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valdo cruz

 

15/04/2008 - 00h02

Sinais trocados, perigo à vista

No final do ano passado, ao decidir derrotar o governo Lula na prorrogação da CPMF, o imposto do cheque, a oposição levantou duas ótimas bandeiras: contra a alta carga tributária e pela redução dos gastos públicos. Foi vitoriosa na primeira e chegou a prometer ao governo apoio para aprovar projetos que colocariam uma trava no crescimento das despesas públicas. Bem, agora, às vésperas de uma nova reunião do Copom, quando os juros tendem a subir segundo as previsões generalizadas, o que faz a mesma oposição: decide votar a favor de três projetos que aumentam os gastos públicos sem que se saiba de onde virão os recursos para bancá-los. Um belo contra-senso.

Antes de prosseguir, é justo destacar que os projetos são de autoria de parlamentares governistas e foram aprovados no Senado com os votos da base aliada. São eles: 1) Estende a todos beneficiários da Previdência o aumento do salário mínimo, elevando o déficit do setor; 2) Acaba com o fator previdenciário, aquele mecanismo que estimula o segurado a adiar a aposentadoria e 3) Aumenta os repasses obrigatórios para a área da saúde, vinculando 10% da receita bruta ao setor --a chamada emenda 29.

Ou seja, governistas e oposicionistas embarcaram na mesma canoa da farra dos gastos públicos, num momento em que o país enfrenta uma crise financeira internacional, a inflação está em alta e o Banco Central caminha para subir os juros. Da parte de alguns governistas isso não é nenhuma surpresa. Muita gente no PT ainda não se conforma com esse tal de superávit primário, de fazer economia para pagar juros da dívida pública. Agora, da oposição, que já governou o país, e que sempre fez o discurso da austeridade, era de se esperar um pouco mais de sensatez.

Tudo bem, sei qual é o discurso de alguns líderes da oposição: "Estamos apenas tentando mostrar como os governistas são descomprometidos com a questão fiscal e forçando o presidente Lula, em última instância, a vetar esses projetos". Ou seja, tudo faz parte da guerra política, de constranger o presidente a brecar iniciativas que têm forte apelo popular, ou melhor, populista. Diria que, no mundo da nossa política, esse tipo de estratégia faz parte do jogo. Agora, me pergunto, não seria melhor manter erguida a boa bandeira levantada no ano passado? Forçar exatamente o contrário, procurando expor as deficiências do governo na área fiscal? Aposto que esse é o pensamento dos economistas de tucanos e democratas.

No governo Lula, o discurso da "perna manca fiscal", que estaria deixando o Banco Central sozinho na tarefa de evitar o aumento da inflação, não é bem aceito. O argumento é que a meta de superávit primário, de 3,8% do PIB, será cumprida. Não será nem mais nem menos. E que o aumento de gastos nesse início de ano não poderá seguir nesse ritmo. Terá de ser ajustado ao longo do ano, exatamente para fazer a economia prometida para pagamento de juros da dívida.

Só que o momento exigiria pelo menos uma sinalização de comprometimento com gastos menores no futuro. E isso, tudo indica, saiu da agenda do Palácio do Planalto. Ninguém mostra disposição de falar com o presidente Lula de reforma da Previdência, de redução de gastos com pessoal e por aí vai. Ninguém toca mais naquele projeto, enviado pelo próprio governo, que criava um limite para o aumento nas despesas com a folha de pagamento da União. O texto está parado no Congresso. E sabem por quê? Porque o presidente não quer tratar desses temas. Acredita que basta cumprir o superávit primário de 3,8% do PIB até o final de seu mandato. Com certeza bastaria se o cenário fosse outro, se não estivéssemos passando por uma crise internacional, com a inflação em alta no mundo todo. Mas as coisas mudaram nos últimos meses, o vento já não sopra totalmente a favor. Daí que, se um lado do barco não rema, o outro terá de pôr mais força nas mãos para manter o rumo. É assim que os juros acabarão subindo na próxima reunião do Copom.

valdo cruz

Valdo Cruz é repórter especial da Folha. Cobre os bastidores do mundo da política e da economia em Brasília. Escreve às segundas-feiras.

 

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