de mandato, uma cifra colossal. O governo alega --e parece ter razão-- que mais de 80% das mortes são causadas por choques entre os cartéis do narcotráfico.

Seja como for, o noticiário a respeito do México é dominado por corpos espalhados por toda a parte, por cabeças separadas dos corpos, pelos cadáveres que aparecem pendurados em pontes em cidades como Monterrey, por exemplo, importante centro econômico.

Comenta Robert C. Bonner, com a experiência de quem trabalhou na famosa DEA norte-americana, a agência anti-narcóticos e também como comissário da agência de Proteção de Fronteiras: "Qualquer que seja o vencedor [das eleições do dia 1.o] terá que enfrentar o mais destacado desafio colocado ao país hoje, que é a batalha contra os cartéis da droga. E, apesar de todas as manchetes negativas, o próximo presidente descobrirá que o governo fez grandes ganhos nos últimos cinco anos no caminho para derrotá-los".

Por quê então os candidatos fogem da questão, limitando-se a dizer platitudes a respeito dela? Muito provavelmente porque o inimigo é poderoso. Não apenas pelas armas que empunha mas pelo volume de negócios que opera.

Vanda Felbab-Brown, especialista da Brookings Institution, calcula que o tráfico de drogas responde por entre 3% e 4% do Produto Interno Bruto mexicano, algo em torno de US$ 30 bilhões (R$ 61 bilhões). Emprega, além disso, pelo menos um milhão de pessoas em um país de 49 milhões de eleitores.

A omissão dos candidatos impede que se debatam, durante a campanha, eventuais alternativas à guerra nos termos definidos pelo presidente Calderón. É um debate que interessa obviamente ao Brasil que tem um problema sério de crime organizado, como todo o mundo sabe, e que não consegue combatê-lo sem recorrer subrepticiamente às Forças Armadas, como no caso da recuperação pelo Estado de algumas favelas do Rio.

Mais: a taxa de homicídios no Brasil é superior à do México. São 25 por 100 mil habitantes contra 18 (dados de 2011). Logo, seria conveniente acompanhar a experiência mexicana mais de perto, ainda mais que Calderón andou arranhando a ideia de propor a descriminalização das drogas como forma de enfrentar o problema --um tema que aparece e desaparece, no Brasil e na América Latina, com igual facilidade.

Em discurso à Assembleia Geral das Nações Unidas, Calderón afirmou o óbvio: a maneira de derrubar os cartéis é cortar a demanda. Mas --acrescentou-- se for impossível, os governos seriam obrigados a considerar "alternativas de mercado", um eufemismo para legalizar a venda.

O presidente uruguaio José Mujica, aliás, acaba de adotar uma "alternativa de mercado" para pelo menos um droga, a maconha, ao enviar projeto de lei ao Congresso tornando o Estado o vendedor único da erva.

Enfim, é o tipo do assunto que precisa ser encarado de uma vez. A alternativa é trancar-se em casa para evitar os arrastões nos restaurantes e blindar as casas/apartamentos para evitar os arrastões nelas e neles.

clóvis rossi

Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. É autor de obras como 'Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo' e 'O Que é Jornalismo'. Escreve às terças, quintas, sextas e domingos.

 

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