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04/11/2004 - 02h42

Lucas Mendes responde perguntas sobre as eleições americanas

da BBC Brasil

No dia em que o mundo soube que George W. Bush seguirá mais quatro anos no cargo de presidente dos Estados Unidos, o colunista Lucas Mendes, que vive há 36 anos no país, respondeu perguntas enviadas por internautas da BBC Brasil.

Lucas respondeu perguntas sobre a eleição, comparou essa campanha a outras anteriores e discutiu o futuro da nação mais rica e poderosa do mundo.

Como seria um segundo governo de Bush? Muito diferente do primeiro? Como fica a guerra ao terror? O que foi determinante para a reeleição do presidente?

Lucas Mendes é um dos mais respeitados correspondentes brasileiros no exterior.

Mora em Nova York desde 1968, onde foi correspondente do Grupo Bloch e da TV Globo. Em 1993, criou o programa de televisão Manhattan Connection, da GNT.

Na BBC Brasil, ele mantém uma coluna duas vezes por semana desde agosto de 2001.

Gileno Novaes, Recife (PE): Sempre foram comuns as fraudes nas eleições americanas. Por que o país não consegue fazer máquinas de votar precisas. Sílvia Andrade de Niterói (RJ): Por que não há urnas eletrônicas nas eleições americanas?

Lucas Mendes: Tenho a impressão que um terço das urnas já são eletrônicas.

Até a crise da Flórida, tudo funcionou quase perfeitamente bem, quer dizer, houve suspeita de fraude na eleição do Nixon contra o Kennedy, suspeita de que o Kennedy teria roubado.

Depois houve desconfiança de que o Nixon teria roubado contra o Humphrey.

Em geral, entretanto, a população e os políticos aceitaram os resultados até o problema da Flórida.

O governo aprovou uma nova lei em 2002, inclusive com a criação da cédula provisória que está lá em Ohio, mas eles não tiveram nem tempo nem verba para instalar essas máquinas e melhorar o sistema.

Wilson Pizzato, de Curitiba (PR): Aqui no Brasil temos ouvido e visto tremendas aberrações no processo eletivo americano, como quatro tipos diferentes de votos, cédulas extraviadas pelos correios, milhões gastos com advogados antecipando possibilidade de fraudes, americanos vivendo no Brasil não puderam votar porque seus nomes vieram grafados incorretamente e outras mazelas. Por que isso ocorre? Como podemos confiar num país que não consegue eleger seu presidente sem que haja suspeitas de fraudes?

Lucas Mendes: A margem da vitória desta vez não vai levantar suspeita de maracutaia como da outra vez, com a confusão da Flórida em 2000.

O sistema eleitoral americano é de fato confuso, complicado e suspeito porque ele é controlado pelas máquinas do partido que domina aquele Estado.

Cada vez mais se fala de um sistema independente como existe no Brasil. Mas o colégio eleitoral não deve acabar nem o sistema deve mudar tão cedo até porque as máquinas devem melhorar.

Patrícia de Montes Claros (MG): Se Bush ganhou esta eleição, porque o povo norte-americano é extremamente conservador?

Lucas Mendes: O Bush ganhou porque os americanos estão com medo do terror e eles acham que o presidente tem mais qualidades de líder do que o senador.

Nos outros itens domésticos, o senador leva vantagem, especialmente na economia, mas em relação ao terrorismo, Kerry dá a impressão de hesitação e incerteza.

O senador dependia muito do voto jovem, de quem está votando pela primeira vez.

Entre eles, a vantagem, de Kerry é de 15% em relação ao Bush, mas os jovens não votaram, o comparecimento deles abaixo de 10%, igual a 2000.

Em compensação, o presidente mobilizou os evangélicos. De cada dez votos, dois foram motivados por valores morais.

Rodnei Brocanelli de São Paulo (SP): Por que o Partido Democrata resolveu não lançar novamente Al Gore como candidato à Presidência em 2004. O resultado poderia ter sido diferente?

Lucas Mendes: É uma boa pergunta, mas Al Gore, assim como Kerry, não desperta paixões.

O próprio Al Gore se afastou muito da política após a derrota. Além disso, ele fez uma bobagem que foi se afastar dos Clintons, que são as locomotivas do partido.

Em geral, os americanos gostam de dar chances a outras pessoas. Existem excessões, claro, o Nixon perdeu mais de uma vez, mas geralmente há uma mudança de candidatos.

Fábio, de Veranópolis (RS): Por que motivo nunca se vê um candidato popular nos EUA? Os candidatos dos Partidos Democrata e Republicano são sempre da mais alta elite do país. Como o cidadão comum vê esse fato?

Lucas Mendes: Não é correto, eles não são da elite. E não sei se o internauta quer dizer popular ou populista.

O Ross Peru era um milionário e também populista. O Truman era pobre, veio do Missouri.

Lyndon Johnson também saiu de família humilde, assim como Nixon. Gerald Ford também começou por baixo.

Não se pode dizer que o Carter seja da elite e o Reagan também era de família pobre, seu pai vendia sapatos.

Depois veio o Bush, que é um aristocrata e Clinton, outro que veio de família humilde. Na verdade, não vejo essa linha elitista, na verdade parece o contrário. São pessoas que começaram cedo em política.

Vinícius do Rio de Janeiro (RJ): Você acredita em uma maior radicalização da ação terrorista (especialmente a Al-Qaeda) com a vitória de Bush nas eleições americanas ? Max Pezzin, de Concórdia (SC): Os grupos terroristas estão "gostando" de ter um atirador cego no comando da guerra ao terrorismo?

Lucas Mendes: Se você entrar na cabeça do terrorista e pensar como ele, é possível que você ache que a eleição do Bush tenha sido um incentivo.

Por outro lado, ele ganha mais apoio dentro de casa. Vai ser mais fácil para ele aprovar verbas contra o terrorismo. A coisa, no entanto, vai depender do sucesso ou fracasso na guerra do Iraque, se a eleição acontecer no país, se a insurreição aumentar, tivermos mais americanos mortos, o terror vai aumentar.

E também a questão palestina. Ele podia aproveitar o momento, já que houve uma rejeição maciça, o voto judeu foi todo contra ele, embora Bush apoie incondicionalmente Israel.

Como não tem o voto judeu, ele podia aproveitar e adotar uma política mais equilibrada no Oriente Médio.

Frederico de Santos (SP): O vídeo do Bin Laden ajudou o Bush?

Lucas Mendes: Eu acho que não ajudou. O vídeo do Bin Laden era confuso.

Por tudo o que eu li, minha interpretação é que não ajudou. Mas tem gente que acha que ajudou o Bush por ter trazido mais medo para a população e outros acham que ajudou o Kerry por ter provado que o presidente não conseguiu pará-lo.

Beatriz, de Campinas (SP): Os eleitores americanos se parecem com eleitores brasileiros, votando com a emoção e não com a razão? Como a nação mais poderosa do planeta pode ficar mais quatro anos nas mãos de Bush?

Lucas Mendes: Se você vier para Nova York, eles vão dizer que vão ser mais quatro anos de guerra, desemprego, poluição, mamatas para grandes empresas, menos impostos para os ricos, menos verba para o social e mais religião.

Essa, entretanto, é a posição de um liberal. Eu duvido que o Bush vai levar o país ainda mais para a direita.

Alexandre Correia, de Florianópolis (SC): Qual a sua opinião pessoal sobre George W. Bush? Você acha que ele deve figurar em que tipo de galeria de presidentes que já governaram os EUA? Ele é parecido com algum outro presidente?

Lucas Mendes: Não sou um admirador das políticas do presidente, eu fico impressionado com a disposição de briga dele.

Ele é muito diferente dos presidentes mais recentes. Em alguns aspectos ele lembra o presidente Roosevelt, um fazendeiro, patriota, imperialista, mas como eu disse, o segundo mandato, em geral, é um mandato medíocre, não um de grandes execuções.

A minha opinião é que ele vai adotar um tom mais conciliatório.

Anderson Neira, Rio de Janeiro (RJ): Com a vitória de Bush, o mundo ficará mais perigoso, ele se sentirá justificado em tudo o que fez?

Lucas Mendes: Suas opiniões sem dúvida vão ser reforçadas, afinal foi um referendo que mostrou uma vantagem de três milhões de votos.

Essa é uma das maiores margens com que um presidente foi eleito, talvez a maior. Mas acho que ele vai dar uma guinada para o centro, o rancor é palavra de honra nesse país. Um presidente não tem interesse em governar um país tão dividido.

Guilherme Lago, de Lagoa Santa (GO): Com a vitória de George W. Bush como fica o Brasil perante os olhos do governo republicano, e qual será o destino do acordos como a Alca?

Lucas Mendes: Não vejo mudança, é uma continuidade. A Alca depende mais do Brasil, se o país quer ou não participar. Os americanos vão continuar a fazer acordos bilaterais. Agora, com o controle da Câmara e do Senado, ele tem mais liberdade e autoridade para fechar acordos internacionais.

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