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28/10/2005 - 13h00

EUA e Europa têm apenas retórica para enfrentar o Irã

BRIDGET KENDALL
da BBC Brasil

As relações do Irã com seus antigos parceiros na Europa parece estar rolando montanha abaixo como uma bola de neve que cresce fora de controle.

Desde que o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, foi empossado em meados de agosto, a cada semana a confrontação parece escalar.

E agora, a última camada de gelo foi adicionada às relações entre países; declarações hostis sobre Israel do presidente iraniano provocam desapontamento geral.

Na verdade é comum que autoridades iranianas lancem mão de retórica virulenta contra Israel.

E o presidente Ahmadinejad estava se dirigindo a uma audiência de estudantes iranianos conservadores em uma conferência em Teerã, às vésperas de um ato público pró-palestino que se realiza sempre na última sexta-feira do Ramadã, o mês sagrado dos muçulmanos.

Mas não levou muito tempo para que um coro de governos europeus, mais Canadá, Estados Unidos e Austrália - e, claro, Israel - condenassem os comentários como profundamente perturbadores e totalmente inaceitáveis, e convocassem embaixadores iranianos para manifestar seu desagrado.

A Grã-Bretanha qualificou as declarações como repulsivas. Políticos israelenses pediram a expulsão do Irã da Organização das Nações Unidas.

Então, por que esta reação?

Em primeiro lugar, foi a veemência do presidente Ahmadinejad que causou tal preocupação.

Uma coisa é o Irã se recusar a admitir o Estado de Israel de existir. Outra bem diferente é aplaudir a perspectiva de uma nova onda de ataques palestinos que pode "varrer Israel".

"É uma coisa estúpida para qualquer chefe de Estado dizer sobre um outro país", afirmou um diplomata britânico.

Outros diplomatas destacaram o momento extremamente ruim para os comentários do presidente iraniano, feitos horas depois de um atentado a bomba suicida de militantes palestinos contra civis israelenses.

Em segundo lugar, a declaração reforça preocupações ocidentais de que a política do Irã esteja mudando.

Nos últimos oito anos de estilo de governo mais moderado do presidente Khatami, as relações do país com as potências européias melhoraram significativamente.

E, para os europeus, foi positiva a sinalização de Khatami de que se os palestinos pudessem encontrar uma forma de coexistir com Israel, o Irã não iria interferir.

Então, o fato de um presidente mais conservador reavivar a retórica revolucionária islâmica de 20 anos atrás ao mencionar a convocação do finado Aiatolá Khomeini para que "Israel seja varrido do mapa" iria provavelmente causar comoção.

Iria ainda despertar graves temores de que a política do Irã e suas intenções para com Israel podem estar mudando radicalmente.

Controvérsia nuclear

Mas há ainda uma terceira razão para tal expressão coordenada de indignação Ocidental: A controvérsia, ainda não resolvida, sobre o programa nuclear iraniano.

Durante anos os Estados Unidos, agora em conjunto com a Europa, despertou temores de que o programa nuclear supostamente pacífico do Irã pode ser uma fachada para desenvolver armas nucleares em segredo.

O Irã sempre se declarou inocente e insistiu - diferentemente de nações como o Paquistão e a Índia, que construiram e testaram armas nucleares ilicitamente - que leva suas obrigações internacionais sobre energia nuclear a sério.

Mas em setembro a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) declarou que o Irã não estava respeitando o tratado de não-proliferação nuclear e deu ao Irã prazo até sua próxima reunião, no final de novembro, para mostrar que está disposto a cooperar de maneira mais completa.

Em teoria, isto pode significar remeter o Irã, e toda a controvérsia, para o Conselho de Segurança da ONU para que sejam analisadas várias opções - inclusive a imposição de sanções econômicas.

Na prática, embora os Estados Unidos possam agora provavelmente contar com o apoio da União Européia para tal iniciativa, nem todos os países representados na direção da AIEA - ou no Conselho de Segurança da ONU - estão tão dispostos a isso.

Então comentários beligerantes do presidente do Irã, que parecem ameaçar Israel, são a oportunidade perfeita para reforçar o argumento de que não se deve acreditar de imediato na palavra do Irã sobre suas intenções nucleares.

Este é um ponto que vários líderes ocidentais destacaram nos últimos dias e foi resumido pelo primeiro-ministro britânico Tony Blair no final da cúpula informal da União Européia em Hampton Court, perto de Londres.

"Imagine um Estado como este, com uma atitude como esta, tendo armas nucleares?", perguntou ele retoricamente.

Isolamento

Será que esta briga vai afetar a próxima votação da AIEA em novembro e aumentar o isolamento diplomático do Irã?

A reação de países mais ambivalentes é interessante.

O governo da Índia, que vem sendo cortejado por Teerã nos últimos dias, se negou a comentar o assunto.

Mas a Rússia, um outro país-chave na questão, depois de uma hesitação inicial, seguiu a posição da Europa e convocou o embaixador do Irã em Moscou para uma repreensão.

O ministro do Exterior da Rússia, Sergei Lavrov, destacou até que tais comentários inflamatórios reforçariam os argumentos daqueles - como a Grã-Bretanha e os Estados Unidos - que desejam que o controvertido programa nuclear do Irã seja levado ao Conselho de Segurança da ONU.

Mesmo assim, Moscou tem suas próprias razões estratégicas e econômicas para desejar manter as relações com Teerã em bom estado.

Tanto a Rússia quanto a China dependem muito da estratégia iraniana e provavelmente bloqueariam qualquer votação do Conselho de Segurança contra o Irã.

De qualquer forma, quais são os instrumentos diplomáticos que restam para americanos e europeus?

Pressão retórica, claro, sempre que o Irã diga ou faça qualquer coisa que pareça pouco razoável.
 

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