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luli radfahrer

 

08/10/2012 - 03h35

Dose diária de desgraça

Em países ricos e supostamente civilizados há um grande temor da morte por ataque terrorista ou por desastre aéreo, mesmo que a probabilidade seja irrisória. Enquanto isso, o que realmente mata é muito mais próximo e mundano. Acidentes de automóvel, hipertensão, câncer, diabetes e doenças cardiovasculares podem ser diminuídos com um pouco de bom senso e a eliminação de maus hábitos. Mas isso dá trabalho, é mais confortável se alienar ou se acomodar e crer no improvável.

Nunca se viveu tanto nem se teve acesso à informação em tamanha profundidade. Desde o Iluminismo que se constatou não ser possível o progresso em ambientes sem acesso universal ao conhecimento. Sócrates, Kant e Newton são exceções em sociedades com grandes proporções de analfabetos e místicos.

O século 20 não seria o mesmo se Einstein tivesse nascido em Uganda. A internet, apesar de todos os seus defeitos, proporcionou um salto evolutivo sem comparação na história. Ainda há muito a progredir, mas existe cada vez menos ignorância. No entanto, o misticismo e a superstição esotérica, alimentados por uma paranoia infundada e por formas diversas de autoajuda, só crescem em todo o mundo.

É curioso perceber que, em meio a tantos avanços científicos, ainda façam sucesso lendas de alquimia, contos medievais e a imagem de uma vidinha pacata nas comunidades tradicionais. Um viajante no tempo saído de séculos passados acreditaria, corretamente, que teríamos perdido a razão ao reclamarmos tanto em uma época de liberdade, igualdade e fraternidade sem par. Como não comemorar quando a saúde, a educação e a democracia estão mais próximas do que nunca do universal?

Informação, já diziam, é poder. A ignorância não é uma bênção, e o conhecimento não é reversível. Mas qualquer aprendizado gera novas responsabilidades. Muitos consideram a carga de tantas decisões grande demais para que seja aceita sem a proteção de uma figura paterna, seja na forma de um rei, Deus, especialista ou professor.

O temor quanto ao desconhecido é um reflexo instintivo de um "homo" que se recusa a ser "sapiens". Reforçado pelo catastrofismo marqueteiro da mídia, pelo teor apocalíptico das religiões que perderam a transcendência e pela pregação fatalista das instituições falidas, uma espécie de miopia voluntária se desenvolve quanto às possibilidades que o futuro próximo pode trazer.

Há motivos de sobra para ser otimista, uma vez que a revolução tecnológica mal começou. Em garagens e galpões espalhados pelo mundo, inventores atrevidos trocam informações e compartilham tecnologias, criando novos debates e fomentando uma capacidade inventiva que seria inacessível a governos inteiros há pouco tempo.

Inspirados pelo exemplo de Bill Gates em seu combate à malária e de Craig Venter na sua busca pelo sequenciamento do genoma humano, muitos deixam de lado as forças do destino e começam a ver o futuro como um desafio, acessível, maleável e próximo. Recusam-se a aceitar qualquer fatalidade e interferem nele corajosamente.

O cenário é promissor. Isto é, se conseguirmos vencer, de uma vez por todas, as forças do ocultismo travestidas de mistérios da fé.

luli radfahrer

Luli Radfahrer é professor-doutor de Comunicação Digital da ECA (Escola de Comunicações e Artes) da USP há 19 anos. Trabalha com internet desde 1994 e já foi diretor de algumas das maiores agências de publicidade do país. Hoje é consultor em inovação digital, com clientes no Brasil, EUA, Europa e Oriente Médio. Autor do livro 'Enciclopédia da Nuvem', em que analisa 550 ferramentas e serviços digitais para empresas. Mantém o blog www.luli.com.br, em que discute e analisa as principais tendências da tecnologia. Escreve a cada duas semanas.

 

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