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21/07/2006 - 04h47

Ivan Lessa: Calor

da BBC Brasil

De calor, eu entendo. Qualquer coisa entre os 28º e os 40º, estourando, estamos aí. Ou melhor, estive por aí.

Quando digo "aí" é Rio, aquele das musiquinhas de bossa nova e do péssimo filme Orfeu Negro, pois trata-se do único Rio que existe mesmo, para valer: esse que vem com o "insuportável mau cheiro da memória", como queria Drummond.

Minto. De vez em quando, na Net, pego fotografia antiga do Rio. Antiga quer dizer até 1960 e só vale em preto e branco ou tons de sépia, que essas são as verdadeiras cores das grandes dores que passaram (agora eu fui de Camões. Pode?) Mas eu estou torrando (esse o único verbo cabível) e não vou ao assunto de que ameacei falar: calor.

Esta semana teve "heatwave" no Reino Unido. Principalmente em Londres, que sofre dessa mania de não existir perto do mar para, na hora das "vagas de calor", não pegar uma brisinha marítima.

Segunda e terça, os termômetros acusaram – indiciaram, julgaram e condenaram à prisão perpétua, melhor dizendo – os 33º e os 34º, o que equivale, fácil, a 40º dos nossos em doce balanço a caminho do mar. No mar, em lá chegando, as coisas ficam mais fáceis e dá até mesmo para o mais recente imortal, o Nelson Pereira dos Santos, fazer filme em branco e preto intitulado Rio Quarenta Graus.

Fujo como posso da onda de calor que assolou Londres e a maior parte do Reino Unido. É a única maneira que consigo de me refrigerar. Ar condicionado, não tem. Quer dizer, a maioria das casas não tem. Ventilador tem. Meio ridículo ficar sentadão em casa diante de um ventilador, mas que remédio? O ventilador humilha o homem e não resolve nada. Um leque é mais digno.

No metrô, os alto falantes param por uns dias para avisar contra o perigo dos objetos ou embrulhos abandonados para nos recomendar viajar com uma garrafa de água, outra indignidade, quando levada na mão pela rua. No metrô e nos ônibus, a coisa bateu nos 47º e 52º. Teve gente desmaiando. Inglês desmaiado não pode ser mais sem graça.

Que fazer?

Todos os meios de comunicação nos dão conselhos. Uns jornais dizem que as loções e os cremes protegem. Outros juram que aumentam o perigo do câncer e do envelhecimento precoce. Unânimes apenas nas exclamações e no fato de que os muito jovens e os muito idosos precisam de tomar muito cuidado.

Palavra do Departamento de Meteorologia, conhecido pelo apelido carinhoso de Met. O Met nos avisa ainda que os raios ultravioletas poderão atingir os 7 ou 8. 7 ou 8 o quê? Nada fica claro com o calor a não ser o falado astro-rei. O Met colocou a onda de calor no nível 2 de sua escala de "perigo".

O dia mais quente de toda a história do Reino Unido foi em 10 de agosto de 2003, na cidade de Faversham, condado de Kent, quando deu 38,5º nos indicadores.

Quarta-feira, 19 de julho, quase ultrapassou. Bateu 36,5º em Wisley, condado de Sussex. Espera-se agora uma colher de chá. Que a vida se processe nas máximas de 26 ou 28º, que, se não me falha a memória, já eram fogo aqui em Londres, mas tirava-se de letra na Zona Sul carioca. De qualquer forma, julho e, prevê-se, agosto, constituirão recorde, para compensar o vexame da Copa do Mundo.

O Met deixa claro que o que está acontecendo aqui, e no continente europeu, de uns anos para cá, será a norma nos próximos anos. O efeito estufa é criação do homem e deverá continuar estufando progressivamente. O Met avisa que, por volta de 2040, um verão em cada dois verões deverá bater o verão de 2003.

Meu palpite, em vista dos últimos acontecimentos (atentar para as outras notícias nas primeiras páginas do jornais), é que não vai haver mais ninguém aqui para conferir. Só aquele calorão.
 

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