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03/05/2006 - 07h33

Morales segue exemplo da Venezuela em nacionalização

CLAUDIA JARDIM
da BBC Brasil, em Caracas

A nacionalização dos hidrocarbonetos mostra que La Paz está seguindo o exemplo de Caracas e se aliando à Venezuela em defesa de seus recursos energéticos.

Além de atender uma reivindicação histórica dos movimentos populares bolivianos – responsáveis pela derrocada do ex-presidente Gonzalo Sanchéz de Lozada 2003 - a nacionalização dos recursos natural anunciada dia 1° pelo presidente da Bolívia, Evo Morales, reacende a discussão sobre a soberania energética da região e a ousadia dos países ao confrontar os interesses das transnacionais petroleiras.

O Estado boliviano passa agora a ser o único proprietário de seus recursos naturais, limitando às empresas transnacionais ao papel de prestadoras de serviços, as quais de acordo com o decreto de nacionalização têm um prazo de 180 dias para adequar-se às novas regras.

A partir de agora, as empresas que extraem um número superior a 100 milhões de pés cúbicos de gás, equivalente a 2,8 milhões de metros cúbicos, receberão pela prestação de serviços o equivalente a 18% do total arrecadado e não mais 82% como estabeleciam os contratos anteriores, segundo informações o ministério de Hidrocarbonetos.

'Soberania'

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, durante um ato de entrega de bolsas de estudos a venezuelanos comentou a decisão de Evo Morales em nacionalizar os hidrocarbonetos do país.

"Soberania não se discute, se respeita. Nós apoiamos a decisão de Bolívia", afirmou.

Chávez aproveitou para criticar as análises dos jornais americanos e britânicos que pretendem associar seu nome à decisão de Morales.

"Isso é manipulação. A Bolívia e um país soberano. Evo (Morales) sabe o que está fazendo".

O presidente venezuelano confirmou que na próxima quinta-feira se reunirá com os presidentes brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, com o argentino Néstor Kirchner e com o boliviano Evo Morales para discutir a inclusão da Bolívia no projeto do gasoduto que deverá garantir abastecimento de gás aos quatro países e permitir o apoio às demais nações da América Latina.

"Em 48 horas estaremos reunidos para buscar formas de integração energética na América do Sul e sobretudo para evitar notícias alarmistas", disse.

Chávez anunciou que um dos acordos incorporados ao TCP em Havana, está relacionado ao apoio para que Bolívia possa criar sua própria indústria petroquímica, o que pode proporcionar maior valor agregado às exportações de derivados de petróleo e gás.

Contratos

Pablo Sólon, assessor de Evo Morales para assuntos de Integração, explica que entre os anos 1996 e 2005 foram firmados mais de 70 contratos que violam a Constituição.

Contrariando a lei, os acordos determinavam que os recursos naturais pertenciam ao Estado sempre e quando estivessem no subsolo boliviano. A partir do momento que era extraído passava a ser de propriedade da empresa responsável pela operação.

A Constituição da Bolívia de 1967 prevê que os recursos naturais pertencem ao Estado de maneira intransferível e inalienável. Outra normativa jurídica que sustenta o Decreto de Nacionalização é a Lei de Hidrocarbonetos aprovada em 2005.

"Se tratava de uma violação à Constituição. Prova disso é que esses contratos nunca foram levados à aprovação no Congresso ou ratificados pelo Tribunal Constitucional, como deveria ser. Isso prova sua ilegalidade", analisa Sólon. A Petrobrás era uma das beneficiárias destes contratos.

Riscos e legislação

Ao enfrentar os interesses das petroleiras internacionais a Bolívia pode ameaçar a produção petroleira do país.

A avaliação é do analista petroleiro venezuelano, Alberto Quiros Corradi, para quem a decisão de Morales é ainda mais ousada do que a de Chávez quando aplicou a Lei de Hidrocarbonetos e recuperou a estatal Petróleo de Venezuela, após a paralisação da produção durante dois meses, em 2002, durante a crise com setores da oposição do país.

"Quando o governo Chávez tomou o controle da PDVSA a empresa tinha capacidade técnica de seguir a um ritmo normal sem a ajuda de outras empresas. Ainda assim teve muita cautela ao negociar os novos contratos com as petroleiras. Não acredito que Bolívia tenha auto-suficiência nesse sentido. É um risco", afirma Corradi, um dos opositores do governo Chávez, afetado com a recuperação da empresa às mãos do Estado.

Nesta tarde o governo boliviano anunciou que não pretende retroceder da decisão.

Energia e integração

Coincidência ou não, os dois países que detém as maiores reservas de gás e petróleo (caso da Venezuela) da América do Sul recorrem aos recursos energéticos para dar impulso a seus projetos de governo com forte caráter popular.

Na Venezuela, somente após a reestatização da Petróleos de Venezuela (PDVSA) o governo pode impulsionar os programas sociais de alfabetização, saúde e geração de empregos que hoje dão sustentabilidade à gestão Hugo Chávez.

O mesmo acontece com a Bolívia. Na avaliação do assessor de Evo Morales, Pablo Sólon, o país andino só poderá desenvolver-se se mantiver o controle sobre seus recursos naturais.

"Recuperamos os recursos naturais ou o projeto de desenvolvimento estará perdido", afirma Sólon, um dos responsáveis pela elaboração do Tratado de Comércio entre os Povos firmados por Bolívia, Cuba e Venezuela, durante o encontro realizado entre Morales, Fidel Castro e Hugo Chávez, na Havana (Cuba) no dia 30.

O acordo está baseado na cooperação entre os países no sentido de fortalecer as economias e o desenvolvimento social com incentivo ao cooperativismo e às pequenas e médias empresas.

Imediatamente à assinatura do TCP, o ministério de Energia e Minas venezuelano se comprometeu a dar apoio técnico e jurídico ao Ministério de Hidrocarbonetos da Bolívia.

Cuba por sua vez se encarregará dos setores de saúde e alfabetização – em curso na Venezuela há quatro anos – ao país andino e à Bolívia corresponderá o envio de produtos agropecuários e têxteis a Cuba e Venezuela.

"Com um Tratado de Livre Comércio, abrimos as taxas alfandegárias e não temos garantias de compra de nossos produtos. Com o TCP temos a garantia de compra dos nossos produtos e principalmente equilíbrio econômico e social. Não pretendemos destruir-nos e sim complementar-nos", afirma Solón.
 

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