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luiz rivoiro

 

25/07/2010 - 00h03

O retorno da Fada dos Dentes

Esta semana levamos o João ao dentista. Era para ser uma consulta de rotina, agendada há alguns dias, mas acabou de tornando especial. Explico: faz um certo tempo que o menino anda com um dos dentes da frente bastante mole, mas, ainda assim teimava em não arrancá-lo. E olha que a gente, a Mãe e eu, dizíamos o tempo todo pra ele movimentar o dito cujo esperando que num desses vai e vem algo definitivo acabasse o correndo. Mas não rolou. Aí entrou em cena o dentista.

Mais ou menos, ele sabia que isso poderia ocorrer, por isso acordou meio jururu, fazendo manha e coisa e tal. A Mãe, que havíamos combinado que o levaria à consulta, entrou então no quarto preocupada: "E se ele arrancar o dente e depois voltar chorando no carro o trajeto todo até em casa? Não tem jeito, você vai comigo". E fui. E como eu iria, o Pedro também resolveu nos acompanhar. Diferentemente do João, ele adora ir ao dentista. Talvez porque sempre acaba saindo de lá com um brinquedinho. Não o recrimino. Afinal, quem aí gosta de ouvir aquele barulho infernal e traumático do motorzinho? Eu não.

Bem, o fato é que fomos todos. Lá chegando, tivemos de aguardar um pouco, não muito, mas tempo suficiente para o Pedro desmontar e montar um boneco do Sr. Cabeça de Batata. Logo o João foi chamado e lá se foram ele e a Mãe. E o Pedro, de bico. Fiquei aguardando na sala de espera, que pouco a pouco ia recebendo mais gente, pais e crianças. Tudo corria muito bem, até que um grito abafado atravessou a porta do consultório. Era o João. Congelei e olhei ao redor. Foi como se o tempo tivesse sido suspenso. O único som era o de Tico & Teco matraqueando na TV. Com olhos assustados, as crianças olhavam vidradas em direção à porta fechada. "Que torturas inimagináveis estariam ocorrendo por detrás daquela porta?", pareciam pensar. Impossível não lembrar da cena de Procurando Nemo, quando um garotinho do lado de fora do consultório observa pelo vidro a pequena Darla, o tio, Nemo e o albatroz Niles promovendo uma cena aterrorizante, com direito a motorzinho descontrolado, gritos e revoadas.

"Oh não, um alicate! Por favor, não!", suplicou João para a dentista que se aproximava de forma ameaçadora, contou-me a Mãe. Mas não teve jeito. Em segundos, ele pegou o tal dente mole e com um puxãozinho e resolveu a questão. Não teve choro, nem desmaio. Minutos depois, ele deixava a sala orgulhoso da sua nova "janela". Numa mão, um saquinho com o dente extraído, na outra, o brinquedinho que escolhera como prêmio: um infame "saco de pum". Argh! Em seguida, surgiu o Pedro choramingando que não tinha ganhado nada. "Mas Pedro, hoje a consulta foi do João. A sua é no mês que vem. Aí sim, você terá direito a escolher alguma coisa". Não funcionou muito, mas como logo fomos embora, ele esqueceu. Melhor assim: ninguém merece ter dois "sacos de pum" em casa!

Ao chegar em casa, a preocupação do João era uma só: "Será que a Fada dos Dentes vai me recompensar?" Bem, claro que sim, eu disse. Na hora de dormir, ele cuidadosamente colocou o dentinho sob o travesseiro. Durante a madrugada, me levantei e caminhei até o quarto dos garotos. Com cuidado, levantei o travesseiro e depositei cinco moedas de um real cada. No dia seguinte, enquanto eu tomava café, lá veio o menino, todo contente: "Papai, olha só, a Fada me deixou quatro reais em moedas!" Caramba, como assim?, pensei, quase estragando tudo dizendo que ele devia procurar mais porque eu tinha deixado cinco e não quatro moedas! Mas me segurei a tempo, engolindo a dúvida. "Que bom!" E lá se foi ele brincar pela sala com a sua janelinha enquanto eu continuava a matutar: "Mas onde é que foi parar essa moeda?" Só a Fada poderá me dizer.

Luiz Rivoiro

Luiz Rivoiro, 42 anos, é pai de João, 8, e de Pedro, 4. Jornalista, trabalhou na "Folha de S.Paulo" por 14 anos. É editor da revista "Playboy" e autor do livro "Pai É Pai - Diário de um Aprendiz". Escreve quinzenalmente para a Folha.com.

 

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