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26/04/2001 - 03h33

FHC evita agir contra "depuração" da base

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JOSIAS DE SOUZA, da Folha de S.Paulo, em Brasília

Há dois dias, um auxiliar de Fernando Henrique Cardoso, sabendo-o dono de temperamento acomodatício, pediu-lhe que acudisse o senador José Roberto Arruda. E o presidente: "Não tem jeito. Há um processo de depuração em curso. Quem tentar abortar será tragado junto. Não vou perseguir ninguém, mas também não seguro nada".

Agora, é cada um por si, eis a mensagem embutida nas palavras de FHC. Referia-se à atmosfera de guerra civil em que se vêem envoltos, no Senado, os sócios majoritários do consórcio governista: o PFL de ACM, o PSDB de José Roberto Arruda e o PMDB de Jader Barbalho.

Outro frequentador do Palácio da Alvorada realçou um detalhe: a troca de tiros desenrola-se perigosamente no quintal do governismo. E pronunciou, em tom grave, um vocábulo caro ao presidente: governabilidade. A resposta de FHC veio em forma de interrogação: "E por acaso é possível governar desse jeito?"

Um terceiro conselheiro de FHC mencionou a hipótese, cada vez menos improvável, de que a oposição obtenha assinaturas em quantidade suficiente para abrir a CPI da corrupção. Algo que eletrificaria ainda mais a cena política. "Pois que venha," atalhou o presidente. "E que comece pela Sudam." Impossível deixar de enxergar uma alusão indireta a Jader Barbalho, que ameaça aderir à CPI sempre que as investigações do Ministério Público e da Polícia Federal se aproximam dele ou de Márcia Centeno, sua mulher.

Nos últimos três dias, a Folha contatou pessoas que, em telefonemas, reuniões e diálogos privados partilharam inquietações com FHC. As expressões aqui reproduzidas entre aspas foram extraídas da memória desses interlocutores do presidente.

O processo de higienização - ou de "depuração", como prefere FHC-, transformou-se numa espécie de novela de grande audiência na capital.
Hoje, a TV Senado transmitirá um dos capítulos mais ansiados desde a confissão lacrimosa que aproximou José Roberto Arruda do cadafalso.

O protagonista de hoje será Antonio Carlos Magalhães. Ele surgirá diante das câmeras em posição que, acredita FHC, conquistou sozinho, à custa da má gestão dos próprios rancores. Não teria chegado a tanto, diz o presidente, se Luís Eduardo Magalhães fosse vivo. O filho o teria contido. Era o único capaz de fazê-lo.

Ao sentar no banco de réus do Conselho de Ética do Senado, ACM passará por constrangimento inimaginável para alguém que, até o final do ano passado, posava de primeiro-ministro informal da república tucana.
Alguém com força bastante para desafiar a liderança de FHC, usurpando-lhe a autoridade presidencial.

Na opinião do presidente, ao engalfinhar-se com Jader Barbalho, ACM abalou colunas que, suspeitava-se desde o início, desabariam também sobre sua cabeça.

Não há, na avaliação de FHC, talento verbal capaz de roubar de ACM o papel de vilão no enredo da profanação do painel de votos do Senado. Seu mandato, como o de Arruda, estaria por um fio.

Ontem, FHC mantinha um olho no Senado -registrou-se um entra-e-sai de políticos no Alvorada- e outro na curva do dólar -trocou telefonemas com o ministro Pedro Malan (Fazenda) e com o presidente do Banco Central, Armínio Fraga.

O presidente acha que a quadra atual não faz justiça ao desempenho de seu governo. Com a economia "nos trilhos", esperava um segundo mandato róseo. Sonhava engatar um ciclo de crescimento econômico que, por si só, tornaria viável uma candidatura presidencial governista em 2002 - qualquer candidatura.

Sobrevieram, porém, a crise na Argentina, a desaceleração da economia dos EUA e o desassossego na política interna, agravado com a troca de desaforos entre ACM e Jader. Chamaram-se mutuamente de "ladrão".

Munido de pesquisas de opinião, FHC tenta desfazer dois tipos de percepção, presentes em todas as sondagens: (1) a sensação de que há corrupção no governo e (2) a impressão de que ele não estaria oferecendo o devido combate às malfeitorias.

Daí o receio de FHC de ver sua imagem associada a movimentos corporativos que visem preservar cabeças no Congresso ou deter a CPI da corrupção. "Não haverá operação abafa," diz.

Nas últimas 48 horas, repetiu a líderes governistas no Congresso que abomina a idéia de instalação de uma CPI. Afirma, em contrapartida, que, dessa vez, não se ouvirá nos corredores do Legislativo o tradicional tilintar de verbas e cargos. A súbita aparição de assinaturas de deputados governistas no requerimento que cria a CPI é um teste à resistência da palavra presidencial.

FHC aplaudiu a articulação que resultou na saída relâmpago de Arruda do PSDB. Acha que o caso pedia mesmo resposta rápida. Além disso, sente-se traído pelo ex-líder. "Ele mentiu até para mim".

FHC acha que a crise ganhou uma "dinâmica institucional". Não esmiuçou a expressão. Interpretando-a, o interlocutor imaginou que o chefe tenha desejado dizer que, no estágio em que as coisas se encontram, seria tolo e inútil tentar interferir.
 

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