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14/03/2007 - 13h33

Análise: Bush chegou com pouco e parte sem muito da América Latina

CAIO BLINDER
da BBC Brasil , em Nova York

Em São Paulo, ele tocou ganzá com meninos pobres; na Guatemala, misturou-se com "campesinos" e no México, visitou ruínas maias.

George W. Bush é um presidente avesso a estes ossos do ofício do turismo diplomático. O seu esforço durante a longa viagem de sete dias pela América Latina, encerrada nesta quarta-feira, mostra como finalmente o governo americano está antenado na paisagem da sua natural, porém negligenciada, área de influência.

Além da expressão corporal, Bush cantou as virtudes da justiça social, enquanto no passado se limitava à ladainha do livre-comércio e democracia.

A mudança de discurso e a nova ginga, como lembrou reportagem do jornal The New York Times, "refletem uma tentativa urgente de neutralizar a crescente influência regional de líderes populistas como o presidente da Venezuela, Hugo Chávez".

"Fora do quintal"

Na sua viagem, porém, Bush não quis pisar diretamente no quintal de Chávez, passando ao largo de países como Bolívia, Equador e Nicarágua. Ele escolheu cinco países, que mantêm relações com os EUA que vão de cordiais a calorosas.

Mesmo assim as visitas a Brasil, Uruguai, Colômbia, Guatemala e México foram marcadas por protestos e competiram com périplo paralelo que Hugo Chávez realizou pelo hemisfério.

Apesar do esforço de Bush, a avaliação da viagem correspondeu ao que se antecipara. Ele chegou tarde e com pouco a oferecer.

Nos encontros bilaterais, o presidente americano foi obviamente correto na escolha da agenda. Mas, novamente, nada de resultados substantivos.

No encontro com o presidente Lula em São Paulo não faltaram adjetivos para saudar a parceria estratégica EUA-Brasil em biocombustíveis, mas não houve concessões de Bush na questão da remoção das tarifas sobre o etanol exportado pelos brasileiros. É o combustível político do lobby agrícola nos EUA.

Com o presidente colombiano Álvaro Uribe - seu mais vigoroso aliado entre os países visitados - Bush reafirmou o apoio ao plano Colômbia de combate ao tráfico de drogas e guerrilha de esquerda, mas no Congresso, em Washington, existem dúvidas sobre a efetividade deste projeto e resistência à ratificação do acordo bilateral de livre comércio.

Sempre o Congresso. No México, Bush enfatizou seu empenho para que haja uma reforma abrangente das leis de imigração, mas o presidente americano carece de capital político para uma obra de mudanças, como formalizar um programa para trabalhadores temporários ou regularização da situação de milhões de imigrantes ilegais nos EUA.

Obra à vista é a cerca na fronteira, que o presidente mexicano Felipe Calderón compara a um novo muro de Berlim.

Isca

Na viagem, Bush não mordeu a isca e não travou um duelo retórico direto com Hugo Chávez.
Com mais sutileza, ele espera que líderes como Lula e Calderón se tornem porta-estandartes do bloco anti-Chávez.
Mas os passos dos principais dirigentes latino-americanos são mais sinuosos. Mesmo Calderón, que não esconde sua aversão a Chávez (o sentimento, evidentemente, é mútuo) não irá se submeter ao papel de instrumento americano no hemisfério.

Como avalia Michael Shifter, do centro de estudos Inter-American Dialogue, em Washington, "a maioria dos governos latino-americanos são pragmáticos e estão dispostos a trabalhar tanto com Bush como com Chávez e tirar proveito das oportunidades".

Existe também um outro cálculo. O presidente da Venezuela pode ficar no cenário por um bom tempo. Bush não só ficará apenas até janeiro de 2009, como tem um papel cada vez menos relevante.

"Cadáver"

Com sua estridência habitual, Chávez disse em um comício em Buenos Aires na sexta-feira passada que Bush é um "cadáver político".

Em termos igualmente mórbidos, George Grayson, um acadêmico americano, especialista em México do College of William & Mary, observa que Bush não é um "pato manco", termo que no jargão político se refere a políticos com o poder diminuído porque o cargo está chegando ao fim.

Para Grayson, Bush já é um "pato morto". Sem dúvida, é um exagero retórico e político.
De qualquer forma, vivo ou morto, Bush está de volta a Washington, onde existe uma caçada implacável ao pato presidencial, em um emaranhado de crises que vão do Iraque ao escândalo da demissão de procuradores públicos federais por instigação da Casa Branca.

A esta altura, Bush gostaria mais de estar tocando ganzá com os meninos de São Paulo. O barulho do chocalho em casa é insuportável para ele.
 

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