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23/10/2002 - 11h35

Prefeito quer "laboratório da reconciliação" em Medellín

VALQUIRIA REY
da BBC, em Bogotá

O prefeito de Medellín, Luiz Pérez Gutiérrez, afirmou em entrevista à BBC Brasil que quer transformar a segunda maior cidade da Colômbia em "um laboratório da reconciliação".

Nesta semana, Pérez, acusado de autoritário e militarista por entidades de direitos humanos, recebeu autorização do presidente Álvaro Uribe para dialogar com grupos armados que atuam na cidade de 2,2 milhões de habitantes.

As negociaçoes visam neutralizar as ações violentas de guerrilheiros e paramilitares, que se enfrentam há vários meses pelo controle de bairros da periferia. Na semana passada, uma operação do Exército e da polícia na região deixou 18 mortos.

BBC Brasil - Que tipo de autorização o senhor recebeu do governo nacional para iniciar negociações de paz com guerrilheiros e paramilitares que atuam em Medellín?

Luis Pérez Gutiérrez - Estamos estruturando o processo de paz em Medellín há aproximadamente um ano. Nosso objetivo é fazer com que os violentos se entreguem ao governo da cidade e se submetam a um processo de reeducação. Ao final de 12 meses, eles recebariam um emprego garantido durante dez anos. Há mais de oito meses, conversei com o atual presidente sobre essa intenção de iniciar o diálogo. Nesta semana, recebi oficialmente a autorização. Álvaro Uribe sugeriu que os diálogos sejam feitos em segredo e com muita prudência. Nos comprometemos em manter contato permanente com o governo federal.

BBC Brasil - Quem poderá participar das negociçoes de paz? Quantas pessoas podem ser reintegradas?

Pérez - Todas aquelas pessoas que se encontram nos diversos grupos violentos e estão dispostas a abandonar a guerra serão acolhidas no programa de paz. A cifra ainda é incerta, mas acreditamos que entre 2,5 mil e 3,5 mil membros ou informantes das guerrilhas das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e do Exército de Libertação Nacional (ELN) e de grupos paramilitares. O plano de paz não estará aberto a combatentes presos.

BBC Brasil - Na Comuna 13 (bairro onde ocorreram os confrontos da semana passada), o combate entre guerrilheiros e paramilitares já resultou neste ano em 450 mortes. Que medidas serão tomadas para reduzir a violência?

Pérez - Na noite de ontem, iniciamos um toque de recolher, proibindo a circulação de pessoas entre 22h (de ontem) e 5h (entre 1h e 8h de hoje, no horário de Brasília). Também impusemos uma lei seca e suspendemos a venda de botijões de gás. Nossa política de segurança está baseada em três elementos. Primeiro, investimento social. O segundo ponto para a paz são os diálogos e o processo de reinserção social. O terceiro elemento é a manutenção permanente da ordem pública.

BBC Brasil - Por que o conflito na Comuna 13 atingiu essa proporção?

Pérez - Principalmente porque essa zona está numa montanha, onde chegam guerrilheiros de outras partes da Colômbia. Esse lugar serviu de assentamento para eles. Durante dez anos, eles nunca foram incomodados. Além disso, por alguma razão que pode vir da herança do narcotráfico, temos uma juventude fácil de ser convencida a ingressar na delinqüência.

BBC Brasil> - Os moradores do lugar têm acusado abusos e prisões arbitrárias?

Pérez - Foram detidas em torno de 250 pessoas. A grande maioria já enfrentou processo judicial e foi condenada. Outros estão em investigação, e 30 são menores de idade, que não podem ser processados. Com o objetivo de proteger a integridade dessas crianças, vamos levá-las para escolas em outras cidades. Nossa intenção é afastar essas crianças de qualquer possibilidade de retaliações.

BBC Brasil - Então não há nada de ilegal nessas detenções?

Pérez - A primeira coisa que solicitei aos generais é que as operações sejam feitas com o respaldo da Procuradoria ou da Promotoria. Caso eles não cumpram essa determinação, eu serei o primeiro a defender o direito dos cidadãos, para que eles não sejam atropelados pela força da lei ou dos ilegais.

BBC Brasil - Algumas ONGs (organizações não-governamentais) dizem que a má distribuição de renda na cidade é uma das causas do conflito. O senhor concorda?

Pérez - Não acredito que a pobreza seja licença para matar. O problema nesse local não é porque as pessoas estão pedindo pão, mas é causado pela guerra.

BBC Brasil - Uma série de ONGs o acusam de autoritário e militarista, incapaz de resolver o conflito na cidade. Como o sebhor vê isso?

Pérez - A maioria da população está muito feliz com o processo de paz que estamos anunciando. Como governante, entendo que no mundo inteiro e, particularmente, na Colômbia, há ONGs para tudo. Algumas estão a favor de um candidato político e outras contra. Por isso, muitos candidatos têm sua própria ONG, para que esta o ajude em suas campanhas. Aqui, algumas são favoráveis as Farc, e outras contra. O mais importante é fazer um governo justo que defenda os direitos humanos e trate de manter a harmonia em todo o território.

BBC Brasil - O conflito em Medellín piorou com a entrada dos paramilitares. No entanto, não são registradas ações contra eles. Por que esse grupo não é combatido?

Pérez - Isso não é verdade. Farc, ELN e paramilitares estão sendo golpeados da mesma forma. Como prefeito de Medellín, eu confio apenas na polícia, no Exército e nas forças de segurança visíveis.

BBC Brasil - É verdade que há militares trabalhando como ou com paramilitares?

Pérez - Estou seguro que não. Nós temos dado ordens para que em Medellín sejam combatidos todos os atores violentos. Também pretendemos dialogar com todos que estejam dispostos a se entregar, iniciar uma nova vida e, junto conosco, construir uma nova sociedade.


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