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luiz carlos bresser-pereira

 

11/02/2013 - 03h00

Pobre Síria

As estimativas das Nações Unidas são de que já morreram 60 mil pessoas na guerra civil da Síria. Uma guerra na qual os rebeldes são apoiados pela Arábia Saudita, com certa discrição pelas potências ocidentais, e com crescente determinação pelos governos e grupos terroristas islâmicos de orientação suni, inclusive a Al-Qaeda. Em nome do que? "Da democracia", nos respondem.

Mas valerá a pena matar 60 mil indivíduos para derrubar uma ditadura secularista que há mais de 50 anos garante a estabilidade política na Síria? E qual a probabilidade de que venha a se estabelecer na Síria um verdadeiro governo democrático?

Começo respondendo a última pergunta. Como estamos vendo na Líbia, é pouco provável que, na hipótese de Bashar al-Assad ser derrubado, se instale na Síria uma democracia. Como na Líbia, e em contraste com o que aconteceu no Egito e na Tunísia, não houve rebelião popular ali, mas houve o aproveitamento da Primavera Árabe que acontecia em outros países por elites tribais ou sectárias sunitas para derrubar um governo alauíta - grupo étnico-religioso associado aos xiitas.

Nada indica que a Síria esteja madura para a democracia; a guerra civil hoje em curso não tem como objetivo a democracia.

Para os sunitas islâmicos, inclusive a Arábia Saudita, é uma forma de estender seu poder para mais um país; é uma forma de compensar a perda do Iraque, que antes da guerra empreendida pelos Estados Unidos, era governado por sunitas, e, depois dessa guerra, passou para o domínio da maioria xiita. Para o Ocidente é a forma de derrubar um governo nacionalista que sempre se manteve independente da França, da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos.

Quando começaram as hostilidades, a maioria da mídia Ocidental passou a cobrar a intervenção armada. França e Grã-Bretanha apoiaram a ideia, mas os Estados Unidos, escaldados com o desastre político (além de humano) que foi a Guerra do Iraque, revelaram-se menos entusiasmados, e a China e a Rússia vetaram a proposta. Para justificar a intervenção os rebeldes denunciavam os massacres de civis praticados pelo governo sobre uma oposição desarmada.

Quando, entretanto, foi-se ver mais de perto o que estava acontecendo, verificou-se que havia uma guerra civil com rebeldes armados, e que os massacres aconteciam dos dois lados.

Também se verificou que o regime autoritário da Síria tinha um apoio das classes médias muito maior do que se esperava, porque mantinha a ordem pública, e porque protegia as minorias religiosas cristãs. Isto pode ser surpreendente para um regime islâmico (que é assim denominado porque não reconhece a separação entre a religião e o Estado), mas é normal no caso do regime muçulmano secularista como é o do Partido Baath sírio.

O Ocidente também se surpreendeu com a resistência do governo Sírio ao ataque de uma poderosa coalizão de forças internas e externas da qual ele próprio fazia parte. Mas o fato não é surpreendente se considerarmos que o regime sírio continua a contar com o apoio da população, do Irã e da Rússia. Na verdade, esse é mais um capítulo sangrento da luta entre sunitas e xiitas, e da estratégia de dominação do imperialismo ocidental sobre o triste e conturbado Oriente Médio. A vítima é o povo sírio.

luiz carlos bresser-pereira

Luiz Carlos Bresser-Pereira é professor emérito da Fundação Getúlio Vargas, onde ensina economia, teoria política e teoria social. É presidente do Centro de Economia Política e editor da 'Revista de Economia Política' desde 2001. Foi ministro da Fazenda, da Administração e Reforma do Estado, e da Ciência e Tecnologia. Escreve a cada duas semanas, aos domingos.

 

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