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luiz caversan

 

06/10/2012 - 08h43

Minha triste cidade

Quanto eu era criança, minha mãe tinha uma mania estranha: toda vez que mudávamos de casa (e foram muitas mudanças ao longo da infância...), assim que o caminhão partia com toda a nossa tralha ela reunia a família (pai, irmãs, primos e agregados), distribuía vassouras, panos, baldes e outros materiais de limpeza e comandava uma tremenda faxina na casa que ficaria para trás.

"Ninguém é obrigado a ver a nossa sujeira", dizia ela, verificando se janelas, portas, paredes, umbrais, cantos e passagens de todos os cômodos estivessem completamente livres de qualquer marca de uso.

Lembrei-me dessa faceta da Dona Julia dias atrás ao vagar pelo centro de São Paulo, aquele que até hoje é chamado centro novo, do outro lado do viaduto do Chá para quem parte da praça da Sé, ou seja, praça da República, ruas 7 de Abril Xavier de Toledo, Largo Paissandu, São João.

Pedaço que, aliás, conheço como a palma da minha mão --assim como todas as demais áreas do centro-- por conta dos muitos quilômetros percorridos, pastinha debaixo do braço, como office-boy que fui boa parte da adolescência

Mas o fato é este: o que encontrei fui um "centro novo" velho, sujo, abandonado, entristecido, sem a menor sobra o certo glamour que ostentava tempos atrás, sem a menor cara de área central da cidade importante que é São Paulo.

Naquele mesmo dia, postei o seguinte texto no Facebook: "Andei pelo chamado 'centro novo' de São Paulo, hoje na hora do almoço. É a região que já foi chique da República, Sete de Abril, São João e adjacências. Um horror. Merda humana nas calçadas como se fosse papel de bala, nóias dormindo em seus andrajos, calçadas completamente esburacadas, lixos e restos de comida pelos cantos, pelas sarjetas, pelo meio da rua, ambulantes praticamente atacando os transeuntes, centenas de velhinhos comprando ouro ou vendendo qualquer porcaria, fachadas pichadas ou cobertas de tapumes, terminais de ônibus improvisados e todo tipo de imobilidade urbana. Pela primeira vez na vida, e vida de quem sempre frequentou as ruas desta cidade, tive muita, muita vontade de ir embora de São Paulo. Triste."

Sim, triste fiquei de verdade por ter tido vontade de, pela primeira vez mesmo, me mandar daqui, ir embora pra qualquer passárgada ainda que inexistente.

Ao contrário do que alguns amigos quiseram intuir, meu post, assim como este texto, não era uma crítica partidária à administração municipal. Tratava-se, primeiro, de uma irremediável constatação --vai lá naquela área agora e verá...-- e, segundo, apenas de um suspiro melancólico de quem ainda e sempre ama esta cidade triste.

Quem sabe agora que estamos prestes a mais uma mudança, o atual prefeito não se inspira na Dona Julia e entrega a casa, ao menos, um pouco mais limpinha...

luiz caversan

Luiz Caversan é jornalista e consultor na área de comunicação corporativa. Foi repórter especial, diretor da sucursal do Rio da Folha, editor dos cadernos 'Cotidiano', 'Ilustrada' e 'Dinheiro', entre outras funções. Escreve aos sábados.

 

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