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valdo cruz

 

04/07/2011 - 17h55

Itamar Franco, méritos e confusões

Se já é difícil decifrar a alma de um homem, muito mais ainda se ele se chamava Itamar Franco. Autêntico, nacionalista, turrão, honesto e atrapalhado, Itamar construiu uma carreira política de respeito tendo ele próprio como seu principal inimigo. Deu certo. Não por outro motivo costumam chamá-lo de Forrest Gump brasileiro.

Foi embora tendo como uma de suas maiores mágoas não ser reconhecido como o responsável pela edição do Plano Real. Mágoa que o fez se distanciar do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que ficou com os maiores méritos pela implantação do plano que, enfim, estabilizou a economia brasileira.

Uma viagem pela história recente da economia brasileira precisa e tem de reconhecer em Itamar Franco o mérito de ter bancado o Plano Real. Presidente, ele poderia muito bem ter dito "não". Bastava se recusar a assinar a medida provisória elaborada pela equipe do então ministro da Fazenda FHC.

Assinou e o plano virou realidade, se tornou um sucesso e elegeu Fernando Henrique presidente do Brasil, sucedendo Itamar Franco. FHC acabou ofuscando aquele que lhe abriu as portas para chegar à Presidência.

A montagem do plano, contudo, teve no próprio Itamar Franco um dos maiores obstáculos a serem superados. Lembro que a equipe de FHC na Fazenda costumava fazer comentários deselegantes sobre as intervenções de Itamar nas discussões sobre a elaboração do plano econômico.

Ele queria porque queria, por exemplo, incluir um artigo prevendo controle de preços. Algo que os economistas convocados por FHC não queriam de jeito nenhum. Exatamente porque não deu certo nas tentativas anteriores de estabilizar a economia brasileira. Inventaram um artigo sobre o tema só para atender Itamar, mas que jamais seria aplicado e não tinha nenhuma utilidade.

Verdade ou mentira, lembro também da história de que, também para agradar Itamar, incluíram na medida provisória a autorização para que os supermercados vendessem remédios. A equipe de FHC considerava o artigo um contrabando, mas ali foi incluído para evitar problemas com o chefe supremo.

Mais detalhes sobre as confusões criadas por Itamar na montagem do Plano Real podem ser encontradas no livro "A História Real", dos jornalistas Gilberto Dimenstein e Josias de Souza. Agora, é bom repetir, mesmo criando dificuldades e até ameaçando, vez ou outra, desistir de tudo e até renunciar, Itamar Franco bancou o Plano Real e mudou a história do Brasil.

Claro que, na época, seu campo de manobra já estava bastante restrito, depois de demitir três ministros da Fazenda. Mas ele podia, muito bem, polêmico que era, jogar tudo pelos ares. Preferiu confiar em FHC e sua equipe, mesmo a contragosto em vários pontos do plano.

Manteve afiado seu estilo polêmico depois de deixar a Presidência e o exercitou como nunca à frente do governo de Minas, para o qual foi eleito com certa ajuda de FHC, já presidente da República. Na época, decretou moratória da dívida do Estado de Minas Gerais. Ainda como governador, chegou a ameaçar desapropriar uma fazenda de FHC em Minas. Colocou tanques para proteger o Palácio da Liberdade sob a justificativa de que o Estado estava sob ameaça. Algo que ele sabia muito bem não existir, mas precisava passar seu recado. Passou, mas criou uma cena fora de propósito, como se Minas estivesse em guerra com a União.

Admirado pelos mineiros por ser visto como exemplo de um tipo de político em extinção, convicto de suas ideias e intransigente na gestão da coisa pública, Itamar estava escrevendo um novo capítulo de sua história no Senado, Casa que já havia frequentado em ocasiões anteriores. Despontava como uma voz importante de uma oposição totalmente desarticulada. O cenário lhe era favorável, demonstrava estar na sua melhor forma para ocupar a tribuna do Senado, mas foi chamado a ir embora.

valdo cruz

Valdo Cruz é repórter especial da Folha. Cobre os bastidores do mundo da política e da economia em Brasília. Escreve às segundas-feiras.

 

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