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25/05/2004 - 08h22

Kirchner completa um ano com aprovação alta, mas em queda

MARCIA CARMO
da BBC, em Buenos Aires

O governo do presidente Néstor Kirchner completa um ano nesta terça-feira com uma aprovação de 63%, a melhor avaliação de um líder do país desde a Presidência de Carlos Menem.

A popularidade de Kirchner bate também a Eduardo Duhalde e Fernando de la Rúa na mesma época de seus governos.

Pesquisa de opinião da consultoria Mora y Araujo revelou que 63% dos argentinos consideram "positivo" o primeiro ano do seu governo.

Quando assumiu, Kirchner contava com 22% dos votos do primeiro turno das eleições, já que seu opositor Carlos Menem desistira de disputar o segundo turno do pleito.

Com medidas de impacto como decretar a demissão da cúpula da polícia e de 75% dos generais do Exército, de apoiar a prisão de militares acusados de crimes cometidos durante a ditadura, que durou de 1976 a 1983, e de desafiar o FMI (Fundo Monetário Internacional), Néstor Kirchner passou a ser respeitado pela maioria da população.

No entanto, a imagem do governo está começando a ficar desgastada.
Apesar da aprovação ainda ser alta, ela está em queda: de março para abril caiu 15 pontos percentuais, segundo pesquisa da Universidade Torcuato Di Tella.

E as críticas à administração federal começaram a surgir com maior força.

"Autoritário"

A ex-deputada Elisa Carrió, do Partido Argentina para Uma República de Iguais (ARI, na sigla em espanhol), disse que o estilo presidencial é "autoritário".

Segundo ela, o presidente não aceita críticas, limita o trabalho da imprensa e governa com um pequeno grupo de assessores.

Ela cita como exemplo o fato de que ele jamais realizou uma reunião ministerial, preferindo conversar, separadamente, com cada assessor, além de ter assinado mais decretos que seus antecessores no mesmo período de governo.

Para ela, o aumento das críticas é uma questão de tempo. "Quando a popularidade dele cair um pouco mais, os argentinos vão passar a cobrar um governo mais eficiente. Sempre foi assim na Argentina", disse ela.

Para os economistas Orlando Ferreres, da consultoria Ferreres e Associados, e Débora Giorgi, ex-secretária de Indústria, os avanços do país nesta primeira etapa da era Kirchner são econômicos: crescimento de 8,7% em 2003, após uma queda de cerca de 15% do PIB (Produto Interno Bruto), entre 2001 e 2002, e a redução de quatro pontos percentuais na taxa de desemprego, nos últimos 12 meses.

"Degraus do inferno"

Ferreres e Giorgi são, porém, enfáticos ao destacar que os verdadeiros desafios começam agora, no segundo ano de gestão.

Em junho, desembarca na capital argentina uma nova missão do FMI para a revisão das metas do acordo em vigor. A maioria delas cumprida, de acordo com números do Ministério da Economia.

Assessores do FMI informaram que o tema delicado para a Argentina ainda é a negociação dívida pública privada de US$ 87 bilhões, em moratória desde dezembro de 2001.

Desde então, o país não tem acesso ao mercado de capitais. Para diferentes analistas, esse acordo é "fundamental" para que o país volte a ter confiança dos investidores.

Em entrevistas aos jornais "Clarín" e "Página 12" e ao programa dominical de TV "La Cornisa", o presidente fez a seguinte avaliação sobre esta sua primeira etapa de governo: "Subimos dois degraus do inferno".

Segundo ele, a Argentina só chegará ao paraíso quando acabar com a pobreza e as diferenças sociais e solucionar problemas como a insegurança pública.

Para os analistas políticos Rosendo Fraga, do Centro de Estudos União para a Nova Maioria, e Sérgio Berenztein, da Universidade Torcuato Di Tella, em março o governo se viu obrigado a mudar a agenda que vinha implementado até então.

Naquele mês, o empresário Juan Carlos Blumberg liderou uma manifestação recorde em frente ao Congresso Nacional pedindo segurança pública e justiça para o caso de filho único, Axel, que foi seqüestrado e morto pelos raptores.

O fato levou Kirchner a apresentar um plano nacional contra a insegurança.

No mesmo mês, o presidente tinha lançado o Museu da Memória na Escola Superior de Mecânica da Armada (ESMA), onde, estima-se, passaram 5.000 desaparecidos políticos durante a recente ditadura argentina.

Mas o ato acabou dividindo seu partido, o Partido Justicialista (PJ, peronista) e gerando críticas públicas do ex-presidente Raul Alfonsín, entre outros.

"Como ele poderia pedir perdão porque até aqui não se tinha feito nada? No meu governo, fomos o único país da América Latina a levar os militares ao banco dos réus", disse Alfonsín. O ex-presidente afirmou que não aprova o estilo de governar de Kirchner, avesso a receber os partidos políticos. Para ele, um sinal de "unilateralismo" ou "autoritarismo" político.

No mês passado, a situação voltou a complicar-se para o governo quando surgiu a crise energética, levando Kirchner a ter diferenças públicas com as empresas petroleiras.

A escassez de gás e de energia elétrica acabou arranhando sua relação com o Chile, dependente do gás argentino. Para evitar apagões, o governo determinou a restrição do envio do produto ao país vizinho. O episódio já foi superado, mas chegou a levar integrantes do governo do chileno Ricardo Lagos a lamentarem a "confiança" depositada na Argentina.

"Pingüim"

Em maio, a poucos dias do primeiro ano de governo, o presidente se viu obrigado a impor um racionamento energético no país. Ao contrário do esperado, a população argentina não protestou.

Na entrevista televisiva que concedeu domingo à noite, Kirchner desabafou: "Alguns afirmavam que eu cairia em dias". Segundo ele, o tempo está mostrando que as apostas contra ele não passam de disparates. Como fez questão de destacar, num recente discurso: "El pinguino resiste" ("O pingüim resiste"). Esse foi o apelido que ele mesmo começou a propagar quando assumiu a cadeira presidencial na Casa Rosada.

Néstor Kirchner nasceu na Província de Santa Cruz, na Patagônia, onde os pingüins proliferam --ele foi governador durante 12 anos na região. Agora ele espera mostrar a mesma longevidade no comando do país.
 

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