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suzana singer
Lusco-fusco
Em pronunciamento em rede de rádio e televisão, na quarta-feira passada, a presidente Dilma criticou aqueles que, ªpor precipitação, desinformação ou algum outro motivoº, previram racionamento de energia e duvidaram que o governo conseguiria reduzir a conta de luz.
A carapuça serviria na Folha? De certa forma, sim.
Nos últimos cinco meses, o jornal exagerou o risco de racionamento e destacou pouco as vantagens econômicas advindas da queda do preço da energia.
A Folha começou essa cobertura com um gol: informou, com exclusividade, que Dilma anunciaria, na véspera do feriado de 7 de Setembro, uma diminuição na conta de luz de casas e indústrias.
Seguiram-se várias reportagens que questionavam os custos desse corte e, depois, uma série de notícias sobre a situação preocupante dos reservatórios por causa da escassez de chuvas.
Até aí, tudo bem, é papel da imprensa revelar problemas que o governo prefere manter longe dos olhos do público. Não se trata de ªfalta de féº no país, como disse Dilma, num apelo nada democrático ao nacionalismo.
O problema é que o noticiário embarcou numa toada cética e crítica. Basta ver os títulos:
-"Conta de luz para residências pode cair só 10% em vez de 16,2%"
- "Para compensar luz barata, imposto nos Estados pode subir"
- "Com tarifa menor, elétrica deve distribuir menos lucro"
- "Luz mais barata `corrói' verbas sociais"
- "`Apaguinhos' crescem e corte de luz bate recorde em 2012"
- "Para analista, chuvas não vão encher reservatórios"
Há 20 dias, a manchete do jornal anunciava que "Escassez de luz faz Dilma convocar o setor elétrico". O título interno era ainda mais alarmista: "Racionamento de luz acende sinal amarelo".
Tratava-se de um exagero, baseado, em parte, em uma informação errada obtida em "off": a tal reunião de emergência, que a presidente teria convocado durante as férias, estava agendada desde dezembro. O jornal publicou só uma correção.
Na terça-feira passada, o alarme tocou novamente, desta vez por causa de 2014: "Para Aneel, há risco de faltar luz na Copa", dizia a capa de "Mercado". A reportagem usou um relatório que aponta problemas graves no cronograma das obras que garantirão energia para as cidades-sede do Mundial. Só que o jornal não mencionou que, entre as conclusões, havia a ressalva de que "a maioria desses atrasos não oferece risco iminente ao abastecimento de energia para a Copa de 2014".
A Redação não acha que errou, já que o relatório deixa claro que, se não houver "aceleração urgente" no ritmo de implantação das obras, haverá risco de falta de luz.
Esse último exemplo ilustra bem o problema geral dessa cobertura: tirando o governo, ninguém duvida que o sistema energético brasileiro trabalha no seu limite e que as obras para ampliá-lo estão atrasadas. É preciso apontar isso, mas sem exagerar a dose. Entre o mundo róseo descrito por Dilma na televisão e o pré-caos pintado pela Folha, deve estar a realidade.
Suzana Singer é a ombudsman da Folha desde 24 de abril de 2010. No jornal desde 1987, foi Secretária de Redação na área de edição, diretora de Revistas e editora de 'Cotidiano'. Escreve aos domingos na versão impressa. E-mail: ombudsman@uol.com.br
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