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06/07/2006 - 07h25

Pais de vítima de ataques em Londres criticam resgate

PAULA DEAR
da BBC Brasil

Carrie Taylor, de 24 anos, foi uma das sete vítimas fatais da explosão em um trem do metrô da Circle Line, perto da estação de Aldgate, em Londres, nos atentados de 7 de julho do ano passado.

Seus pais, June e John, esperaram 10 dias até que exames de DNA confirmassem a morte de sua filha.

Um ano depois, eles falam de sua perda, raiva e crença de que sua filha poderia ter sobrevivido se a ação de emergência tivesse sido diferente.

"Em alguns dias você se sente ok, em outros você se sente péssimo."

"Não estamos preparados para esquecer ainda. Não queremos deixá-la partir, nem deixar de tentar conseguir justiça para ela e todos os outros", afirma a mãe, June Taylor.

Homenagem

No primeiro aniversário das explosões, os pais de Carrie vão visitar a estação de Aldgate pela primeira vez desde os atentados, para assistir a inauguração de uma placa com os nomes das vítimas.

"Vai ser difícil", disse June, de 58 anos.

Assim como para muitas das vítimas, aquela quinta-feira, um ano atrás, foi um dia de rotina para a família Taylor.

Carrie e sua mãe viajaram juntas para Londres, de trem, como faziam todos os dias.

Carrie aplicou sua maquiagem enquanto as duas conversavam.

Quando elas chegaram a Liverpool Street, Carrie seguiu para o metrô e sua mãe caminhou para o trabalho.

"Nós fazíamos a mesma coisa todos os dias. Carrie me dava um beijo na bochecha e eu lhe dava uma palmadinha no bumbum."

"Eu sempre esperava até que ela sumisse de vista. Naquele dia ela me acenou e sorriu, como que a dizer: 'Pode ir, mãe'."

As duas normalmente voltavam juntas para casa, mas naquela manhã, lembra June, "ela disse que eu não devia esperar por ela aquela noite, porque ela ia às compras com uma amiga".

O resto do dia foi uma história conhecida de preocupações, tentativas de contato, pânico e depois uma ronda pelos hospitais na esperança de que Carrie estivesse dopada ou, na pior das hipóteses, ferida.

"Não sabíamos onde ela estava. Se ela tivesse ido direto para o trabalho, ela não teria pego aquele trem, mas como ela havia dito que precisava comprar algo no caminho, poderia ter se atrasado."

"Nós passamos os três primeiros dias mal comendo ou dormindo. Eu não conseguia desligar a TV", disse June.

"Meu coração afundou"

John, de 57 anos, que trabalha na galeria Tate Modern, disse que o filho do casal, Simon, de 29 anos, foi uma fortaleza para eles.

"Não há como descrever o que passamos naqueles dez dias", diz ele. "Nosso filho foi forte para a gente; ele disse que enquanto não soubéssemos que ela havia morrido, ela não teria morrido."

Impressões digitais e amostras de DNA foram recolhidas da casa por especialistas forenses, depois veio o telefonema da polícia.

"Quando eles ligaram, nosso coração afundou. Você já sabia o que iam te dizer", disse June.

"No princípio não queríamos saber o que havia acontecido com ela, já era ruim o suficiente saber que ela não voltaria para casa", disse June.

Mas, quatro meses depois, um homem procurou-os para dizer que acreditava ter cuidade de Carrie, que ainda estava viva por cerca de 30 minutos depois da explosão.

Segundo June, "a polícia veio e disse a ele que podia ir, mas ele não queria deixá-la. O pessoal da ambulância chegou e deu soro a ela, mas ela morreu depois de quatro minutos".

O casal disse que ficou com raiva pelo modo como foi conduzida a operação de resgate - não com os paramédicos em si - por "deixar nossa filha lá embaixo com todos aqueles ferimentos" e acredita que alguma coisa poderia ter sido feita para salvar Carrie, se o socorro tivesse chegado mais cedo.

"Nós ficamos mortificados ao ouvir isso, isso nos levou diretamente de volta para o 7 de julho", disse June.

Eventos e datas marcantes com freqüência os levam de volta para aquele dia, como receber de volta a bolsa dela, fazer a viagem para Londres pela primeira vez, ler os relatórios oficiais sobre os atentados e lidar com o assédio da mídia.

Não muito tempo depois dos atentados, a polícia deu ao casal a reprodução de uma imagem captada por uma câmera de segurança de June e Carrie andando na estação de Billericay, onde elas pegaram o trem para Londres, horas antes das explosões - uma foto guardada como um tesouro por June.

Luto

Atualmente, eles são uma família de luto, mas tentando levar a vida adiante.

Simon, que também trabalha na Tate, se mudou de volta para a casa dos pais no dia dos atentados e permanece lá até hoje.

"Ele precisava ficar aqui e nós certamente precisávamos dele. Nos sentimos mais forte como uma família, ficando juntos."

June agora repete com Simon a rotina matinal que fazia com Carrie, com seu filho descendo pela mesma entrada do metrô que sua filha pegava todos os dias.

"Ele e Carrie eram muito próximos. Ele costumava vir para casa nos fins de semana e eles iam ao cinema juntos. Um dia antes de ela morrer, eles almoçaram juntos em Londres", disse June.

"No princípio ele foi forte, mas nos últimos três meses ele vem se sentindo como nos sentimos no ano passado. A consciência, de repente, de que ele não vai mais ver a irmã bateu forte. Ele se sente solitário agora."

'Caixa de sabão'

Com Simon e John trabalhando até tarde, todas as noites, essa é uma das horas mais tristes do dia para June.

"Acho difícil voltar para uma casa vazia. Carrie e eu costumávamos voltar juntas, ela dava comida para os gatos e nós começávamos a preparar o jantar."

A família sempre arrumava tempo para passar férias na Flórida, todos os anos.

John disse que a viagem em fevereiro deste ano foi "dura, mas necessária".

"Se não tivéssemos ido, os homens-bomba teriam vencido".

Parte da raiva da família foi concentrada em uma campanha para conseguir melhor compensação para os sobreviventes e pela abertura de um inquérito público sobre os atentados. Eles estão em contato com cerca de outras 15 famílias afetadas.

De certa maneira, os atentados deixaram a família mais politizada.

"Nós éramos muito a favor dos 90 dias (a derrotada proposta de manter suspeitos presos sem acusações por este período) e achamos que há muita correção política em relação aos direitos humanos", diz June.

"Depois que Carrie morreu, ficamos num vácuo, sem saber para onde nos virar, sem saber por que ela tinha que passar por isso."

"Quanto mais o tempo passa, mais eu quero subir em minha caixa de sabão e dizer às pessoas como me sinto."
 

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