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Centralização do poder do Estado ameaça democracia russa, dizem analistas
PABLO UCHOA
da BBC Brasil, em Londres
Em uma reunião na capital da Eslováquia, Bratislava, em fevereiro de 2005, o então presidente dos EUA, George W. Bush, comunicou a seu colega Vladimir Putin que temia pelo estado da democracia na Rússia.
Bush se referia a preocupações com assuntos como a cooperação nuclear da Rússia com o Irã, e com o que Washington considerava excessos na interferência do Estado na vida dos cidadãos russos.
Bush ouviu de Putin como resposta que não era possível comparar democracias em países diferentes. Em seguida, o presidente russo cunhou uma frase que passou para a História: "A democracia deve ser adaptada às condições russas, levando em conta nossa história e nossas tradições".
Considerada emblemática por analistas, a frase de Putin fomentou ainda mais o debate em torno da natureza --e até da legitimidade-- da democracia na Rússia.
Apesar de manter um sistema de voto universal e direto, o regime russo vive sob a pressão de críticos que o acusam de ter minado a transparência política e legal de seus processos, e de tentar sufocar o funcionamento da mídia independente, de partidos políticos e agências não-governamentais.
O governo Putin chegou ao fim há dois anos, mas, como ele permanece no poder, como primeiro-ministro, e como seu sucessor, o presidente Dmitry Medvedev, respeita e leva à frente seu legado, a pergunta permanece: a Russia vive hoje em um regime democrático ou autocrático?
"O sistema político russo atual é como um pêndulo que oscila entre o autoritarismo e a debilidade", afirma o pesquisador Nikolay Petrov, professor do centro de estudos Carnegie Center, de Moscou.
Depois de Yeltsin
O sistema totalitário que terminou com o colapso da União Soviética, em 1991, foi substituído por um poder central débil na Rússia. Sob a Presidência de Bóris Yeltsin (1991 a 1999), o país sofreu com a separação de antigas repúblicas soviéticas no Báltico, no Cáucaso, na Ásia Central e na Europa do Leste.
Yeltsin renunciou ao poder no apagar das luzes de 1999 e fez do então premiê russo Vladimir Putin presidente interino. Assim que chegou ao poder, Putin passou a adotar medidas para retomar o poder central do Estado.
"Visto contra o pano de fundo de um Yeltsin passivo e impopular, Putin era uma espécie de salvador que havia chegado para liderar a Rússia de forma decisiva", diz o professor Petrov.
No entanto, afirma Petrov, Putin não só centralizou novamente o poder do Estado como empurrou demais o "pêndulo democrático" para o lado do autoritarismo.
Desde 2005, por exemplo, os governadores russos são apontados pelo governo central. Além disso, críticos afirmam que as ofensivas do Kremlin contra grupos separatistas, principalmente na ex-república soviética da Tchetchênia, têm servido de pretexto para ataques contra a liberdade de expressão e pensamento.
No plano político, embora o país seja hoje uma democracia multipartidária, o partido de Putin, Rússia Unida, domina a cena sem adversários.
"Infelizmente, Putin não parou por volta de 2003, quando cruzou a linha do equilíbrio", afirma Petrov. "Na prática, é um Estado autoritário que não permite que as regiões tomem parte nas decisões em nível central", diz.
Além de ser criticado pelo controle que exerce sob instituições políticas do país, o governo Putin é acusado por muitos no Ocidente de avançar sobre as liberdades dos cidadãos.
A organização Repórteres Sem Fronteiras, por exemplo, se refere tanto a Putin quanto ao atual ocupante do Kremlin, Dmitri Medvedev, como "predadores" da liberdade no país. Os dois principais canais de TV russos são diretamente controlados pelo governo e, o terceiro, pela gigante estatal de energia, a Gazprom.
O fator econômico
Analistas concordam ao afirmar que a prosperidade econômica que marcou o governo Putin facilitou a centralização do poder. Durante seu governo, commodities russas, em especial do gás, aumentaram vertiginosamente de valor. Outro produto de exportação, o petróleo, que custava US$ 20 o barril em 2000, chegou a quase US$ 150 em julho de 2008.
Apesar de muitos afirmarem que o aumento na qualidade de vida de extratos da sociedade russa ter ajudado o governo a cometer excessos, para a maioria dos analistas a democracia russa precisa ser consolidada para que o país tenha um futuro livre de pressões externas ou conflitos internos.
Para o cientista político Konstantin Eggert, do Centro de Pesquisas Políticas (Pir-Center), será "inevitável" um novo processo de abertura, modernização ou transição no país.
"As tentativas de governar a Rússia de forma autoritária terminaram em fracasso, primeiro com os czares e depois com os comunistas. Se a história nos ensina algo, é que é necessária uma dose saudável de descentralização", acredita Eggert.
Eggert ressalta, entretanto, que o controle exercido pelo Estado durante a era soviética é diferente do atual.
"Na Rússia de hoje, a vida privada dos cidadãos ainda é respeitada, o que não acontecia nos anos da URSS", diz o analista. "E canais que têm influência sobre a opinião pública, como internet, rádio e jornais, ainda apresentam uma variedade considerável de opiniões", aponta.
O analista diz acreditar que a Rússia está entrando em uma nova fase, em que a nova geração quer uma parcela de poder político e econômico. Segundo eles, isso pode forçar o governo a promover mudanças.
"Há diversos cenários para o futuro. Alguns pedem a saída de Putin, mas outros acreditam que ele mudará sua imagem e se transformará na principal força modernizadora", diz Eggert.
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