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luiz caversan

 

22/04/2006 - 00h00

Melancólicos solidários

Toda vez que escrevo sobre depressão, deprimidos ou sobre os efeitos desse transtorno na vida das pessoas ocorre o mesmo fenômeno: minha caixa postal fica repleta de e-mails de leitores revelando sua identificação com o problema, expondo seus casos particulares ou apenas desabafando.

Quando a questão é a dificuldade que o deprimido tem de se comunicar com os que os circundam, ou, pior, o preconceito da sociedade em relação àqueles que chamo de "menos iguais", o número e a contundência dos relatos surpreendem.

Assim foi no passado, assim ocorreu recentemente, a partir dos artigos "O estigma dos menos iguais", "Depressão, sexo e sociedade" e "Mirabelle e a depressão".

Não apenas para dar voz a essas pessoas, mas também para que outras mais possam identificar maneirar de enfrentar ou conduzir ou tratar ou conviver com seu problema, reproduzo a seguir, de forma reduzida e preservando a identidade dos autores, algumas dessas tocantes mensagens.

Minha mãe teve uma crise depressiva há dez anos, foi ao médico psiquiatra e começou a tomar os remédios. No dia seguinte estava ótima, em dezembro agora de 2005 a depressão voltou, aquilo que os médicos dizem ser depressão recorrente. Pois é, já tentou de tudo e nada, já experimentou todos os remédios de tarja preta existentes e de última geração, nada... Ela não comia, não dormia, agora ela está um pouco melhor. Eu sou filha dela e entendo isso, mas outras pessoas, inclusive meu irmão, não aceitam, não entendem, cobram, azucrinam...

Sou psiquiatra especialista em Depressão e Ansiedade e gostei muito do artigo "O estigma dos menos iguais", publicado na Folha Online/Pensata, em 08/04. Você considera reações emocionais típicas de um deprimido que, muitas vezes, são confundidas com características psicopatológicas da Depressão e não são, mas levam a um agravamento do quadro, numa espécie de círculo vicioso. Além disso é transmitido ao leitor o quão inadequada e distorcida, se não cruel, é a visão, preconceituosa, de que Depressão não é doença, mas uma "qualquer outra coisa" que deveria ser tratada "não sei de que jeito", de preferência, pelo próprio paciente mesmo. Infelizmente, esta visão, tem contribuído, em muito, para a cronificação de uma doença grave e incapacitante.

Você conhece a Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (ABRATA)? Esta associação, sem fins lucrativos, formada por pacientes e familiares, organiza uma série de ações que visa acolher e informar as pessoas sobre doenças como Depressão e Transtorno Bipolar. Os objetivos são lutar contra o estigma social e favorecer a busca e a adesão ao tratamento adequado. O site deles é www.abrata.com.br.

Convivo com essa dor interna desde pequeno, essa angústia indefinível que já foi definida como as dores que sentem as almas quando estão no inferno.

Sem me alongar na minha história e apenas expondo o quanto os outros não compreendem o que sentimos, já ouvi um palestrante da religião que professo dizer que "não se iludam com essa história de depressão, parta pra cima, estude, trabalhe, etc.", como se fosse uma reles "frescura" da nossa parte.

De fato, eu estudo, trabalho, tenho religião, faço exercícios físicos, me alimento bem. Isso ajuda, mas... não é tudo. Existe um dia, uma hora em que sempre estaremos tristes sem razão, com aquelas dores em lugar nenhum e todo lugar ao mesmo tempo.

O senhor está correto, poucos conhecem o que passamos e o tratamento cultural dado ao problema é o da indiferença. Hoje eu até evito falar sobre isso porque ninguém vai entender mesmo.

Tenho certeza de que como eu várias pessoas também se sentem "mais iguais" ao lerem sua coluna. Para mim os seus textos funcionam como uma terapia em grupo, leio suas estórias e me vejo em cada um delas. Claro, ultimamente tem-se noticiado com mais freqüência sobre pessoas com depressão, mas a depressão de celebridades não se parece muito com a minha. A estória da escritora deprimida e com fobia social que não conseguiu estar presente a entrega do Prêmio Nobel que havia ganhado está longe, muito longe da minha realidade. A vantagem de seus textos é falar da depressão de gente comum, talvez da escritora, não tão famosa, que não consegue terminar os próprios livros, de gente que não consegue comemorar os próprios aniversários, de gente que não consegue abrir a janela de casa, enfim, de gente que como eu tenta lidar com essa doença para ter uma vida "menos diferente."

Tive depressão, quarenta dias, em 1999. Até hoje tomo medicamento diário.

E tenho a sensação de que, a qualquer descuido, cairei em novos quarenta dias de volta ao inferno. Os médicos, pelo menos o meu, dizem que depressão tem cura. Não acredito, mas...

Seu artigo (...) é claro, preciso: o olhar dos outros é exatamente

como você descreve: pô, levanta daí, vamos pra vida...Como se a gente não quisesse exatamente isso. Mas, a bruxa não deixa. Parece uma doença invisível, que só os portadores conseguem enxergá-la. Daí, acho, a falta de sensibilidade dos outros...

Abaixo a depressão. Viva a vida, apesar de tudo!

Li seu texto "O estigma dos menos iguais". Identificação total, à primeira vista. (...)

Sou universitário, 27 anos, daqui a 2 anos me formo, e parto para o mercado, com um futuro...razoável, dizem por aí.

Num trecho do seu texto você cita o perfeccionismo, e como isso pode levar à ruína profissional, em determinados casos. E também fala da certeza que temos, nós deprimidos, de sermos alvos da atenção pública, quando não da condenação pública, por mais normalidade que mostremos no cotidiano.

Tudo verdadeiro!

Não quero conselho, do tipo "procure um médico", "faça psicoterapia", " você não precisa passar por isso"...

Só queria mesmo (...) saber se alguém que tem doença clínica e faz tratamento com medicamento consegue chegar a um "sucesso profissional" (...)

Casualmente me deparei com o artigo "O estigma dos menos iguais". A identificação foi imediata. Foi como se eu conseguisse traduzir todos os sentimentos em palavras. Era como se eu tivesse sido "descoberta". Relutei em procurar um psiquiatra justamente por todos esses estigmas, até por ser jornalista e, por isso mesmo, pretensamente esclarecida, racional. Quando o psiquiatra falou em depressão grave, tive o mesmo julgamento que as pessoas têm em relação aos deprimidos. Fala-se estou deprimido como sinônimo de estou pra baixo. E comigo era muito mais do que isso. Cheguei a pensar que eu era simplesmente melancólica, alguém que se acostumou a ser triste... E, além de todo o perfeccionismo depressivo, eu sou virginiana. Gostei de ler o artigo porque vi que não sou a única a ter todas aquelas sensações. É incrível, é exatamente o que sinto, são como sintomas da doença, como se diz que quem tem gripe pode ter febre e dores no corpo. Eu preferia realmente ter uma doença física do que uma doença mental. Toda minha vida está refém dessa doença.

Oi, tenho 21 anos, cheguei do cursinho pré-vestibular hoje
à tarde e entrei no site da folha pra ver umas notícias e como que por encanto vi as respostas às minhas dores que trouxe hoje da rua.
Não tenho como procurar um psiquiatra, porque não tenho grana, e não dá pra falar com a família, que também não poderia pagar, porque eles não concordarão comigo.
Eu realmente me identifiquei com inúmeras coisas, parecia que
falava de mim, e por essas coisas ainda não passei no meu sonhado vestibular de medicina.
Eu realmente fiquei com vontade de tomar remédio, o que várias pessoas da minha família fazem, tios e tias.

Você disse que não dá pra sair disso "por querer", não é uma bobeira, é uma doença. Sim, eu passei por diversos problemas durante a vida e estes deixaram em mim marcas dolorosas...
Obrigada.

Eu acho que é a arte de deixar o outro triste. Só um deprimido químico entende um deprimido químico. Uma coisa é você entrar em depressão e sair, outra é viver constantemente em depressão. A arte de ser triste está também na arte de ser feliz, todo feliz também é triste. Os dependentes de tranqüilizantes vivem constantemente em depressão, precisam de um dormidor e outro acordador. As drogas tarjas pretas são drogas pesadas, que levam o usuário à não vida. Conheço pessoas que tomam três frontais por dia e não conseguem dormir, elas queriam morrer, queriam dormir o tempo inteiro, mas não conseguem, são fracas até para morrer... são fracas até para serem tristes... e precisam de remédios para mascarar o sofrimento.

Somos semelhantes no pensar sobre a depressão.

Estou numa fase difícil e me deprimi profundamente semana passada. Tive que desmarcar minha agenda toda por que não conseguia levantar da cama, e o motivo que aleguei a minha secretaria para avisar e cancelar tudo foi que eu estava com uma forte gripe.

Tive medo de ser excluída por estar deprimida.

Falar com as pessoas? Eu tinha pânico, vergonha ao extremo, de falar sobre minha depressão. Quantas vezes desejei ter diabetes ou tireoidopatia, qualquer coisa "socialmente aceitável" que justificasse aqueles sintomas. Para piorar, tive fobia social. No final, não conseguia nem ir ao supermercado, pelo medo de encontrar alguém.

Felizmente, não deixei (um dia sequer) de ir trabalhar. Mas aí já era sublimação; uma outra história...

Olá, por indicação de um amigo li seus artigos sobre depressão e me surpreendi porque imaginava que essas coisas só aconteciam na minha cabeça!

Engraçado (quer dizer, engraçado não é...), mas quando a gente vê que mais pessoas passam pelos problemas da gente, que tem gente que sofre mais ainda, parece que a vida melhora um pouco.

Só um pouco...

luiz caversan

Luiz Caversan é jornalista e consultor na área de comunicação corporativa. Foi repórter especial, diretor da sucursal do Rio da Folha, editor dos cadernos 'Cotidiano', 'Ilustrada' e 'Dinheiro', entre outras funções. Escreve aos sábados.

 

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