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marcelo miterhof

 

11/10/2012 - 03h00

Crescer é se desenvolver

Desde meus tempos de ginásio, nos anos 80, ouço que no século 20 o Brasil cresceu, mas não se desenvolveu. Essa percepção se deve à constatação de que o país (ou parte dele) se industrializou, mas não eliminou a pobreza aguda, e se urbanizou, porém isso foi acompanhado de favelização. A conclusão foi que crescer não resolve!

Minha opinião, porém, é que isso se configurou numa confusão semântica, que, como pontuou certa vez meu colega economista Gustavo Galvão, distingue desenvolvimento de crescimento e cria um viés prejudicial ao entendimento de algumas das motivações envolvidas no debate econômico e político.

O desenvolvimento de fato tem mais dimensões do que o crescimento econômico. Além da renda per capita, outros indicadores ilustram o nível de desenvolvimento de um país: alfabetização, expectativa de vida, entre outros índices ligados à educação e à saúde, além daqueles relacionados à provisão de infraestrutura e a aspectos culturais, como respeito às leis de trânsito e a outras normas civilizatórias.

Ainda assim, há um indubitável alinhamento entre esses indicadores e o nível de renda per capita: são desenvolvidos todos os países de renda alta e nenhum país de renda baixa o é. Mais importante para o debate político, o sentido da causalidade vai muito mais do econômico para o social do que o contrário.

Uma população saudável e educada e eficiência em transportes e energia tornam uma economia mais competitiva, favorecendo sua inserção global e, assim, o nível de renda de um país.
Mas, para investir em saúde, educação e infraestrutura é preciso ter recursos, o que depende de crescimento.

É o crescimento que puxa o fio dessa meada. Crescer desequilibradamente -com mão de obra pouco qualificada, produtividade baixa, inflação acima da média mundial, entre outras mazelas- é o que permite superar aquilo que costuma ser chamado no debate econômico de "restrições ao crescimento".

Crescer é uma vocação para um país populoso e com tantas pessoas a incluir no padrão de consumo moderno -isto é, com demanda e perspectiva de lucro para os empreendedores-, especialmente quando há folgadas reservas cambiais.

Como definiu o economista alemão Albert Hirschman, desenvolver-se é o mesmo que crescer acima da média dos países ricos, aproximando-se da renda deles.

Nesse sentido, o Brasil se desenvolveu muito no século 20. O problema que assolou o país por duas décadas e meia a partir de 1980 foi ter parado de crescer. Isso impediu que investimentos e gastos correntes em educação, saúde, infraestrutura fossem elevados para melhorar a qualidade de vida da população. A continuidade do crescimento também teria tornado o trabalho mais escasso relativamente ao capital e, assim, melhorado a distribuição de renda.

Tivesse a renda per capita (em dólar, convertido a valores de 2005 por paridade do poder de compra, conforme texto de Roberto de Albuquerque, "Um balanço social do Brasil 1980-2005", apresentado no Fórum Nacional em 2007) crescido a uma média de 3,3% nos 25 anos de construção interrompida -2,8 pontos percentuais acima do ocorrido e igual à média dos anos 60, a menor desde a década de 40 até a de 70-, o país teria o dobro da renda atual e seria desenvolvido.

Uma história familiar ilustra o que foi a interrupção do crescimento. Minha avó costuma dizer que antigamente os serviços públicos funcionavam. Prova disso é que minha mãe nasceu em um bom hospital público e estudou em uma igualmente boa escola pública. Esses serviços realmente não eram pagos.

Ainda assim, não eram exatamente públicos. Minha mãe nasceu num hospital que atendia a uma categoria profissional, a dos bancários, e estudou no Pedro 2º, uma escola pública carioca altamente restrita, por ser federal.

Nos anos 50, a ideia de universalização dos serviços públicos era incipiente. A redemocratização mudou isso, o que é um tremendo ganho civilizatório, mas de início a mudança política não veio acompanhada de prosperidade econômica. A busca pela universalização, sem os recursos necessários para bancar tal expansão, acabou deteriorando os serviços existentes.

Não é à toa que a retomada do crescimento vigoroso da renda per capita a partir de 2004 (em média de cerca de 3% ao ano) tem feito o país melhorar.

O Brasil precisa seguir melhorando seus serviços públicos. Para tanto, a vigília dos cidadãos é saudável. Afinal, já somos um país de renda média. Porém, mais importante ainda, é não abrir mão da "obsessão pelo crescimento".

marcelo miterhof

Marcelo Miterhof é economista do BNDES. O artigo não reflete necessariamente a opinião do banco.

 

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