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luiz rivoiro

 

19/09/2010 - 00h01

O clube do filme

Não faz muito tempo, li um livro, O Clube do Filme (Ed. Intrínseca), que contava uma experiência no mínimo curiosa: preocupado com o baixo rendimento e o desinteresse do filho pela escola, o jornalista David Gilmour (nada a ver com o guitarrista do Pink Floyd) decidiu ele mesmo assumir a educação do filho por meio de sessões de cinema caseiras. As única condição que ele impunha era que o rapaz aceitasse de forma incontinente o filme escolhido por ele, o pai. Bem, claro que estamos falando de uma experiência radical, realizada no Canadá, com um adolescente de 16 para 17 anos, impossível de ser levada a cabo por aqui com crianças pequenas. Mas ficou a idéia, muito boa e que, de forma quase involuntária e ainda incipiente, acabamos por colocar em prática lá em casa.

Na verdade, tudo começou por iniciativa dos meninos. Sempre vasculhando as estantes e prateleiras, o João encontrou um box com nove DVDs reunindo os 39 episódios das três temporadas das adaptações das Aventuras de Tintin, do belga Hergè, feitas para a TV. Já havíamos visto um ou outro episódio logo que comprei a caixa há uns dois anos, mas depois ela ficou lá, devidamente emparelhada com dúzias de outros filmes, desenhos, documentários e shows de rock. Mas eis então que o João aparece na sala e propõe: "Que tal se a gente fizer uma sessão de cinema com o Tintin?" Empolgado, o Pedro logo topou. Até estranhei, uma vez que ele sempre discorda do irmão mais velho quando o assunto é a programação da TV. Mas foi a Mãe que deu o tom: "Excelente! A gente pode sentar todo mundo junto no sofá e apagar as luzes, como num cinema de verdade!" E assim foi feito. Adorei.

O que era apenas para ser uma sessão acabou por se converter numa prática diária, praticamente sagrada só quebrada por nós, pais, que por vezes acabamos nos envolver em compromissos sociais ainda vetados para menores, como jantares, filmes para adultos e shows de música. E não pensem que eles aceitam nossos "furos" de forma tranquila. Há sempre protestos e necessidade de promessas de que no dia seguinte a sessão perdida será compensada. Espectadores fiéis, esses garotos.

Ainda que as peripécias do repórter Tintin em companhia de seu fiel cãozinho Milu e do explosivo Capitão Haddock por vezes envolvam temas um tanto quanto complexos para crianças pequenas, como tráfico, contrabando, roubos e sequestros, não é isso que fica gravado ao final de cada aventura. Óbvio que eles compreendem quem é quem nas histórias, separando claramente os "bons" dos "maus", mas divertem-se mesmo com as trapalhadas do Professor Girassol, os constantes tropeções dos policiais Dupont e Dupond e, claro, a saraivada de impropérios despejada pelo colérico Haddock. Não raro, o Pedro ou João soltam aqui e ali os típicos "Marinheiros de água doce!", "Com um milhão de caranguejos!", "Filisteus!", ainda que não tenham a menor ideia do que isso signifique!

Bem, mas o fato é que agora, quando acabamos de ver a última temporada, veio-me a ideia de continuar com o nosso Clube do Filme. Se não todos os dias, pelos menos um dia ou dois por semana. Pensei em seguir o modelo de Gilmour, combinando com eles que eu escolheria um filme surpresa e eles se comprometeriam a assisti-lo até o final. Terça é excelente, sobretudo porque neste dia a locadora perto de casa faz "promoção", alugando qualquer filme por 4 reais! Seria uma chance de apresentar algumas obras interessantes, não necessariamente desenhos animados, mas mais antigas. Filmes de Charlie Chaplin, por exemplo, ou, mais anárquicos, de Mel Brooks, Trinity ou até Monty Phyton. E, claro, Trapalhões! Vou começar semana que vem. Depois eu conto como foi.

Em tempo: Apesar de defender a ideia do Clube do Filme caseiro, continuo achando que nada substitui a experiência de ir ao cinema. E não precisa ser filme 3D não. Para quem está um pouco de saco cheio dessa tecnologia que impregnou os filmes infantis (e atazana a vida dos pequeninos, como é o caso do Pedro que não suporta ficar com o óculos por mais de 15 minutos), a dica é ver o japonês Ponyo, uma Amizade que Veio do Mar, de Hayao Miyazaki. Mestre da animação tradicional, já havia mostrado seu talento com O Castelo Animado e A Viagem de Chihiro, animações de imenso impacto visual e tramas intrincadas que costuram elementos da cultura e do folclore japonês. Menos complexo, Ponyo é um verdadeiro banquete para os olhos. Feito sob medida para ser degustado em tela grande.

Luiz Rivoiro

Luiz Rivoiro, 42 anos, é pai de João, 8, e de Pedro, 4. Jornalista, trabalhou na "Folha de S.Paulo" por 14 anos. É editor da revista "Playboy" e autor do livro "Pai É Pai - Diário de um Aprendiz". Escreve quinzenalmente para a Folha.com.

 

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