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sérgio malbergier

 

15/11/2007 - 00h02

O bem que Chávez faz ao Brasil

O cala-boca real de Juan Carlos de Espanha no petrocaudilho venezuelano, Hugo Chávez, foi bom para o Brasil. Quanto mais radical for Chávez, maior a importância do Brasil lulista como defensor regional da democracia, da moderação e do respeito às regras do mercado.

Não que Chávez tenha só perdido com sua impertinência diante dos mandatários da ex-metrópole. Se as classes médias hispânicas regozijam-se transformando o "por qué no te callas?" do rei Bourbon em hit no YouTube e nos ringtones, a base chavista vibra com a coragem do caudilho mestiço, emulando seu herói Simón Bolívar, o "Libertador das Américas", ao desafiar el rey de España em plena reunião de cúpula ibero-americana.

Voltando ao Brasil, Chávez nos ajuda por comparação. Lula perto de Chávez parece uma mistura de Thomas Jefferson com Adam Smith, quando está muito mais para Getúlio Vargas e Maílson da Nóbrega. Nosso capitalismo precário parece a bolsa de mercadorias de Chicago perto do estatismo chavista.

Muito importante: o Brasil aparece ainda como o único interlocutor com alguma credibilidade com o petrocaudilho. Desde o aparente apoio americano ao golpe de Estado fracassado contra Chávez, em 2002, Washington vê no Brasil o canal que restou para influir num de seus grandes fornecedores de petróleo. Ponto para Lula, que, para manter esse canal aberto, não perdeu a chance de afagar Chávez em pleno tiroteio, chamando-o de grande democrata.

Já os tais mercados aprenderam a diferenciar os países da região. Até o que acontece (de ruim) na Argentina, por exemplo, já não abala a imagem brasileira, quanto mais em Caracas. E uma Venezuela nadando em petróleo neste momento de escassez energética seria um imã para investimentos diretos, mas eles acabam ficando deste lado da floresta amazônica.

A Bolsa de Valores de Caracas, em pleno boom acionário global, tem desempenho pífio, enquanto a Bovespa navega por alturas nunca dantes. E se o capital internacional tem algum pudor de entrar na Venezuela de Chávez, pode comer um pouco de sua exuberância irracional comprando ações de empresas brasileiras beneficiadas com negócios lucrativos no vizinho andino.

Nosso saldo comercial com a República chavista já passa de US$ 3,3 bilhões neste ano, com exportações de US$ 3,8 bilhões até outubro, um crescimento de 29,5% em comparação com o mesmo período do ano passado. Melhor ainda: o grosso do exportado é de produtos industrializados (84%), como celulares e carros.

Certamente estaríamos melhor se o governo da Venezuela fosse mais democrático e menos divisivo. A instabilidade no país pode explodir gerando choques secundários nos vizinhos. Um caudilho está sempre disposto a radicalizar para justificar-se no poder. São preocupantes as compras de armas da Venezuela, que abastecem tanto as Forças Armadas quanto, talvez mais perigosamente, as milícias chavistas. Nossas fronteiras e Forças Armadas, fracas como são, são um convite a todo tipo de atividade.

Diante desse vizinho em erupção, a melhor política do Brasil é a contenção, tentando ainda tirar uma lasca da prosperidade petroleira venezuelana. O governo Lula parece ter calibrado bem essa posição.

Quanto mais mandarem Chávez calar a boca, mais gostarão de ouvir a voz de Lula.

sérgio malbergier

Sérgio Malbergier é consultor de comunicação. Foi editor dos cadernos 'Dinheiro' (2004-2010) e 'Mundo' (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, 'A Árvore' (1986) e 'Carô no Inferno' (1987). Escreve às quintas.

 

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