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13/05/2006 - 16h47

Morales 'não sobreviveria sem nacionalização'

MÁRCIA CARMO
da BBC Brasil, em La Paz

O presidente boliviano Evo Morales poderia não sobreviver ao cargo se não tivesse anunciado a nacionalização dos hidrocarbonetos, na opinião de analistas, políticos e eleitores ouvidos pela BBC Brasil.

“Se o presidente não respeitasse a vontade popular poderia haver banho de sangue”, disse o ex-ministro de hidrocarbonetos, Guillermo Torres.

“São seis anos de permanente tensão no país. Nesse período, foram gerados conflitos políticos, sociais e muitos presidentes caíram por causa dos hidrocarbonetos”, afirmou o ministro de Planejamento, Carlos Villegas. Outro assessor direto de Morales completou: “Ele não podia perder mais tempo ou também enfrentaria a pressão das ruas”.

A recuperação do controle do gás e do petróleo produzido na Bolívia foi a principal bandeira da campanha eleitoral de Morales. Mas ninguém sabia ao certo que conceito ele adotaria, na prática, para a nacionalização – se confisco dos bens das empresas ou a maior participação do Estado nas petroleiras, como indica o decreto “Heróis do Chaco”, que anunciou no dia primeiro de maio.

Histórico

Evo Morales foi eleito em dezembro passado com cerca de 54% dos votos. Resultado possível graças à vitória que registrou até mesmo nos departamentos (Estados) em havia maior oposição à nacionalização, como Santa Cruz de la Sierra, na fronteira com o Brasil.

Cem dias depois da sua posse, em 22 de janeiro, o presidente viu sua popularidade minguar 12 pontos percentuais, de acordo com diferentes pesquisas de opinião.

Coincidência ou não, após esses resultados ele intensificou seus anúncios de governo, como a nacionalização de hidrocarbonetos e a recuperação de terras improdutivas ou inconstitucionais – aquelas que são exploradas a 50 quilômetros da fronteira.

“Nós precisávamos de alguém como Evo, que atende nossos pedidos que vem de décadas e décadas atrás”, disse um recepcionista do hotel Presidente, em La Paz, eleitor de Morales.

O decreto de nacionalização praticamente obedece, segundo Torres, a lei de hidrocarbonetos aprovada no ano passado, em meio a uma forte crise política e social.

Aquela lei nasceu depois de um plebiscito realizado, em 2004, durante o governo do presidente Carlos Mesa. Mesa, que era vice do presidente deposto Gonzalo Sánchez de Lozada, foi obrigado a renunciar, em 2005.

A crise institucional e os protestos levaram à queda também dos presidentes da Câmara e do Senado. A lei não tinha agradado completamente a exigência popular. E num período de cinco anos, a Bolívia tinha seu sexto presidente – o então presidente da Suprema Corte de Justiça, Eduardo Rodríguez.

A diferença entre aquela lei e o atual decreto, destaca Torres – um dos autores da lei de hidrocarbonetos – é o aumento de 50% para 82% do pagamento dos lucros dos campos de petróleo de São Alberto e São Antonio. Estes são os dois maiores campos da Bolívia, administrados pela Petrobras e um pequeno grupo de empresas estrangeiras.

Dona da segunda maior reserva de gás da América Latina e de um dos maiores índices de pobreza da região, a Bolívia já provou outros processos parecidos de nacionalização – na tentativa de melhorar a distribuição de renda, a partir de seus próprios recursos naturais.

Essa é a terceira nacionalização dos hidrocarbonetos bolivianos. A primeira foi em 1937 e a segunda em 1969. Nos dois casos, elas contaram com a presença das Forças Armadas, ocupando as refinarias.

Um alto funcionário boliviano de um organismo internacional disse que Morales atendeu o “imaginário popular” ao mandar os soldados ocuparem, no dia 1º de maio, os terminais de petróleo e de gás do país.

“Tradicionalmente, as nacionalizações podem acabar em golpe e foi para evitá-lo e para garantir o abastecimento ao Brasil que chamamos as Forças Armadas”, justificou, mais de uma vez, o ministro de hidrocarbonetos, Andrés Soliz Rada.

As duas nacionalizações anteriores não foram bom negócio para o país, como recordou o alto funcionário boliviano do organismo internacional. Somente no ano passado a Bolívia terminou de pagar a indenização pela sua medida de 1969.
 

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