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18/05/2005 - 10h08

Arábicas: Árabes gostam mais da Palestina do que de palestinos

PAULO CABRAL
da BBC Brasil, no Cairo

O filme A Porta do Sol - uma produção conjunta de franceses, egípcios, marroquinos e sírios, em duas partes - fez muito sucesso no mundo árabe misturando uma história de amor com a luta palestina.

Em uma das cenas, Khalil, um ex-guerrilheiro do Fatah exilado no Líbano, é insultado em um bar de Beirute - com piadinhas xenofóbicas e dedos em feridas doloridas - por um garçom libanês. Khalil desabafa: "Os árabes são todos assim. Adoram a Palestina, mas odeiam os palestinos".

A frase é uma caricatura que exagera e generaliza uma situação muito complicada. Mas também retrata uma dualidade que não é difícil de se encontrar por aqui.

Por um lado, a causa palestina e a busca por um Estado Palestino são pilares do pensamento árabe. A solidariedade aos palestinos e a crítica a Israel são dos poucos temas que conseguem um virtual consenso nas 22 nações árabes e em diversos outros países islâmicos.

Mas, por outro lado, a relação desses países e de seus povos com os palestinos, influenciada por percepções antigas e fatos políticos mais recentes, está longe de ser tão consensual e positiva.

No Líbano, por exemplo, centenas de milhares de refugiados palestinos são proibidos de exercer uma grande lista de profissões e têm de viver em campos constantemente criticados por problemas com direitos humanos.

Ainda pesa sobre eles a acusação de terem começado, em 1975 - num confronto com milícias cristãs - a Guerra Civil libanesa, que durou cerca de 15 anos. Em 1982, todos os militantes palestinos que estavam no Líbano tiveram que entregar suas armas ou partir para o exílo em outro país.

Fuga

Outra cena que chama a atenção em A Porta do Sol é o momento em que os palestinos saem de Beirute a caminho do barco que os levaria à Tunísia, escoltados pelos soldados ocidentais que tiveram de protegê-los dos libaneses.

Yasser Arafat e a cúpula da Organização pela Libertação da Palestina (OLP) - que já haviam sido expulsos da Jordânia em 1971, antes de se estabelecerem no Líbano - também tiveram que partir para novo exílio (e nova base de operações) em Túnis.

Quando Arafat deixou a Tunísia em 1994 para voltar a Ramallah - depois da assinatura dos Tratados de Oslo -, relatos na imprensa também mostraram um discreto alívio do governo local com a saída da cúpula da OLP e uma preocupação com os refugiados que ficaram para trás.

Os países árabes dizem que não têm condições de absorver todos os refugiados que, segundo números da Agência das Nações Unidas para Refugiados Palestinos (UNRWA), chegam a 4,1 milhões no Oriente Médio.

Os governos dizem publicamente que não podem suportar o peso econômico dessa absorção, mas é também é bem sabido que nenhum deles quer entrar no foco de Israel como uma base de operações de grupos palestinos.

Aqui no Egito, um dos principais trunfos nas mãos do presidente Hosni Mubarak é o fato de que, durante seu governo, soldados egípcios não foram enviados para lutar em guerras envolvendo Israel.

Há os grupos islamistas mais radicais que consideram isso uma falha grave, mas o egípcio médio - por mais que participe da opinião consensual de culpar Israel e defender a Palestina - prefere não enfrentar uma guerra ou ver seus filhos nela.

Certa vez, eu conversava sobre os povos árabes com um egípcio, que estava criticando os árabes dos países do Golfo. Falar mal dos árabes do Golfo (que eles são ricos, preguiçosos e arrogantes) é um esporte nacional no Egito, numa rixa que lembra um pouco paulistanos e cariocas.

"E os palestinos, o que você acha deles?", perguntei.

Ele pensou por alguns segundos e respondeu. "Eles são árabes, perderam a terra deles, estão em guerra e vivem oprimidos. Por que eu vou criticar os palestinos? Eles não merecem."
 

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