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luli radfahrer

 

16/01/2012 - 07h00

Interpretação de sinais

O mundo conectado é cada vez mais emaranhado e complexo, subdividido em microcosmos que até conversam entre si, mas raramente são compreendidos por inteiro por faltar a eles um ponto comum de referência. Não há sistema de tradução que explique para quem tem Orkut, conta no Hotmail, busca com o Yahoo! e navega com o Internet Explorer o mundo do usuário de Dropbox, Flickr, Evernote e Kinect, por mais que ambos usem Facebook e vejam vídeos no YouTube.

Até há pouco tempo, formas, cores e símbolos do cotidiano eram poucos, dependiam de processos de produção e divulgação caros e elaborados e sua compreensão elementar não demandava muito trabalho. Presentes em tradições, crenças, círculos de poder e na indústria da mídia e propaganda, sinais e símbolos até há pouco tempo eram poucos e de fácil compreensão.

As diferenças entre os indivíduos, que já foram estabelecidas por procedência, família ou etiqueta, hoje são definidas por escolhas, cada vez mais sutis. Por mais que haja códigos --velados ou explícitos-- de conduta, vestimenta, educação, linguagem e relacionamento, não há mais modelos absolutos de comportamento ou opinião. As mídias sociais, ao facilitarem a expressão de todos, pulverizaram as mensagens e as personalidades, tornando a linguagem cada vez mais complexa, hermética e referenciada.

O roteiro de filmes como "Scott Pilgrim", séries como "Lost", histórias transmídia como o velho "Matrix" e boa parte dos novos games tem uma estrutura complicada demais para caber no velho formato retórico de começo-meio-fim. Até mesmo narrativas estruturadas, como "Toy Story", "Shrek" e "Harry Potter" libertam os personagens da camisa-de-força do "era uma vez" e "felizes para sempre", permitindo aos leitores que encenem seus personagens prediletos em RPGs e eventos de Cosplay intermináveis, cuja escolha e interpretação têm uma boa dose de interpretação e expressão pessoal.

A interpretação de um discurso, sob os mais diferentes aspectos, não está mais restrita ao Finnegans Wake, a poemas abstratos, balés e encenações experimentais ou à arte e literatura pós-moderna. Hoje que não há mais uniformidade, é cada vez mais importante interpretar o ambiente em que ocorre cada conversa e, principalmente, que sinais ele transmite, mesmo que involuntariamente. Quem não os compreender tende a ficar isolado ou a estar sujeito a mensagens que não entende, e ser rejeitado por um grupo apenas por ter compartilhado um link.

A Semiótica, estudo dos signos, está aos poucos deixando os círculos de debate acadêmico e se misturando ao cotidiano, servindo de intérprete entre grupos que, mesmo tendo origens semelhantes, habitam em realidades completamente diferentes. Com a evolução do ambiente digital e sua interferência na linguagem, não tardará para que essa área de pesquisa seja integrada ao ensino de línguas, fundamental para a compreensão de um mundo em que o peso não é mais medido em quilogramas, mas em gigabytes. Ou em megapixels.

luli radfahrer

Luli Radfahrer é professor-doutor de Comunicação Digital da ECA (Escola de Comunicações e Artes) da USP há 19 anos. Trabalha com internet desde 1994 e já foi diretor de algumas das maiores agências de publicidade do país. Hoje é consultor em inovação digital, com clientes no Brasil, EUA, Europa e Oriente Médio. Autor do livro 'Enciclopédia da Nuvem', em que analisa 550 ferramentas e serviços digitais para empresas. Mantém o blog www.luli.com.br, em que discute e analisa as principais tendências da tecnologia. Escreve a cada duas semanas.

 

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