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25/01/2002 - 07h41

Alckmin divide responsabilidade com FHC

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ELIANE CANTANHÊDE
da Folha de S.Paulo

Pressionado pela onda de violência e por ameaças que atingem expressivos líderes do PT em ano eleitoral, o governador Geraldo Alckmin (SP), 49, divide a responsabilidade com o governo federal, também tucano: "Precisamos agir na questão social. Senão a polícia vai ficar enxugando gelo".

Questionado se, além da polícia, os governos estaduais também não vão ficar enxugando gelo com a política econômica recessiva federal, respondeu de pronto: "Perfeitamente".

Em entrevista à Folha, dada na quarta à noite, no Palácio dos Bandeirantes, Alckmin citou o papa Paulo 6º, que, em 1967, já dizia que, sem desenvolvimento, não há paz. Virtual candidato à reeleição em outubro, ele concorda plenamente com a tese. A seguir, os principais trechos.

Folha - Com mais de 600 prefeituras em São Paulo, só dois prefeitos foram assassinados -e ambos são do PT. Pura coincidência ou há uma onda de violência contra o partido?
Geraldo Alckmin -
Precisamos trabalhar em todas as direções, inclusive na de crime político, mas essa não é a mais provável. Há várias hipóteses, até mesmo de sequestro dirigido ou de ocasional.

Folha - De zero a dez, qual o grau de credibilidade que o sr. atribui à Farb (Frente de Ação Revolucionária Brasileira)?
Alckmin -
Louco há no mundo inteiro. Quem lê a carta da Farb vê logo que é coisa de louco. Mas, como ocorreram outras ameaças, além da carta e do site na internet, é preciso investigar, apurar.

Folha - Mesmo que não seja comprovada a hipótese de crime político, o estrago político nos tucanos está feito. Na sua opinião, qual o efeito pró-PT e o anti-PSDB?
Alckmin -
A minha preocupação é com o governo, com a segurança das pessoas, com a responsabilidade que temos diante de tudo isso. Tenho convicção de que o caso será resolvido. A questão política é secundária.

Folha - Mas o governo do sr. e o de Mário Covas (morto em 2001) não falharam justamente nessa responsabilidade? Não perderam a guerra para a violência?
Alckmin -
Esse é realmente o maior desafio.

Folha - Covas falava exatamente isso desde o início, na primeira entrevista, na segunda, na terceira... E nada mudou.
Alckmin -
Nós tivemos avanços. De 1993 a 1999, quase todos os índices de criminalidade cresceram numa média de 9% ao ano. De 2000 para cá, especialmente no ano passado, parou de crescer -e até começou a cair. Homicídio doloso caiu 1,5%, roubo de automóvel, 15%, furto de automóvel, 6%, latrocínio, mais de 10% nos últimos dois anos.

Folha - E como o sr. explica que justamente o sequestro, um crime tão espetacular, tenha crescido 300% num ano?
Alckmin -
Essa é a grande preocupação, porque há uma migração da atividade criminosa. Quem assaltava banco e caixa eletrônico e roubava automóvel passou para o sequestro.

Folha - Por que é mais fácil, mais seguro, para o criminoso?
Alckmin -
Não é isso. É que, no caso de um banco, por exemplo, ele está parado ali, tem guarda, tem cofre, tem alarme, tem proteção. As pessoas andando na rua estão muito mais vulneráveis. O que você pode fazer, e estamos fazendo, é prender e desbaratar as quadrilhas. É importante destacar o trabalho da polícia, porque, se dizemos a todo instante que a polícia está perdendo a guerra, a auto-estima da polícia vai lá embaixo, e ela é uma instituição que precisa ser preservada.

Folha - O que as pessoas dizem não é só que a polícia está perdendo a guerra, mas que o seu governo também.
Alckmin -
Meu governo trabalha com a polícia, e a polícia do meu governo está trabalhando. Estamos com 260 sequestradores presos no Estado, e 18 foram mortos. Criamos a Divisão Anti-Sequestro, cinco delegacias anti-sequestro, foi instalado o Infocrim [sistema informatizado de mapeamento de crimes". O que é preciso fazer mais? Primeiro, é pôr mais polícia na rua. Estamos contratando 4.000 guardas de muralha, ou agentes de vigilância, e trazendo 6.000 jovens para o serviço auxiliar voluntário, previsto por lei federal. Eles vão fazer o trabalho administrativo para liberar 6.000 policiais militares. Vamos criar uma quarta companhia da Rota e botar mais de mil motocicletas para os policiais aqui em São Paulo fugirem do congestionamento.
A segunda tarefa é investir mais em inteligência. Só temos aqui na capital, mas estamos ampliando para a Grande São Paulo e depois para a região de Campinas. E vamos tirar presos de cadeia, onde há maior facilidade de fuga, para colocar em penitenciárias. Vamos construir mais três em convênio com o governo federal.

Folha - Além da migração dos outros crimes para sequestro, houve também migração dos sequestros do Rio para São Paulo? O governador Anthony Garotinho (RJ) tem razão quando diz que lá ficou difícil sequestrar e aqui ficou fácil?
Alckmin -
Não vou entrar em brigas estaduais, políticas.

Folha - Independentemente da provocação política, ele se referiu a um fato. No Rio, os sequestros diminuíram. Em São Paulo, aumentaram drasticamente.
Alckmin -
Será que a segurança pública no Rio está uma beleza? Será que os morros estão uma maravilha? Mas a minha preocupação é com São Paulo. É a segunda maior metrópole do mundo, com 17,5 milhões de pessoas em 8.000 km2, com bolsões de miséria para todo lado. Isto aqui não é uma avenida na beira da praia.

Folha - A origem da onda de criminalidade não é justamente por causa dessa miséria?
Alckmin -
É por isso que, além de toda a ação no campo policial, quero destacar bastante o seguinte: nós precisamos agir na questão social. Senão a polícia vai ficar enxugando gelo.

Folha - O sr. está, portanto, pagando o pato também pela política econômica e pela recessão dos últimos anos no país?
Alckmin -
Eu acho... Você tem... O Brasil melhorou nos últimos anos sob o ponto de vista de emprego, de educação, de saúde. Quando coloco as questões sociais, estou me referindo a uma ação integrada. Se você for a um bairro aqui de São Paulo, não há uma quadrinha de vôlei, de basquete, de futebol de salão. Você não tem lazer. Isso é tarefa do município, mas as 21 secretarias do Estado vão trabalhar integradas com a segurança pública, desde abrir escola em fim de semana até frentes de trabalho, especialmente nas áreas de maior risco.

Folha - Por que isso não foi feito sete anos atrás, no início do governo Covas?
Alckmin -
O Estado vem fazendo, o esforço já existe, mas ele vai ocorrer com mais intensidade.

Folha - Além da polícia, os governos estaduais também não vão ficar enxugando gelo se não houver uma política econômica menos recessiva, mais voltada para o desenvolvimento e para o emprego?
Alckmin -
Perfeitamente. O papa Paulo 6º dizia que o desenvolvimento é o novo nome da paz. Você só tem uma paz verdadeira com oportunidade para todos. O objetivo é o desenvolvimento.

Folha - É uma crítica a FHC, ao ministro Pedro Malan ou a ambos?
Alckmin -
Não é uma crítica a ninguém. É apenas uma constatação. Há necessidade de fazer a economia crescer, principalmente num país de base democrática larga como o Brasil, com tantos jovens e com necessidade de criar 1,6 milhão de novos empregos todo ano. Mas, para isso, o país precisa ter fatores macroeconômicos firmes, e acho que estão sendo conquistados. O que tenho dito? Que precisa abaixar os juros.

Folha - A maior taxa de juros do mundo não é uma das derrotas do governo FHC?
Alckmin -
Pelo contrário. Ele criou as condições macroeconômicas para baixar os juros. O país tinha um déficit fiscal crônico, hoje tem superávit primário importante.

Folha - Até que ponto isso é fundamental? Os EUA, símbolo do capitalismo, abriram mão de um superávit primário em favor do combate à recessão.
Alckmin -
Mas o desenvolvimento precisa ser feito em bases sólidas, não à base de bolhas de crescimento. O Brasil mostrou que está no caminho certo, mais consistente. Basta comparar com a Argentina, ali ao lado. O próximo passo é você caminhar para um desenvolvimento sustentado ainda maior. É o grande desafio.

Folha - Vou lhe transmitir uma pergunta que me fizeram hoje um jornalista e um cidadão comum aqui de São Paulo: o ano é eleitoral e, como o governo Covas-Alckmin não conseguiu combater a violência em sete anos, não está na hora de deixar que outros tentem?
Alckmin -
O povo é quem decide, quem dá a última palavra. Eu acho que São Paulo é um exemplo para o Brasil. O governo do Estado tem se pautado por princípios, por valores. Deu como exemplo para o país um ajuste fiscal sem mandar a conta para o contribuinte, conseguiu chegar ao final de um ano com uma recessão enorme e com déficit zero, sem vender um ativo. A única privatização prevista era a da Cesp-Paraná, e nós suspendemos. Menos R$ 2 bilhões no caixa. Seria uma temeridade avançarmos nessa direção num momento de crise energética. E em 105 anos, desde a Proclamação da República, o Estado de São Paulo abriu 21 mil vagas no sistema penitenciário. Nós abrimos 33 mil em sete anos.

Folha - O sr. não teme que os sequestros soterrem tudo isso? Que só se fale em sequestro e violência na campanha?
Alckmin -
Não, porque confio na inteligência das pessoas. Todo governo tem dificuldade, tem crise. O importante é como os governos enfrentam as dificuldades e crises, porque a população sabe muito bem distinguir.

Folha - O sr. se arrepende de ter se metido pessoalmente no sequestro de Silvio Santos, ocorrido em 2001?
Alckmin -
De maneira nenhuma. Aprendi como médico que, numa situação de emergência, você erra menos quando age que quando se omite. Graças a Deus, o problema naquele momento se resolveu.

Folha - Mas o sr. avalizou pessoalmente a vida do sequestrador Fernando Dutra Pinto, e ele morreu.
Alckmin -
Diziam que ele morreu por envenenamento. Mentira. Ele morreu por infecção.

Folha - O sr. é médico. Como explica que um rapaz de 22 anos, forte o suficiente para escalar um prédio, morra poucos meses depois de infecção? Não é difícil acreditar?
Alckmin -
Que ele morreu de infecção, não há dúvida. Está no laudo.

Folha - Como um rapaz sadio contrai uma infecção tão forte? E como ela evolui até a morte?
Alckmin -
Está sendo apurado. Ele foi atendido pelo médico, levado para um hospital, submetido a raio-X, medicado.

Folha - E as marcas que ele tinha? Há suspeita de que ele tenha sido morto aos poucos?
Alckmin -
O governo tem obrigação de apurar e está apurando, inclusive com outros órgãos e com a Comissão Teotônio Vilela de Direitos Humanos. Se alguém errou, vai ser punido.

Folha - Por que as investigações do assassinato do prefeito de Campinas, Antonio da Costa Santos (PT), não estão dando em nada?
Alckmin -
Não é por falta de esforço, porque o maior interessado em esclarecer é o governo.

Folha - As investigações do caso do prefeito de Santo André, Celso Daniel, conduzem para o empresário Sérgio Gomes da Silva, que estava com a vítima na hora do sequestro? Ele é suspeito?
Alckmin -
Ele prestou depoimento como testemunha. Cabe à polícia investigar todas as possibilidades, mas avançar em qualquer delas seria precipitado.

Folha - Foi a terceira vez que o governo federal se assustou com um crime espetacular e anunciou um pacote de medidas. O sr. não teme que esse tipo de recurso caia no ridículo?
Alckmin -
Nós levamos ao presidente um conjunto de sugestões, tanto administrativas quanto de integração das polícias, inclusive para coibir o porte de armas. É uma contribuição, independentemente do que estamos fazendo aqui no Estado. O ideal é termos uma força-tarefa com as polícias estaduais, a Receita Federal, a Polícia Federal e até participação eventual das Forças Armadas.

Folha - Um exemplo do ridículo foi a idéia de proibir os celulares pré-pagos, criticada até pelas autoridades em telecomunicações. E agora?
Alckmin -
Qualquer policial com quem você conversar vai dizer que o pré-pago é, hoje, um dos principais instrumentos do crime organizado. A nossa proposta acordou, deu um aperto. A Anatel tem obrigação de apresentar uma solução.

Folha - Conforme a Folha publicou, o general Alberto Cardoso vetou sua proposta para uso temporário de soldados das Forças Armadas como guardas de muralha. O que o sr. achou disso?
Alckmin -
Nós vivemos um momento difícil, e não apenas aqui. O presidente não disse que a situação ultrapassou todos os limites? Então, se é guerra, que se tomem todas as medidas necessárias. Eu sou radicalmente contra essa história de botar o Exército na rua. Não tem o menor cabimento. O que nós sugerimos é que, provisoriamente, durante uns cinco meses, enquanto faço o concurso e treino os guardas, o Exército colaborasse como sentinela, só isso. É bastante razoável.
 

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