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marcelo miterhof

 

15/11/2012 - 03h00

Torcendo por Obama

A eleição de Barack Obama em 2008 me deixou quase tão preocupado quanto feliz. Como o primeiro presidente negro dos EUA, ele tinha a obrigação de cumprir dois mandatos. Mas, dado o feito histórico, havia grande expectativa e idealização em torno de seu governo, o que foi reforçado pela propaganda de mudança que o levou ao poder.

Isso tornaria sua segunda campanha previsivelmente mais complicada. Por isso, sua reeleição na semana passada foi um alívio.

Também era de esperar que crescesse o extremismo de direita. Mesmo se comportando como político de centro, ele foi tachado de comunista. Isso porque criou programa de subsídios para famílias de renda mais baixa, podendo, assim, tornar obrigatória a contratação por todos de um serviço de saúde privado!

Parte dos americanos acredita que os cidadãos devem ser livres tanto para buscar se enriquecer quanto para arcar com as consequências de seus insucessos. Assistência por parte da sociedade só em caso de miséria absoluta, o que implica, por exemplo, que antes disso alguém deva vender sua única casa para pagar um tratamento médico custoso. Afinal, ganhar o suficiente para poder pagar um plano de saúde adequado é dever de cada um.

No Brasil, em geral não se chega a tanto. Mas em qualquer lugar trazer a mudança não costuma ser fácil. Foi feroz a reação elitista a um acontecimento semelhante, a eleição pela primeira vez de um operário a presidente.

De certa forma, isso o levou a também fazer um primeiro mandato conservador na economia. Reeleito, permitiu-se mais ousadia, o que fez o desempenho econômico melhorar. Hoje, uma presidenta estudada e de origem na classe média tem avançado numa agenda mais radical, sem deixar de contar com o encantamento da elite outrora temerosa.

Para se eleger pela primeira vez, Obama teve a ajuda dos desastrosos anos Bush, que, entre outras coisas, colocaram sob ameaça importantes indústrias e o sistema financeiro americanos. Obama venceu de novo porque em seu governo um pacote de gastos fiscais, ainda que tímido, e a política monetária expansionista salvaram os EUA da maior crise econômica desde 1929.

Isso foi decisivo para os democratas vencerem nos Estados cambiantes (os que historicamente mudam mais sua opção partidária), em especial depois que Romney insistiu em dizer que o presidente teria levado a indústria automobilística americana à falência, uma sandice difícil de engolir em lugares como Ohio, que concentram boa parte da indústria do país. Com isso, a vitória no Colégio Eleitoral foi bem mais folgada do que no voto popular.

Livre da obrigação de se reeleger, Obama tem a chance de cumprir sua promessa de mudança. Entretanto, com a Câmara dominada pela oposição e sob a ameaça do "abismo fiscal", torcer por ele continuará sendo angustiante. Por isso, se tivesse a chance, eu me arriscaria a lhe dar um conselho.

Não se deixe aprisionar pelo discurso convencional. Dialogar e ouvir sinceramente o outro estão entre as suas principais qualidades políticas, que o fizeram ser presidente. Mas também é preciso refundar a tradição mais progressista de seu partido. Isso vale para os direitos civis, como o casamento gay, e para uma ação econômica mais ampla, solidária e efetiva.

Politicamente, as mulheres, os negros, os latinos e as elites liberais lhe deram votações maciças, apontando para o desejo de grande parte da sociedade de completar o Estado de bem-estar social. Na economia, o gasto público é a melhor receita para enfrentar a crise financeira.

Uma alavanca é o investimento em infraestrutura, que impulsiona a demanda para ajudar a sair da crise e tem efeito duradouro para a competitividade de um país.

Essa é também uma grande chance para reforçar o legado de Franklin Roosevelt. Os EUA precisam ter um sistema de saúde público e universal. Isso não é nada de mais, mas só parte dos serviços públicos básicos que visam a garantir igualdade de oportunidade. O diálogo não pode justificar fazer concessões a um dogmatismo derrotado nas urnas.

Ajuste fiscal e desregulamentação financeira tiveram seu tempo, sua hegemonia e suas chances. No futuro, terão outras. Agora, é hora da mudança e o modelo econômico é parte central dela. É preciso coragem e confiança.

MARCELO MITERHOF, 38, é economista
do BNDES. O artigo não reflete
necessariamente a opinião do banco.
marcelo.miterhof@gmail.com

marcelo miterhof

Marcelo Miterhof é economista do BNDES. O artigo não reflete necessariamente a opinião do banco.

 

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