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13/11/2006
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06h52
Felizmente eu já não tinha mais colégio a frequentar quando tiraram o latim de nosso currículo.
Indignei-me, esbravejei, rolei no chão, babei de raiva, passei em suma todo meu limitado repertório cada vez que brigo com o Brasil.
Vezes que não são poucas. Cada um conduz seu torrão natal como pode. Como se fosse um carrinho puxado por bode ou trenó.
Queria agora saber, perguntei dramático, quando é que iam tirar a prova escrita, a redação, do currículo, ou seja, o ensino do próprio e mal tratado português, ao qual eu também tenho o direito de estar aqui, como estou, nele dando meus tapas e pontapés.
Meus argumentos, os de sempre, e principalmente os dos péssimos alunos de latim: “Mas como é que pode? Se somos uma língua neolatina, se no latim estão as sementes frondosas desta última flor do Lácio, inculta e bela? Aliás cada vez mais inculta e menos bela.”
“Semente frondosa” eu encaixava no papo para ver se pegava um bobo. Só uma vez, numa tarde fria e chuvosa, aqui em Londres mesmo, num pub aqui perto da BBC, uma moça a quem eu queria impressionar, pegou o disparate e voltou a bebericar, sobranceira, seu drinque com chapéuzinho roxo enquanto eu prosseguia perorando.
Altris tempus altris modus
O latim, no entanto, reagiu a tudo e, hoje, nestes cibernéticos tempos, pode até ser encontrado no – vejam vocês – Google. Juro. Tentem vocês aí. Adentrem o site, ou “situs” esse, procurem nas línguas e lá, como quem dá de cara com um fantasma ou zumbi, na madrugada, entre névoa, morcegos e uivos de lobos, e lá, dizia eu, dará de cara com esse nosso velho antepassado, o Latim, arrastando suas correntes e uivando: uuuuu!.
Latim que agora, em memória de tudo que fomos um para o outro, boto – e até coloco, como querem os mais pudicos – em letras maiúsculas.
Google latina, diz a diagramação tão nossa conhecida e quebradora de galhos. Em cima da janelinha para a busca (“Explorare Googles ope” diz lá), as inscrições “Tela, Imagines, Circuli e Índex”. Acho que não preciso traduzir nenhuma delas, mesmo para quem não teve professor de Latim chamado Porciúncula ou Galba no ginasial.
Em baixo, “omnia de Google” e “Ite in Google”. Além de uma exclamativa “Google protocollum tuum facias!”.
Que não é, mas não é mesmo, “O protocolo da Google é a tua cara!” Senão ficava parecendo aquelas brincadeiras que nós, os que aprendemos (ou nada pescamos) com o Latim dos saudosos.
Porciúncula e Galba, fazíamos nas horas vagas, que eram tantas, quando um dos dois não aparecia devido a problemas de próstata (sabíamos de tudo naquele colégio), e que tinham, por exemplo, “Caprina pestilenta” (“Cabra da peste”), “Caprina sine puditia” (Cabra sem-vergonha) e, só os mais eruditos, “Simius antiquus intra cumbuca manus non metet” (“Macaco velho não mete a mão em cumbuca”).
Foi bom enquanto durou. Pouquíssimos de nós levamos pau (“pausorum levamus”), já que eles, nossos mestres, sabiam que éramos uns débeis mentais e que nem mesmo o pouco aprendido daria para o gasto dos que ambicionavam como carreira a advocacia ou a medicina.
Rex pedrum perdurum
“Nunc hic aut nunquam” está lá no “sitius” Googlorum. “It´s Now or Never”, grande sucesso de Elvis Presley.
Mas o Googlorum não dá toda a verdade. A música foi primeiro sucesso com o “crooner” Tony Martin, alguns anos antes do Rei.
Afirmo isso sem o auxílio de engenho ou mecanismo de busca. “It´s Now or Never” é uma versão americana para “O Sole Mio”, canção napolitana datada de 1888, com música de Eduardo di Capua e letra de Giovanni Capurro. Essas coisas são comigo e só metade dos dados eu tive que – chato admitir – googlar.
Sempre fui melhor de comprar disco e ouvir rádio do que prestar atenção em aula de latim.
Finis coronat opus.
Non perdorum latinus
da BBC BrasilFelizmente eu já não tinha mais colégio a frequentar quando tiraram o latim de nosso currículo.
Indignei-me, esbravejei, rolei no chão, babei de raiva, passei em suma todo meu limitado repertório cada vez que brigo com o Brasil.
Vezes que não são poucas. Cada um conduz seu torrão natal como pode. Como se fosse um carrinho puxado por bode ou trenó.
Queria agora saber, perguntei dramático, quando é que iam tirar a prova escrita, a redação, do currículo, ou seja, o ensino do próprio e mal tratado português, ao qual eu também tenho o direito de estar aqui, como estou, nele dando meus tapas e pontapés.
Meus argumentos, os de sempre, e principalmente os dos péssimos alunos de latim: “Mas como é que pode? Se somos uma língua neolatina, se no latim estão as sementes frondosas desta última flor do Lácio, inculta e bela? Aliás cada vez mais inculta e menos bela.”
“Semente frondosa” eu encaixava no papo para ver se pegava um bobo. Só uma vez, numa tarde fria e chuvosa, aqui em Londres mesmo, num pub aqui perto da BBC, uma moça a quem eu queria impressionar, pegou o disparate e voltou a bebericar, sobranceira, seu drinque com chapéuzinho roxo enquanto eu prosseguia perorando.
Altris tempus altris modus
O latim, no entanto, reagiu a tudo e, hoje, nestes cibernéticos tempos, pode até ser encontrado no – vejam vocês – Google. Juro. Tentem vocês aí. Adentrem o site, ou “situs” esse, procurem nas línguas e lá, como quem dá de cara com um fantasma ou zumbi, na madrugada, entre névoa, morcegos e uivos de lobos, e lá, dizia eu, dará de cara com esse nosso velho antepassado, o Latim, arrastando suas correntes e uivando: uuuuu!.
Latim que agora, em memória de tudo que fomos um para o outro, boto – e até coloco, como querem os mais pudicos – em letras maiúsculas.
Google latina, diz a diagramação tão nossa conhecida e quebradora de galhos. Em cima da janelinha para a busca (“Explorare Googles ope” diz lá), as inscrições “Tela, Imagines, Circuli e Índex”. Acho que não preciso traduzir nenhuma delas, mesmo para quem não teve professor de Latim chamado Porciúncula ou Galba no ginasial.
Em baixo, “omnia de Google” e “Ite in Google”. Além de uma exclamativa “Google protocollum tuum facias!”.
Que não é, mas não é mesmo, “O protocolo da Google é a tua cara!” Senão ficava parecendo aquelas brincadeiras que nós, os que aprendemos (ou nada pescamos) com o Latim dos saudosos.
Porciúncula e Galba, fazíamos nas horas vagas, que eram tantas, quando um dos dois não aparecia devido a problemas de próstata (sabíamos de tudo naquele colégio), e que tinham, por exemplo, “Caprina pestilenta” (“Cabra da peste”), “Caprina sine puditia” (Cabra sem-vergonha) e, só os mais eruditos, “Simius antiquus intra cumbuca manus non metet” (“Macaco velho não mete a mão em cumbuca”).
Foi bom enquanto durou. Pouquíssimos de nós levamos pau (“pausorum levamus”), já que eles, nossos mestres, sabiam que éramos uns débeis mentais e que nem mesmo o pouco aprendido daria para o gasto dos que ambicionavam como carreira a advocacia ou a medicina.
Rex pedrum perdurum
“Nunc hic aut nunquam” está lá no “sitius” Googlorum. “It´s Now or Never”, grande sucesso de Elvis Presley.
Mas o Googlorum não dá toda a verdade. A música foi primeiro sucesso com o “crooner” Tony Martin, alguns anos antes do Rei.
Afirmo isso sem o auxílio de engenho ou mecanismo de busca. “It´s Now or Never” é uma versão americana para “O Sole Mio”, canção napolitana datada de 1888, com música de Eduardo di Capua e letra de Giovanni Capurro. Essas coisas são comigo e só metade dos dados eu tive que – chato admitir – googlar.
Sempre fui melhor de comprar disco e ouvir rádio do que prestar atenção em aula de latim.
Finis coronat opus.
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