Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
27/06/2006 - 04h40

Com revés na Somália, EUA temem novo Talebã

CAIO BLINDER
da BBC Brasil, em Nova York

Em meio à contínua violência sectária no Iraque e o ressurgimento do Talebã no Afeganistão, milícias islâmicas agora controlam Mogadíscio, capital da miserável, caótica e estratégica Somália.

A guinada no país desgovernado há 15 anos é mais um revés para os interesses do governo Bush. Em um erro de cálculo, Washington apoiava secretamente derrotadas milícias seculares, que espertamente se engajaram nos esforços contraterroristas dos Estados Unidos.

Às pressas, agora os Estados Unidos tentam recompor sua política. O drama na Somália é a dificuldade para encontrar atores políticos que integrem algum "eixo do bem". Muitos milicianos, que até tempos atrás recebiam dinheiro e equipamento da CIA e do Pentágono, combateram tropas americanas nos anos 90.

A Somália é um cenário de reveses americanos, alguns cinematográficos. Em outubro de 1993, a intervenção humanitária internacional liderada pelos Estados Unidos desintegrou quando 18 soldados americanos morreram em uma batalha com milicianos nas ruas de Mogadíscio que rendeu em 2001 o filme Falcão Negro em Perigo, de Ridley Scott.

Desde então, Washington tratava com negligência ou com atos desastrosos, como este apoio a milícias, o país esquálido do nordeste africano.

Alento a islâmicos

O apoio às milícias seculares, corruptas e violentas se revelou contraprodutivo, pois até deu alento aos grupos islâmicos, e simboliza o fiasco de esforços contraterroristas.

Agora o governo Bush teme que as vitoriosas milícias islâmicas sigam o exemplo do Talebã e disseminem um estrito código religioso, além de uma disposição para abrigar militantes da rede Al-Qaeda, acusados de envolvimento nos atentados em 1998 contra as embaixadas dos Estados Unidos no Quênia e Tanzânia.

A realidade política é que as milícias ligadas à União das Cortes Islâmicas hoje são a força dominante na Somália. Os vitoriosos moderaram sua retórica e se dizem dispostos a partilhar o poder com um impotente governo de transição criado em 2004 com bênção internacional.

Nas últimas semanas, o Departamento de Estado tomou o controle da política americana na região da CIA e do Pentágono e seus diplomatas estão atuando com colegas europeus do chamado Grupo de Contato, no esforço de costurar um acordo, ou o mínimo de estabilidade no país.

Suspeitos

Qualquer missão conciliatória a ser endossada pelo governo Bush irá depender da entrega pelas milícias islâmicas de suspeitos de vínculos com o terror internacional e também de garantias de que não terá vez um governo ao estilo Talebã.

Robert Rotberg, professor da Universidade de Harvard e um dos maiores especialistas em terrorismo no nordeste da África, disse que, de fato, os Estados Unidos não podem continuar a ver a Somália apenas através do prisma do contraterrorismo e que a movimentação diplomática é a melhor opção no momento para o governo Bush.

Rotberg advertiu contra o perigo de associações mecânicas entre o Afeganistão dos tempos do Talebã e a Somália, onde a prática generalizada do islamismo nunca foi fundamentalista. Mais do que isto, em entrevista ao New York Times, Rotberg observou que as milícias islâmicas podem até funcionar como "uma zona tampão entre o terrorismo e o caos".

A Somália obviamente não é uma terra prometida, onde a esperança facilmente ressuscita.

De qualquer forma, John Prendergast, especialista na região do independente International Crisis Group, espera que o governo Bush tenha aprendido uma lição com um erro que lembra desastres anteriores da política externa americana no Terceiro Mundo nos tempos da Guerra Fria: a sofreguidão para armar capangas não substitui o trabalho paciente de construção de instituições.
 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página