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16/10/2006 - 12h32

Ivan Lessa: Bafafás, sururus, etc

da BBC Brasil

Eu não gostaria de estar traduzindo nada do português para o inglês, espanhol ou francês, uma dessas línguas mais em voga, à exceção do mandarim, e ter que encontrar o equivalente para “embananamento” ou qualquer um de seus derivados, seja “bananosa” ou o transitivo direto pronominal “embananar-se”.

Em inglês, de estalo, em botaria “in a jam”, literalmente “numa geléia”. Guardaria um certo sabor doce e ficaria na parte de sobremesas do cardápio ou da lista de compras. Mas, vejam só! “geléia”, ainda mais “geral”, e eu ficaria, para não sair da problemática já citada, “embananado”.

Há um milhão, possivelmente mais, de palavras e expressões, que são só nossos e ninguém os tira de nós. Um ou outro mogno, tem malandro que consegue se safar carregando um nas costas pelas fronteiras. Agora “bafafá”, “serelepe” e “sururu” são de propriedade exclusiva nossa, além de dura extração.

O mesmo se dá com qualquer língua que se preze. Faça o país que a fale parte ou não do Conselho de Segurança das Nações Unidas ou do exclusivérrimo Clube Nuclear.

Dizem que o inglês, que o lugar-comum consagrou como “o idioma de Shakespeare”, é a língua mais rica do mundo e tem uma palavra para tudo, sendo inclusive a mais concisa.

Um livro recentemente publicado aqui no Reino Unido (“O significado de Tingo”, edições Penguin) contradiz com todos os Fs e Rs (que os ingleses verteriam para Ps e Qs, por sinal) a idéia mais do que recebida. Seu autor tem um nome à altura da dura missão a que se propôs: encontrar palavras que, de uma só botinada, dêem conta de um recado complexo: Adam Jacot de Boinod, um nome singular que os dicionários não registram a origem.

“Eu já vi esse cigerci antes”

Vamos alinhavar alguns exemplos eloquentes.

Areodjarekput, do inuit, a língua dos esquimós: é a troca de mulheres por alguns dias. Frisemos: alguns dias apenas.

Gagrom, da Índia: procurar alguma coisa debaixo d´água, nela batendo com os pés.

Giomalireached, do gaélico escocês: a mania de dar uma chegada à casa dos outros justamente na hora das refeições.

Gumusservi, do turco: é o luar brilhando nas águas.

Guree, do somali: se apertar em cima de um camelo para outra pessoa nele se acomodar.

Ichigo-ichie, do japonês: uma prática difícil, pois trata-se de aproveitar cada momento tentando torná-lo perfeito.

Ilunga, do dialeto tsishuba, falado no Congo: uma pessoa que esteja disposta a desculpar um desaforo ou abuso pela primeira vez, pela segunda vez, mas nunca, jamais, pela terceira vez.

Nakhur, do persa: um camelo, ou camela, que só dá leite depois de fazerem cócegas em seu nariz.

Pagezuar, do albanês: morrer antes de desfrutar da alegria ou de se casar ou de ver ao menos um filho ou filha se casar.

Razblyuto, do russo: o que se sente por pessoa que já foi mas não é mais amada

Torschlusspanik, do alemão: o medo que vem com o número cada vez menor de oportunidades à medida que se envelhece. Literalmente, pânico diante de um portão que se fecha, em geral aplicado às mulheres que passaram da idade de procriarem.

Ah, sim. “Gicerci” é aquele camarada que vende fígado e pulmões na Turquia. Não fica claro no livro em questão se de gente ou de bicho. Há que se conferir na obra do escritor turco Orhan Pamuk, recentemente contemplado com o Nobel de literatura. “Gumusservi” (a tal do luar) parece que ele emprega umas duas ou três vezes.

Ah, sim, número dois. “Tingo”, na ilha da Páscoa, quer dizer levar embora tudo da casa de um amigo mediante o expediente de ir pedindo emprestado uma coisa de cada vez.
 

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