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29/04/2001 - 11h16

Aos 73 anos, maior cacique da Bahia luta para driblar ruína

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ELIANE CANTANHÊDE
diretora da sucursal de Brasília

Há pelo menos duas décadas considerado um dos homens mais poderosos da República, Antonio Carlos Magalhães está morrendo pela boca. Em quase meio século de política, colecionou inimigos, acusações e grandes momentos, mas o que começou a ameaçar seu destino e sua carreira, aos 73 anos, foi uma pequena frase: "Eu tenho a lista".

Mero descuido ou mais um gesto de soberba, a frase funcionou como confissão de um crime. O painel de votação fora violado durante sua gestão na presidência do Senado, e ele conhecia os votos secretos dos colegas.

Foi assim, numa conversa com três procuradores, que ACM jogou toda sua carreira, tão invejada. Um deles, o polêmico Luiz Francisco, não só gravou a conversa como entregou a fita à "IstoÉ". Daí à investigação, à comprovação técnica e aos depoimentos reveladores foi um pulo.

De acusador feroz contra o seu sucessor na presidência do Senado, Jader Barbalho (PMDB-PA), ACM passou a acusado de uma grave "falta de decoro parlamentar", suficiente para gerar processo de cassação. Jader está envolvido em denúncias que não param de surgir, ora na Sudam, ora no Banpará, ora contra sua mulher, Márcia Centeno.

Diferentemente, ACM acabou caindo numa situação quase prosaica, mas de profundo caráter ético e moral. E o resultado está sendo o mesmo. A guerra entre os dois começou quando se chamaram mutuamente de "ladrões" no plenário do Senado e evoluiu para investigações. ACM e Jader estão gravemente feridos. Correm risco de vida político.

Grandes gestos

A carreira de ACM é feita de grandes momentos, grandes gestos e grandes personagens. Seus principais trunfos são: o controle da Bahia, a ousadia pessoal e a capacidade de reverberação na imprensa nacional. Mais da metade de sua carreira, porém, foi no Executivo, não no Legislativo.

Seu filho Luís Eduardo, o herdeiro político morto aos 42 anos em abril de 98, costumava dizer que o risco do pai seria tentar fazer política em Brasília como sempre fez na Bahia. Ou seja: mandando em tudo e todos. Acertou.

ACM foi eleito deputado estadual pela antiga UDN em 1954 e deputado federal em 1958 e 1962. No regime militar, filiou-se à Arena, foi prefeito nomeado de Salvador e depois governador da Bahia, cargo que ocupou três vezes. Foi presidente da Eletrobrás e ministro das Comunicações.

Só em 1995 voltou triunfalmente ao Congresso como senador, 24 anos depois de ter saído para o primeiro mandato ao governo da Bahia. Voltou com três prioridades: assumir a presidência do Senado, fazer a CPI do Judiciário e desenhar a candidatura presidencial de Luís Eduardo. Venceu nos dois primeiros.

A partir de então, a trajetória de ACM, sempre frio, calculista, vitorioso, passou a ser errática e até curiosa. Incluindo derrotas.

Velho cacique udenista, forjado na íntima convivência com o poder, ACM assumiu bandeiras sociais, arrogou-se a condição de arauto da moralidade e rompeu com FHC, o PMDB de Jader e parte do Congresso. E passou a se ressentir com defecções na sua base mais sólida, a Bahia.

O PFL da Bahia, sinônimo de PFL do ACM, tem na atual legislatura os três senadores (o próprio ACM, Paulo Souto e Waldeck Ornélas) e 21 dos 41 deputados federais. Nenhum outro político tem tanto cacife individual.

Esse cacife, porém, começou a sentir os efeitos do declínio de ACM e de seu rompimento com o governo. O PFL baiano perdeu os ministérios de Minas e Energia e da Previdência e abriu a temporada de disputas internas.

O símbolo da debandada foi a ida do pefelista Benito Gama para o PMDB, justamente quando ACM e Jader trocavam desaforos públicos às vésperas da eleição para a presidência do Senado. Benito tem boa simbologia nacional: foi o presidente da CPI que gerou a queda do presidente Fernando Collor, com quem o "chefe" ACM se aliou até o fim.

O isolamento

A crise aberta no Senado pela disputa ACM-Jader fez uma vítima na Câmara: o PFL, que ficou isolado e perdeu a vaga de presidente para o PSDB. A derrota foi debitada a ACM, que perdeu prestígio no partido e a paciência do comando formal pefelista, representado pelo presidente, senador Jorge Bornhausen (SC).

De derrota em derrota, ACM acabou sofrendo mais uma, da qual se queixou amargamente para o governador do Ceará, Tasso Jereissati, seu candidato à Presidência. Foi a escolha dos líderes na Câmara. Os líderes dos três principais partidos, fora o PFL, são baianos e adversários viscerais de ACM: Jutahy Junior (PSDB), Geddel Vieira Lima (PMDB) e Walter Pinheiro (PT).

Isolado no Senado, acossado na Câmara, figura não grata ao governo, indisposto no PFL nacional, ACM chega numa hora difícil ao maior embate de sua carreira: o provável processo de cassação de seu mandato.

Na terça-feira passada, dia seguinte ao depoimento do senador José Roberto Arruda (ex-PSDB-DF) que incriminou definitivamente ACM na violação do painel, o "Correio da Bahia", jornal controlado pela família Magalhães, trazia uma curiosa reportagem na primeira página.

Título: "ACM chega a 74% e venceria [a eleição para o governo do Estado" no 1º turno". É como um "aviso aos navegantes" ou um recado geral de que ACM não está morto politicamente.

Numa rápida conversa com a Folha, publicada ontem, ele disse que, de zero a dez, tinha dez de chance de manter o mandato. Não é isso, entretanto, que admitem cada vez mais publicamente os senadores. É nas mãos deles, e nas da opinião pública, que o destino do poderoso ACM está.
 

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