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luiz rivoiro

 

11/07/2010 - 00h09

Didi & Eu

Final de semana passado, fomos todos, a Mãe, os garotos e eu, passar uns dias na montanha. O lugar escolhido já era conhecido, uma agradável pousada em São Bento do Sapucaí caprichosamente instalada no topo de uma montanha com vista privilegiada para a Pedra do Baú e arredores da serra da Mantiqueira. Estivemos lá na mesma época em 2009 e desde então as crianças pediam para voltar. Admito que não precisaram insistir muito. Na noitinha de quinta-feira, lá estávamos estacionando o carro, descarregando as malas e, logo a seguir, nos preparando para o jantar. E foi aí que aconteceu.

Na porta do restaurante, três folhas de papel afixadas detalhavam os horários das gravações do dia seguinte. Sim, logo fiquei sabendo, havia uma equipe de filmagem da Globo no local e eles iriam passar o final de semana inteiro hospedados ali e rodando na região. Ok, sem problemas, vamos ver "quem" de fato está aqui, pensei, já imaginando a lista de ilustres desconhecidos de Malhação que viria a seguir. Mas eis que me deparo com um nome bem no meio da listagem. Ali estava um dos meus ídolos de infância. Ninguém menos do que o Didi. Que Didi? O Mocó, claro!

Imediatamente chamei os meninos: "Olhem só! O Didi está hospedado aqui!". Ele me olharam incrédulos, parecendo dizer: "Mas o que é que essa cara tá falando? Vê se pode o Didi estar aqui!". Mas estava. Logo que entramos, numa mesa redonda à esquerda, lá estava ele. Fingi, como manda a educação, naturalidade. Rodamos pelo restaurante em busca de uma mesa, até que, pouco antes de sair, já subindo a escada, não aguentei. "Ei, meninos! Olhem só o Didi aqui!" E, como uma adolescente que de repente se vê diante dos seus ídolos da banda Restart, fiz algo que nunca, jamais, mesmo, havia feito na vida: apontei para um sorridente Renato Aragão, que, gentilmente, retribuiu esse gesto desastrado como um cordial e sorridente "Boa noite, crianças". Os garotos acenaram, eu acenei, e logo estávamos do lado de fora diante de uma Mãe desavisada e atônita com a minha excitação: "Acabamos de ver o Didi aqui! Ele está hospedado aqui! Ele acenou para os meninos!" Fui falando enquanto os garotos apenas me olhavam, até que o João disse. "Legal, pai. O Didi está aqui, bacana mesmo". Isso. Exatamente isso: bacana mesmo.

Explico. Sempre fui fã dos Trapalhões, desde quando, há muito, muito tempo. E tinha até tido três oportunidades de vê-los ao vivo. A primeira, quando eles montaram, ainda com a participação especial e piruetas de Ted Boy Marino, um ringue de telecatch bem na frente da Eletroradiobraz da avenida Independência em Ribeirão Preto (quem for de lá, sabe do que estou falando). Depois, num jogo de futebol de salão no ginásio da Cava do Bosque com todos os craques trapalhões presentes e, por fim, numa sessão especial de cinema no antigo Cine Plaza, quando foi exibido Os Trapalhões nas Minas do Rei Salomão. Sem lugar disponível, lembro de ter-me sentado no chão e vibrado quando, ao final do filme, Didi, Dedé, Mussum e Zacarias passaram correndo a poucos centímetros de mim ovacionados pela platéia em delírio. Pois é, e foi só.

Claro que continuei acompanhando o programa na TV e esperando a estreia de cada filme como se fosse o mais espetacular blockbuster de Hollywood, mas nunca mais tinha voltado a ver nenhum deles novamente. Foram-se então Zacarias e Mussum, Didi e Dedé se desentenderam, e cresci ao mesmo tempo que vi a graça ir desaparecendo. Até que desencanei por completo e simplesmente deixei de assistir aquele que havia sido o meu programa de TV favorito por tanto tempo. No lugar das "cambotas" e tortas na cara dos Trapalhões, vi surgir o humor mais ácido, cruel e anárquico da TV Pirata, talvez mais afinado com os tempos de abertura política ou com a minha maturidade, mas que, no fundo, devia, e muito, a sua "revolução" ao escracho e às piadas politicamente incorretíssimas dos quatro trapalhões.

O lançamento em DVD de todos os filmes e a caixa com alguns dos melhores momentos do programa de TV não apenas reacendeu minha admiração pelos humoristas trapalhões como ajudou a conquistar novos e pequenos fãs lá em casa. Mais uma vez, muita gente vai dizer que o humor deles era "pesado" demais, que tinha piadas e paródias envolvendo negros, bebuns e gays, além de referências a termos, digamos, inadequados para menores. Mas será que era mesmo tão pesado assim? Não creio. E os versos cantados pelo seu Faceta (Didi) para sua filha (Zacarias) num programa de calouros ("Marlon Brando mantegou Maria Schnaida e vai mantegá ocê tamém!") seriam obscenos? Talvez, mas só para quem os compreendia, o que definitivamente não era o caso dos telespectadores mirins. A coisa toda era tão caricata, tão absurda, que não chegava a ser levada a sério. Não podia, de forma alguma. Os meninos lá em casa adoram essa anarquia toda. Um prefere o Mussum, o outro o Zacarias, e todos adoram o Renato Aragão (ok, também tinha o Dedé, mas carisma nunca foi o seu forte, uma vez que sua função no grupo era o de "escada" para os demais).

Durante os quatro dias que ficamos na pousada, cruzávamos com ele no jantar, sempre na mesma mesa, e no café da manhã. E foram necessários três dias até que eu tomasse coragem e finalmente me achegasse. "Por favor, Renato, você poderia tirar uma foto com os meninos?" Simpático, ele não hesitou. "Mas claro!" E lá foram eles se enroscar eu seus braços. Bati a foto, mas não sei, algo devia estar estampado na minha cara. "Vai lá você também! Pode deixar que eu tiro a foto", me encorajou a mulher de Renato. Não pensei duas vezes. Me acomodei ao seu lado, abraçando-o. Clic. E fiquei feliz como uma criança.

Luiz Rivoiro

Luiz Rivoiro, 42 anos, é pai de João, 8, e de Pedro, 4. Jornalista, trabalhou na "Folha de S.Paulo" por 14 anos. É editor da revista "Playboy" e autor do livro "Pai É Pai - Diário de um Aprendiz". Escreve quinzenalmente para a Folha.com.

 

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