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29/04/2009 - 19h54

Entenda o que muda com os juros mais baixos no Brasil

FABRÍCIA PEIXOTO
da BBC Brasil

Os efeitos de uma redução de juros demoram a chegar na "ponta", ou seja, no crédito ao consumidor final. Mas em diversos outros aspectos da economia as mudanças já são sentidas. Segundo especialistas, bancos, empresas e governo são os primeiros a sentir a diferença e terão de se adaptar a uma economia com juros cada vez mais baixos.

"Não há qualquer tipo de dúvida sobre as vantagens que juros mais baixos têm sobre a economia como um todo. Mas o processo vai exigir adaptações e até mesmo uma mudança cultural", diz Carlos Alexandre Sá, professor de Finanças da Fundação Getúlio Vargas.

O processo a que Sá se refere é, de certa forma, parecido com o que o país viveu na década de 90. A economia brasileira havia se "acostumado" à inflação alta e, com a estabilização, empresas e pessoas físicas tiveram que se adaptar ao novo cenário.

Agora é a vez da adaptação aos juros baixos. O exemplo mais evidente está na queda de alguns rendimentos: quem se acostumou aos ganhos "fáceis" dos fundos atrelados à Selic já percebe a diferença.

O governo estuda, inclusive, reduzir a rentabilidade da poupança para acompanhar a queda nos ganhos oferecidos por esses fundos.

Os bancos, segundo os analistas, também terão de se adaptar. Com Selic mais baixa, os títulos do governo --investimento preferido das instituições financeiras-- deixam de ser tão interessantes.

"A tendência é de que os bancos passem a emprestar mais para pessoas e empresas", diz o professor Alcides Leite, da Trevisan Escola de Negócios.

Saiba que aspectos terão de mudar na economia com juros mais baixos:

INVESTIDORES: Existe uma parcela da população brasileira para quem os juros altos não são tão ruins assim. Quem investe em fundos atrelados à Selic sabe que taxas nas alturas significam um ganho extraordinário. E o melhor: garantido.

O mesmo vale para uma série de outras aplicações que, de certa forma, "seguem" a Selic, como alguns fundos de previdência privada.

Com a redução da taxa básica de juros, essas aplicações deixam de ser tão atraentes. Em função disso, os investidores que buscam rendimentos acima da média terão de aceitar também riscos maiores - como no caso da Bolsa de Valores.

"Ganhar dinheiro vai dar mais trabalho", diz o professor da Trevisan.

POUPADORES: Apesar de não estar ligado diretamente à Selic, o rendimento da caderneta de poupança também deverá passar por algumas mudanças.

O assunto está em estudo no Ministério da Fazenda. A explicação do governo é de que, com juros menores e a consequente queda nos ganhos oferecidos pelos fundos, a poupança precisa seguir o mesmo caminho.

Caso contrário, haverá uma migração em massa para a poupança, gerando um "desequilíbrio" no sistema financeiro. Se os juros caírem ainda mais, a poupança passa a ser mais atraente do que os fundos, já que esses precisam ainda descontar o imposto de renda.

O assunto é "politicamente delicado", na avaliação de Sá. "Vai ser complicado explicar à população brasileira por que o rendimento de sua poupança está sendo cortado", diz.

Segundo ele, manter o dinheiro nos fundos é "vital" para as finanças do governo, já que são esses fundos que compram títulos públicos e, assim, ajudam a financiar a dívida pública.

INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS: Ao contrário do que se imagina, os bancos têm muito a ganhar com a redução dos juros. Isso porque, com taxas menores, um maior número de pessoas tende a pegar dinheiro emprestado. Ou seja, os bancos passam a ganhar na quantidade de clientes.

Mas os bancos, na avaliação dos especialistas, são os que mais terão de se adaptar a uma economia de juros baixos.

Com uma Selic menor, os títulos do governo passam a render menos. E os bancos, principais compradores desses papéis, tendem também a procurar operações mais rentáveis.

"Em vez de emprestar dinheiro para o governo, os bancos vão preferir emprestar para empresas e pessoas físicas. A economia sai ganhando, pois aumenta o volume de dinheiro disponível para o crédito", diz o professor da FGV.

De acordo com Leite, essa é uma "anomalia" do sistema financeiro do país. 'Antes os bancos ganhavam com a inflação; agora, ganham com os títulos do governo. E a atividade principal de um banco deve ser o crédito, seja a empresas ou pessoas físicas', diz o professor da Trevisan.

Outro impacto é na receita relativa a administração dos fundos. De acordo com Sá, as instituições financeiras terão de diminuir o valor cobrado dos cotistas.

"Quando o ganho era de 15% ao ano, uma taxa de administração de 3% não era nada. Mas com um rendimento de 7%, a taxa de administração de 3% passa a ter um peso muito maior. Esse valor terá de cair", diz o economista.

EMPRESAS: Os balanços das empresas costumam mostrar dois tipos de resultado. Um deles é o operacional, ligado à atividade essencial da empresa, como por exemplo, as vendas.

Mas existe ainda o resultado não-operacional, referente aos ganhos (ou perdas) no sistema financeiro. Com isso, empresas que se acostumaram a ganhar dinheiro investindo em juros, terão de rever seus planos.

"Quanto mais baixos os juros, mais as empresas tendem a investir em seu próprio negócio. O resultado é ótimo para economia, pois significa mais investimento no setor produtivo", diz o professor da FGV.

Sá diz ainda que o "ideal" em uma economia é que o lucro gerado pela atividade fim da empresa seja maior do que os juros oferecidos pelos bancos. "Se não for assim, ninguém vai querer abrir uma empresa", diz.

Além disso, com juros menores, as empresas pagam menos pelos financiamentos junto aos bancos, o que diminui as dívidas e abre espaço para novos investimentos.

GOVERNO: O governo perde e ganha com a queda dos juros. Perde porque seus papéis deixam de ser tão atraentes; ganha porque, ao ter de pagar menos juros, sua dívida cai.

A estimativa de analistas é de que o ganho compensa. Estima-se que cada ponto percentual de redução da Selic (se mantida por um ano) significa uma economia de até US$ 15 bilhões na dívida pública.

"Com essa economia, o governo tem mais fôlego para fazer investimentos no país", diz Leite.

 

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