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luli radfahrer

 

26/10/2011 - 07h01

Pistola de eletrochoque

Sumô é um esporte de raciocínio e estratégia. Por mais que o tamanho paquidérmico de seus contendores sugira o contrário, é preciso levar em consideração uma enorme quantidade de variáveis nos microssegundos em que se examina o adversário antes de encontrá-lo. Não há folga para apalpar, tempo para vacilar ou espaço para se recuperar. Se o impacto não for preciso e rápido, a segunda chance é quase impossível. Desarmados e perigosos, os rikishi devem impressionar seus adversários ao mesmo tempo que não se deixam intimidar por eles, caso contrário estarão fora de combate. Quase nus e com os músculos à mostra, suas intenções não poderiam ser mais claras. Na aparente igualdade de condições, sua maior diferença costuma estar na forma com que pensam.

Os negócios digitais deveriam se comportar da mesma forma. A transparência, compatibilidade, interligação e fácil acesso a códigos-fonte com que foi construída a Internet deveria permitir a seus empreendedores uma competição aberta, em que cada novo golpe ou movimento fosse claramente visível e pudesse ser estudado detalhadamente. Até mesmo plataformas fechadas, como Apple e Sony, podem ser analisadas de fora para dentro, permitindo a criação de objetos e processos de logística similares. As réplicas chinesas deixam claro que isso não pode ser tão difícil.

No entanto, para surpresa geral, o que acontece é exatamente o contrário. Cada inovação de porte que surge parece atordoar a concorrência como uma pistola de eletrochoque, imobilizando-a temporariamente e desviando-a de seu foco. Seu efeito é o de uma arma que, apesar de não ser mortal nem causar ferimentos graves, paralisa e atordoa seus adversários, ganhando para quem a disparou o tempo necessário para se estabilizar e conquistar o espaço desejado.

Foi assim quando surgiram Amazon, Google, Firefox iPhone, Wii e tantos outros: novas ideias deram golpes atordoantes em produtos e serviços consolidados e suas empresas, preguiçosas, arrogantes ou paralisadas por uma infinitude de processos, reuniões e cargos hierárquicos de qualidade duvidosa, passaram meses (algumas até anos) desorientadas, perdendo assim a oportunidade de responder à altura enquanto ainda tinham alguma relevância. Quando finalmente se recuperaram, já era tarde demais.

Não foi assim, no entanto, quando o iPad surgiu como uma plataforma para a leitura de e-Books. Em menos de um mês surgiria um aplicativo para a leitura de livros em formato Kindle para diversas plataformas, além do equipamento original para que foi concebido. Por mais que o iPad seja utilizado para várias coisas e que a leitura seja apenas mais uma delas, praticamente não há competidores para o produto da Amazon dentro do hardware da Apple.

A história recente de empreendedorismo digital está repleta de iniciativas frustradas de gigantes tentando combater ou incorporar moleques atrevidos: o fracasso do Facebook em bater no FourSquare, do Google em superar o Flickr e da Apple em atropelar o Dropbox são só mais alguns exemplos de que a rede continua aberta a novas ideias, por mais que muitos pessimistas insistam em afirmar que ela tenha se tornado briga de cachorro grande.

O que parece acontecer é exatamente o contrário: há cada vez menos tempo para reuniões, comissões, brainstorms e grupos de estudos. A ação precisa ser rápida, transparente, maleável e integrada, prevendo novos ataques à medida que a estratégia avança. Como um bom combate de Sumô, o tamanho continua a ser importante. Mas ele não é páreo para a sabedoria aliada a uma rápida tomada de decisões.

luli radfahrer

Luli Radfahrer é professor-doutor de Comunicação Digital da ECA (Escola de Comunicações e Artes) da USP há 19 anos. Trabalha com internet desde 1994 e já foi diretor de algumas das maiores agências de publicidade do país. Hoje é consultor em inovação digital, com clientes no Brasil, EUA, Europa e Oriente Médio. Autor do livro 'Enciclopédia da Nuvem', em que analisa 550 ferramentas e serviços digitais para empresas. Mantém o blog www.luli.com.br, em que discute e analisa as principais tendências da tecnologia. Escreve a cada duas semanas.

 

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