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josé luiz portella

 

08/11/2012 - 03h00

Turista acidental

Muita gente viaja para o exterior, passeia, sente-se agradavelmente bem e atribui o desfrute à condição de turista. Não percebe o que está por trás dessa curtição. Não se dá conta da infraestrutura, dos serviços e das condições oferecidas.

Essas pessoas andam em Nova York pela Quinta Avenida, Madison, Times Square e adjacências com enorme prazer. Sem repararem na largura das calçadas (amplas), o que dá mais conforto; na falta de trânsito de entrada e saída (drive way), eliminando a tensão, comum por aqui, de se ficar atento para não ser atropelado. As lojas e estabelecimentos dão acesso direto à calçada, sem empecilhos, e a praticamente ausência de buracos. Andar fica mais fácil.

Gestores de políticas públicas, em férias, não as aproveitam para absorverem o que está embaixo do nariz. Sentir-se bem não é função somente do estado de turista.

Em São Paulo, o pronto-socorro de Ortopedia do HC registrou que de cada cinco pessoas que ali chegam com traumatismos, uma (ou seja, um quinto) foi vítima de queda em calçadas na região das avenidas Paulista, Rebouças e proximidades.

Há o aspecto humano, que é o mais importante: pessoas mais velhas que se machucam com gravidade por conta do estado e das formas de utilização das calçadas. O que as induz a não saírem de casa, não caminharem, não desfrutarem.

E cada paciente custa em média R$ 40 mil para o sistema de saúde, tirando, sem necessidade, recursos de outros tipos de atendimento indispensáveis. Foram 197 em três semanas de agosto.

Gabriela Carvalho
Entrada e saída de veículos atrapalham o movimento da calçada na Av. Paulista
Entrada e saída de veículos atrapalham o movimento da calçada na Av. Paulista

Em Nova York, os pedestres estão ganhando mais espaço. Na concorrida região da Broadway, aumentou em significativos 53%. E esse processo, por ser bem planejado, não agravou o trânsito de veículos, que ficou 4% mais rápido.

Em Londres, as calçadas são projetadas para incentivar a caminhada. Intervenções feitas pela Autoridade Metropolitana de Transportes (Transport for London), pois caminhar é uma forma importante de locomoção.

Nesses caminhos, há mapas de sinalização, melhoria da iluminação, placas de informação para pedestres, bancos e praças.

É proibido estacionar em cima, em frente às calçadas ou em qualquer lugar de acesso.

Nada que não pudesse ser feito por aqui no Brasil. Especialmente nas grandes cidades.

Se tivéssemos uma política de estacionamento com prédios ou locais subterrâneos, poderíamos proibir estacionamento junto a calçadas e aumentar a largura delas, onde há menos tráfego de veículos, ou criar faixa para o transporte público, inclusive de táxis, nas vias de passagem.

Passear como turista acidental impede-nos de cobrar e propor melhorias que estão ao nosso alcance.

Por trás do bem-estar existem políticas públicas. Quase tudo que nos dá prazer ao andarmos pelo mundo, é possível se ter aqui.

Não temos que aceitar tanto incômodo com resignação e fatalismo. Como se fosse uma inevitável doença tropical.

Turismo também é cultura.

Divulgação/We-love-new-york.com
Calçada em Nova York
Calçada em Nova York
josé luiz portella

José Luiz Portella Pereira, 60, é engenheiro civil especializado em gerenciamento de projetos, orçamento público, transportes e tráfego. Foi secretário-executivo dos Ministérios do Esporte e dos Transportes, secretário estadual dos Transportes Metropolitanos e de Serviços e Obras da Prefeitura de São Paulo e presidente da Fundação de Assistência ao Estudante. Formulou e implantou o Programa Alfabetização Solidária e implantou o 1º Programa Universidade Solidária. Escreve às quintas-feiras.

 

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